Por vezes os impulsos que nos levam a encher as nossas casas com objectos definitivamente fora de moda ou até mesmo Kitsch são estranhos. Talvez a frieza do mobiliário contemporâneo e o racionalismo da decoração minimalista se adaptem mal a quem tem uma certa visão romântica do mundo e gosta de se rodear de história. No fundo, quem colecciona velharias ou antiguidades está a inventar um passado para si, a encher a casa de objectos cheios de memórias, que pertenceram a outras pessoas e a apropriar-se delas.
Aliás é curioso, que o comércio de antiguidades como o conhecemos hoje teve origem em França, nos finais do II Império (1852-1870), quando os grandes milionários burgueses começaram a comprar cómodas, pinturas, bronzes, tapeçarias e esculturas dos séculos XVI, XVII e XVIII para tornar as suas casas semelhantes às dos velhos aristocratas. Estes grandes financeiros burgueses ao copiarem a decoração das casas nobres, cheias de antiguidades, herdadas de geração em geração, pretendiam confundir-se com a sociedade aristocrática.
Claro, esta jarrinha não tem nada de aristocrática. É um bibelot burguês possivelmente do início do século XX, mas que tem o charme de uma velha casa de família do passado. Nem sequer está marcada, pois na altura que foi produzida, algures na Alemanha, Áustria ou Boémia, os seus fabricantes tentariam que esta jarra passa-se por ser uma peça de Meissen, ou da prestigiada Royal Dux, com as suas jarras e figurinhas em estilo arte nova. Aliás, ainda tive esperança que esta jarra, com a sua decoração assimétrica, copiando as formas vegetais, fosse da Royal Dux. Mas as peças dessa antiga fábrica checa tem uma qualidade muito superior estão sempre marcadas.
A decoração da jarrinha, composta por um putti, uvas e parras representa uma dança dionisíaca, tema já usado na antiguidade e é muito comum na faiança, majólica, porcelana, biscuit e até na ourivesaria. Na pesquisa por imagens da internet vi dúzias e dúzias de jarras, jarrinhas e jarrões decorados com meninos gordos e travessos pendurados na asa, no bojo e no bico e com muitas parras e uvas à mistura.
Em suma, todas as minhas pesquisas para identificar o fabricante desta jarra foram inúteis. Posso apenas presumir que foi fabricada algures na Alemanha, Áustria ou na Boémia nos últimos anos do séc. XIX ou inícios do século XX. É uma peça Kitsch, sem grande valor, pois parte da asa está partida, mas tem o charme dos objectos irremediavelmente fora de moda.