Apresento hoje duas molduras compradas no Alentejo, mais exactamente em Estremoz, que apresentam um trabalho absolutamente precioso, com folhas, flores e decorações várias, feitas em cortiça, cortada em lâminas muito finas. O trabalho final foi encaixilhado numa estrutura de madeira. Foram adquiridas pelo pelo amigo Manel em muito mau estado, com muitos dos elementos decorativos caídos ou em falta.
O Manel usou estes trabalhos preciosos de cortiça, para emoldurar estampas antigas com santos. Mas originalmente estas peças terão sido executadas para encaixilhar fotografias de parentes queridos. Uma delas, a que neste momento tem o Cristo, apresenta além da área central dois espaços mais pequenos para colocar outras fotografias. Provavelmente na reserva central, colocar-se-ia a fotografia grande do casal e à volta os retratos dos filhos em formato tipo bilhete de identidade. Aliás, o Manel, quando a comprou ainda tinha no centro o resto de uma fotografia, com uma dedicatória, datada do primeiro quartel do século XX. Há uns anos, eu próprio, também comprei uma destas molduras trabalhadas em cortiça, contendo igualmente uma fotografia antiga, que também retirei para colocar a estampa de uma virgem do início do século XIX. No entanto a minha moldura não é tão espectacular como as do Manel e nem foi restaurada, pois faltam-me os olhos e a paciência do meu amigo.
Tentei encontrar algumas informações sobre estas molduras com trabalhos delicados feitos em cortiça. Consultei a obra A arte popular em Portugal de Fernando de Castro Pires de Lima, editado pela Verbo, nos finais dos anos 60 e que refere os vários trabalhos de cortiça feitos pelos pastores alentejanos, executados apenas com o auxilio de uma navalha, entre os quais, as molduras, mas não reproduz nenhuma fotografia, para eu saber se de facto se tratarão de peças idênticas a estas. Também fiz algumas pesquisas na net, onde percebi que o trabalho feito pelos pastores em cortiça, para matar o tempo, enquanto apascentavam os seus rebanhos, ficou conhecido pela designação arte pastoril. Mas sinceramente acho este trabalho demasiado frágil para ser transportado na sacola do pastor todos os dias de um lado para o outro, a não ser que ele fizesse os elementos decorativos no campo e procedesse à montagem final do conjunto em casa.
Em todo o caso, quem fez estes trabalhos, algures no Alentejo, onde os sobreiros abundam por todo o lado, não lhe faltava talento nem precisão de mãos. o Manel, que o diga, que se viu grego para reconstituir alguns dos elementos decorativos, como as rosas em cortiça.