Esta obra de Debrie é sem dúvida uma das estampas do Manel que eu mais gosto. Em dimensões muito reduzidas, o gravador francês apresenta uma praça com uma arquitectura imaginária, desenhada com rigor e minúcia que até nos espanta.
Para não variar, esta gravura foi retirada de um livro, as Memórias para a História de Portugal que compreende o governo del rey D. João I, da autoria de José António da Silva, mais propriamente do tomo II, publicado em 1731. Além destes dados, o Manel que é um cusca, ainda conseguiu descobrir a página de onde foi retirada a estampa, a 531.
A referida página 531 abria o Capítulo CIV, Memórias em que se referem as fábricas sagradas e profanas, que foram fundação Del Rei.
Isto trocado em miúdos, quer dizer que nesta parte do livro descrevia-se os monumentos e as obras mandadas erguer pelo Rei D. João I, o que justifica a escolha de Debrie de um tema arquitectural, só que para melhor traduzir o assunto do capítulo, desenhou edifícios em construção com andaimes postos, operários em azafama, carroças e gente a transportar volumes.
É certo que os edifícios são absolutamente clássicos, quase romanos que nada tem a ver com o tempo em que D. João I viveu, os finais da Idade Média, mas também pouco importava, na época de Guillaume François Laurent De Brié não havia grandes preocupações com o rigor na representação de cada período histórico. O que era considerado bonito no Século XVIII era a beleza e a monumentalidade dos edifícios da antiga Roma, que os artistas de toda a Europa desenhavam quando iam em peregrinação artística à cidade eterna. Esses pintores e desenhadores divulgavam as suas vistas de Roma Antiga por toda a Europa em forma de gravuras. Essas estampas ficaram conhecidas pelo nome italiano de vedutas, ou em português vistas e são as antepassadas dos postais modernos. O mais célebre desses artistas foi Giovanni Battista Piranesi,1720-1778, mas ainda antes dele, no século XVII, houve outros que delinearam vistas de antigos templos de Roma, em ruínas e que já tinham tornado as vedutas populares na Europa, como Alessandro Specci
Pont triomphal erigé par un Empereur Romain. Piranesi. Biblioteca Nacional. Reconstituição fantasiosa da Antiga Roma |
Mas Piranesi desenhou como poucos a beleza e a poesia dos monumentos romanos em ruínas, mas fez mais do que isso, deu-se também ao trabalho de os representar reconstruídos, algumas vezes de forma plausível e outras vezes dando largas à sua imaginação, produzindo assim reconstituições históricas fantasiosas da Antiga Roma, que são muito mais assombrosas e de melhor qualidade, que os filmes de época que Hollywood fez nos anos 40 ou 50.
Uma reconstituição mais ou menos fantasiosa da antiga Roma por Piranesi |
Esta gravura do artista francês De Brie, que se radicou em Portugal durante o reinado de João V, evoca de facto Piranesi e as suas antiguidades romanas reconstituídas.
A minúcia da estampa de debrie |
Quem quiser saber mais sobre o Piranesi pode consultar a obra Giovanni Battista Piranesi: invenções, caprichos, arquirtecturas. – lisboa: IPPAR, 1993
Finalmente regressado à vida do dia a dia, fiquei encantado por teres "postado" esta gravura, que adoro. Igualmente é uma das minhas gravuras favoritas e deixo-me ficar em contemplação por vezes.
ResponderEliminarA associação com Piranesi é inevitável, mais custoso foi encontrar o livro donde tinha sido extraída, mas como havia um pouco de texto no verso, lá consegui decifrar.
Quanto ao número da página, não foi necessário grande cusquice ... hehehehe ... o número está no lado superior direito da gravura.
O estranho foi associar este tipo de arquitetura apresentada à transição dos séculos XIV para o XV, quando tal ainda não estava de moda.
Mas a imaginação do autor não teve qualquer problema, e fez aquilo que lhe era mais familiar.
Creio que continuarei a ficar ensimesmado por esta gravura, pela qualidade de desenho que apresenta e, também, pela sua manufatura fora do comum.
Manel
Como o Luís já deve calcular, achei este post, mais uma vez dedicado a gravuras e a livro antigo, muito ao meu gosto e só não comentei há mais tempo porque quando ele apareceu andava totalmente noutra…
ResponderEliminarEsta gravura também me agrada muito sobretudo por ter a novidade de retratar tão bem a forma como se construía na época de Debrie. Mostra pormenores incríveis do trabalho na construção dos edifícios e como eu sou leiga no assunto, acho toda a cena digna de ser apreciada e dissecada. E aquele anacronismo dos edifícios clássicos a ilustrarem a s obras de D. João I é simplesmente delicioso!
O livro de onde a gravura foi arrancada devia ser um primor, com todas as ilustrações, mesmo o tipo de livro antigo que eu gostaria de encontrar… e a verdade é que aparecem à venda, mas geralmente caríssimos ! O Luís lá conseguiu reunir toda a informação para partilhar aqui connosco.
Não tenho conhecimentos de Arte ou de História da Arte que me permitam estar familiarizada com o trabalho de Piranesi, por exemplo, e por isso aprecio sempre muito ir aprendendo mais sobre este e outros nomes através destas tertúlias virtuais.
Abraços
Maria Andrade
ResponderEliminarComo tem razão. Quem perceba de engenharia ou arquitectura deve deliciar-se com estes pormenores dos andaimes, dos carros de bois e de toda a actividsade de um canteiro de obras do século XVIII.
O Piranesi é fantástico. Infelizmente não tenho nada dele, mas recomendo-lhe toda a obra dele, sobretudo as gravuras com ruínas da antiga Roma, embora as pessoas tenham a mania da série das prisões, que a mim não me dizem tanto.
abraços
Bom dia!
ResponderEliminarGostaria de saber se me podem ajudar: tenho 3 gravuras de Piranesi de 1750 (mais coisa menos coisa) e gostaria de saber qual o seu valor real.
Obrigado
Hugo
caro Hugo
ResponderEliminarUma boa gravura do Piranesi em bom estado poder ser muito cara.
Espreite por exemplo um dos leilões do Babral Moncada http://www.cml.pt/cml.nsf/artigos/A64F146F37252EB38025791B0036B46F onde venderam uma gravura por 1.200 euros.
Claro, o preço tb depende do tamanho, estado de conservação e moldura
Abraço
Luís