sexta-feira, 26 de abril de 2013

The Monument por Thomas Hosmer Shepherd (1792-1864)


Há pouco tempo comprei esta estampa aguarelada com uma vista de um monumento, em Londres, que me encantou pelo seu coloridos e pequenas dimensões. A mancha de texto não ultrapassa os 13,3 por 8, 5 cm.

Decidi saber qualquer coisa sobre esta estampa e comecei a fazer as minhas pesquisas no Google pelo nome do desenhador, um tal T. H. Shepherd e descobri que este senhor, de nome completo, Thomas Hosmer Shepherd, foi um aguarelista conceituado no seu tempo, que se celebrizou por registar no papel vistas de Londres, caracterizadas pela atenção dada aos pormenores, como carruagens a circular e pessoas a caminhar.
Uma grande atenção dada aos pormenores

T. H. Shepherd foi sobretudo um ilustrador de livros e as obras em que colaborou mais conhecidas foram Metropolitan improvements: London in the nineteenth century. -London: Jones & Co. 1827 e London and its Environs in the Nineteenth Century.-London: Jones & Co. 1831. Estes livros encontram-se integralmente digitalizados e as estampas de Thomas Hosmer Shepherd, que registam com minúcia a arquitectura de Londres, são uma delícia para os nossos olhos e um documento precioso para a história da cidade, que tanto perdeu com as destruições da Segunda Guerra Mundial.

 
London and its Environs in the Nineteenth Century.-London: Jones & Co. 1831
Pensei logo de início que esta minha gravura teria feito parte de uma ou outra dessas duas edições e desfolhei-as página a página, mas apesar da minha paciência não encontrei nada, muito embora o estilo das estampas fosse absolutamente idêntico ao meu. 
London and its Environs in the Nineteenth Century.-London: Jones & Co. 1831

Depois lembrei-me de pesquisar pelo editor, Dugdales England and Wales e lá consegui finalmente descobrir que esta minha estampa fez parte da obra Curiosities of Great Britain. England & Wales delineated Historical, Entertaining & Commercial /by Thomas Dugdale, Antiquarian, assisted by William Burnett, publicada em vários volumes, ao longo de 1833-40. Esta obra era uma espécie de livro de viagens e a minha estampa foi de lá rasgada um belo dia para fazer um quadrinho a pendurar na parede.

Fiquei assim muito contente por identificar o autor do desenho da gravura e o livro no qual saiu, mas depois lembrei-me que não sabia nada sobre que monumento representava. Pareceu-me que reproduzia a Coluna de Nelson, a homenagem prestada pelo do povo inglês ao herói de Trafalgar. Contudo, a coluna de Nelson, só foi inaugurada em 1843, data posterior à publicação da Curiosities of Great Britain. England & Wales. Portanto havia qualquer coisa que estava a falhar nestas investigações. Fiz mais umas pesquisas no google e percebi que The Monument , para os Londrinos é de facto uma grande coluna, mas não é exactamente a de Nelson. The Monument, ou seja o Monumento foi erguido entre 1671 e 1677 e homenageia as vítimas do pavoroso incêndio que devastou Londres em 1666.
O Monumento homenageia as vítimas do pavoroso incêndio que devastou Londres em 1666.
Passei assim a tarde de hoje nestas investigações. Quando acabei, percebi que já não tinha tempo para aspirar a casa, conforme tinha pensado fazer no dia de hoje.

domingo, 21 de abril de 2013

Faiança: distinguir Fervença e Bandeira, a eterna confusão


Recentemente comprei uma caneca atribuída a Fervença, que está a fazer as minhas delícias pelo seu colorido muito popular e ao mesmo tempo a desencadear novamente uma grande confusão na minha cabeça entre o que é Fervença e o que é Bandeira. 

Esta minha nova caneca tem uma particularidade, é enorme, mede cerca de 15 cm de altura e à volta de 10 cm de diâmetro. O Manel e eu fizemos uma experiência com um medidor, enchemo-la de água e ela comporta um litro e ainda mais qualquer coisinha.


Fiquei intrigado com as dimensões desta caneca cilíndrica. Quem beberia tanto vinho ou tanto café com leite? 

Bem sei que antigamente, as pessoas não tinham esta preocupação contemporânea em serem magras, mas em todo caso, beber um litro inteiro de vinho é um exagero!

Presumi também que a caneca não fosse destinada a beber cerveja, pois o hábito de consumir esta bebida só se generalizou em Portugal no século XX, embora é certo que as primeiras fábricas tivessem aparecido na centúria de oitocentos, quando esta peça saiu do forno.

Estive depois a ler o glossário de termos técnicos do Itinerário da Faiança do Porto e Gaia. – Lisboa: IPM, 2001 e descobri que estas canecas cilíndricas de grandes dimensões eram vulgares na época e destinavam-se efectivamente a beber vinho, mas eram passadas de mão em mão, bebendo várias pessoas pelo mesmo recipiente, e por isso eram tão grandes. A caneca é pois testemunho de um costume ainda comum no século XIX, em que toda uma família comia de um único prato de grandes dimensões, usando o garfo ou uma faca para picar e beberia também por única caneca. Pratos ou copos individuais só existiriam nas famílias mais abastadas ou à mesa da fidalguia.

A caneca pertenceu à colecção António Capucho, que para quem não saiba foi um dos grandes coleccionadores de faiança em Portugal e um grande conhecedor de cerâmica. Nos mercados das velharias, ainda se conta que o Senhor identificava a origem das peças pelo peso e pelo toque, tal era sua experiência em lidar com a faiança. A caneca foi atribuída a Fervença pelo próprio António Capucho, conforme se pode comprovar pela etiqueta manuscrita na base, e como tenho o maior respeito pela experiência deste coleccionador, tomarei por ponto assente que é Fervença. Até porque de facto, a caneca apresenta as características atribuídas a Fervença por Artur Sandão, na obra a Faiança portuguesa: séculos XVIII-XIX. Porto: Civilização, 1985, isto é, forte policromia e delicada espessura.
 


A policromia assemelha-se efectivamente a outros pratos Fervença, como aquele mostrado nos Meninos gordos: faiança portuguesa/ Isabel Maria Fernandes. – Porto Civilização, 2005, página 37, em que as flores são feitas com uma máscara e depois pintadas à mão com pinceladas rápidas. Mas também é verdade, que é um Prato Fervença, que se poderia confundir com Bandeira…
 
 
Quanto à delicada espessura, a caneca tem efectivamente paredes finas, tal como uma terrina, com a qual iniciei este post há mais de 3 anos e que me continua a desconcertar, pois sempre que olho para ela mudo de opinião. Umas semanas julgo que é Bandeira, outra convenço-me que é Fervença.
 
 

Objectivamente, o mais próximo que encontrei desta peça foi uma Terrina do Museu Nacional de Soares dos Reis, com uma decoração muito colorida e está identificada como fabrico de Bandeira.
 
Terrina do Museu Nacional de Soares dos Reis
Mas este formato de terrina foi usado por muitas fábricas portuguesas entre finais do XVIII e a primeira metade do XIX. Ainda recentemente descobri uma destas sopeiras com um formato igualzinho à minha, atribuída à Fábrica de Domingos Vandelli, do século XVIII, no catálogo Cerâmica de Coimbra na colecção Pereira de Sampaio. – Coimbra: Câmara Municipal, 2011 e no matriz.net também encontrei mais umas quantas iguais, manufacturadas em várias partes do País.
 
Terrina de fabrico de Coimbra por Vandelli
 
Aliás, já aqui no blog referi que a mesma forma era usada em várias fábricas portuguesas, o que se explica pelo facto de que a Fábrica do Rato em Lisboa ter servido de escola a jovens de todo o País e que quando terminavam a sua aprendizagem, voltavam paras suas terras não só com as técnicas, mas com os próprios moldes das peças.

Enfim, escrevi todo este texto para vos dizer que não tenho certezas absolutas sobre esta caneca e terrina, mas julgo, que pelo menos terão sido fabricadas muito perto uma da outra, na margem esquerda do Douro, talvez em meados do século XIX.
 
 

domingo, 14 de abril de 2013

Santo António de Lisboa por Debrie

D. Antonius Lisbonensis, domus mea, domus orationis
Nunca tive um grande interesse na figura de S. António de Lisboa, nem na sua iconografia. Talvez por excentricidade sempre me atraíram mais aqueles santos que caíram completamente no esquecimento como S. Facundo ou Santa Brígida ou então aqueles com uma conotação sexual mais ou menos evidente como S. Sebastião ou Maria Madalena a arrependida.


Mas quando vi esta estampa de S. António do século XVIII, com um desenho muito requintado encantei-me logo por ela. Achei uma delícia o dossel que cobre a figura do santo. Recordou-me imediatamente uma daquelas camas que estiveram muito em voga no último quartel do Século XVIII, o lit à la polonaise. Vemos um exemplar de um desses leitos no quadro Premier pas de convalescence, de António Pascutti, que embora tenha sido pintado em 1875, reproduz um interior em estilo Luís XVI (1774-1791), quando essas camas, guarnecidas por cortinas em tecidos luxuosos estavam na moda. Era o tempo em que as grandes figuras da aristocracia recebiam visitas formais no quarto e as camas eram pequenos compartimentos reservados.

O Premier pas de convalescence, de António Pascutti representa um interior em estilo Luis XVI, onde se vê um lit à la polonaise. Imagem de http://www.photo.rmn.fr
Quanto a esta estampa do Sto. António, encontrei-a referenciada, no Dicionário Iconográfico português / Ernesto Soares e Henrique de Campos Ferreira Lima. Lisboa: Instituto de Alta Cultura, 1950, que a descreve de forma precisa: S. António debaixo de um dossel de corpo inteiro, de frente, segurando com a direita uma cruz e um lírio e com a esquerda um livro, onde está sentado nu um menino com a coroa Real. A estampa descrita apresenta a mesma legenda que a minha e está assinada por Debrie, ou melhor Guilherme Francisco Lourenço Debrie, o gravador francês ou flamengo trazido para Portugal por D. João V e datada de 1745. 


Porém a minha estampa é mais tardia que 1745. Com efeito, o Dicionário Iconográfico português refere que esta estampa voltou a ser usada com o mesmo delineamento em 1761 no frontispício da obra Cultos de devoção e obsequios, que se dedicão ao Thaumaturgo Portuguez.
A minha estampa foi retirada da obra Cultos de devoção e obsequios, que se dedicão ao Thaumaturgo Portuguez., editada em 1787
Mais tarde, em 1787 esta obra foi reimpressa por Simão Tadeu Ferreira e é desta edição que a minha estampa foi retirada.

sábado, 6 de abril de 2013

Colocação de mais azulejos pombalinos


Esta Páscoa o Manel e eu andámos outra vez a colocar mais azulejos na sua casa do Alentejo. O método foi o mesmo. Retirámos os móveis, quadros e pratos e estendemos um plástico no chão.

Depois foi necessário calcular o espaço certo que os azulejos ocupariam, para abrir o roço, o que não significou simplesmente multiplicar a dimensão típica de um azulejo, 14 cm, pelo nº de unidades a colocar. Na verdade, os azulejos não eram exactamente iguais. Os marmoreados eram quase todos do século XIX e apresentavam dimensões mais pequenas que os restantes. Por outro lado, os azulejos com um motivo rocaille estavam muitas vezes partidos nos cantos e outras vezes empenados. No fundo estamos a falar em azulejos ainda muito artesanais, todos ligeiramente diferentes e precisamente para não haver desfasamentos no final, o Manel montou o painel previamente no chão, numerou-o a marcador e foi tomando às medidas na parede três a três.


Depois, calçámos as luvas e armados com um martelo e um escopro, começámos a partir furiosamente a parede, até chegarmos ao tijolo. Seguiu-se a feitura da massa e a colocação dos painéis. À medida que a massa ia secando, um de nós ia limpando com uma esponjinha os azulejos.

Quando acabámos já eram nove e tal da noite. Jantámos tarde e a más horas, mas no dia seguinte, quando se conseguiu arrumar tudo, o resultado obtido era verdadeiramente espectacular. A boa azulejaria portuguesa passou a ser um cenário de época perfeitamente adequado para a mesa bufete e as cadeiras D. José. A comparação das duas fotografias do antes demonstra aliás como os azulejos modificam e alteram a percepção que temos do espaço arquitectónico, mesmo que a superfície em causa não ultrapasse a meia dúzia de metros.