sexta-feira, 30 de março de 2012

Santa Auta por Jerónimo de Barros Ferreira: estampa do Século XVIII


Já há muitos anos comprei num alfarrabista lisboeta esta estampa que representa Santa Auta, datada de 1783 e é talvez dos meus melhores registos de santos. É toda ela muito barroca, cheia de uma delicadeza e graça, que nos faz esquecer completamente que Sta. Auta foi umas das onze mil virgens massacradas pelos Hunos na cidade de Colónia. Aliás esta estampa sugere-nos tanto o sofrimento, o martírio ou o sangue dos mártires como o Petit Trianon em Versalhes, ou seja absolutamente nada.
A palma de mártir

E no entanto a santa lá tem na mão a palma a indicar que morreu martirizada e uma seta na outra mão, revelando-nos que foi trespassada por flechas.
O instrumento do martírio, a flecha

Auta era uma das muitas donzelas que acompanhavam Santa Úrsula numa peregrinação a Roma. As jovens foram surpreendidas em Colónia pelos Hunos, que as chacinaram sem dó nem piedade. Esta história algo mirabolante das 11 mil virgens terá tido origem numa lápide romana, do séc. IV ou V existente na igreja de Sta. Ursúla em Colónia, que testemunhava o martírio de umas virgens cristãs, mas sem especificar o número e o nome.

Sta. Úrsula, outra estampa da minha colecção

Mais tarde, entre o século VIII e IX a história ganhou contornos de lenda, quando se encontraram alguns cadáveres de jovens, provavelmente restos de algum cemitério romano, entre os quais os de uma menina chamada Úrsula, em latim, Undecimilla, que alguém interpretou erradamente por onze mil. Há também outra versão, que explica que no Séc. VIII a lenda ainda apresentava só 11 Virgens mártires, identificadas nos textos e na epigrafia pela abreviatura XI. M. V e que mais tarde foi lida como significando onze mil e lá ficaram 11.000 virgens para a História.

Em Portugal, o culto de Santa Auta, deve-se sobretudo à Rainha D. Leonor, a senhora que foi mulher de D. João II, irmã de D. Manuel I, regente várias vezes e uma das mulheres mais influentes na história portuguesa. Mandou vir as relíquias da referida Santa da Alemanha, que cá chegaram em 1517 e foram depositadas da Igreja da Madre de Deus.

Esta Santa Auta de desenho precioso foi concebida por Jerónimo de Barros Ferreira (1750-1803), pintor, desenhador e miniaturista, que se distinguiu pelo primor das suas flores e ornatos. O Dicionários de pintores e escultores portugueses, de Fernando Pamplona refere uma série de retratos que este artista fez, bem como muitas pinturas murais em igrejas e palácios de Lisboa, mas não consegui encontrar imagens de nenhuma essas obras, apesar da qualidade desta Santa Auta me deixar muito curioso em relação à sua restante obra.
Estampa que faz parte das Noites jozefinas com desenho de Jerónimo Barros Ferreira
Mas como sou bibliotecário, vasculhei e pesquisei e lá consegui encontrar uma obra do século XVIII, integralmente digitalizada, Noites jozephinas de Mirtilo sobre a infausta morte do Serenissimo Senhor D. Joze Principe do Brazil. Dedicadas ao consternado povo luzitano/ por Luis Rafael Soyé. Lisboa:  Na Regia Officina Typografica, 1790, amplamente ilustrada com muitas estampas da autoria de Jerónimo de Barros Ferreira, que evidenciam o estilo barroco e frívolo deste artista, que pessoalmente acho delicioso.
Outra estampa de Jerónimo de Barros Ferreira retirada das noites Jozefinas
Este nosso Jerónimo de Barros Ferreira foi mestre de Gregório Francisco de Queirós, sobre quem já aqui escrevi e trabalhou em parceria com vários gravadores, nomeadamente José Lúcio da Costa, o coxinho, que executou esta Santa Auta.

Para rematar, este post dedicado aos assuntos piedosos, li num blog vizinho, que o nosso Jerónimo de Barros Ferreira teve também uma história familiar curiosa. Casou com uma senhora de nome Antonieta Engrácia de Deus e Silva, da qual teve dois filhos com os peculiares nomes de Silêncio Cristão e Vigilância Perpétua.

A moldura foi comprada na feira da ladra de Barcelona por menos de meia dúzia de euros

segunda-feira, 26 de março de 2012

Torre sineira com azulejos em Fronteira

Nem sei como começar este post. Talvez escrevendo, que muitas terras portuguesas tem um património arquitectónico interessante e que estão cheias de pormenores surpreendentes aqui e ali e que esse conjunto de singularidades formam um todo muito próprio, que nos agrada e nem sabemos dize-lo porquê. É o tal je ne sais quoi de que falam os franceses, mas que reside precisamente em detalhes, como o revestimento azulejar desta torre sineira em Fronteira. Os azulejos são do mais simples que há, azuis e brancos, formando um xadrez e apesar de ser uma combinação que qualquer criança é capaz de montar formam um todo cheio de ritmo e brilho.  


Eu adoraria ter em casa azulejos destes. Por vezes quase que desejo que rebente um cano na casa de banho, para mandar partir os azulejos todos e colocar esta combinação, azul, branco, azul, branco, azul. Mas, enfim, é melhor não ter pensamentos destes, pois o cano rebenta mesmo e eu não tenho dinheiro para pagar ao homem. Mas continuo a sonhar com esta combinação infinita de azuis e brancos.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Varanda de ferro forjado em Fronteira


Quando viajo pelo interior do País e visito terras de província com centros históricos ainda bem conservados, apetece-me sempre ficar ali. Arranjar um emprego na Biblioteca pública local, abandonar Lisboa e comprar uma casa antiga bonita, cheia de história, com bonitas varandas de ferro forjado, com a desta casa que vi e fotografei em Fronteira no Alentejo.

Talvez este ensejo em me fixar numa terra antiga da província, seja um sentimento romântico de regressar às casas onde se criarem os meus pais e os meus avôs e fazer reviver esse passado familiar, aquela sensação única de estar num quarto e ver o sol entrar por uma janela de guilhotina, iluminando um soalho antigo, a cheirar a cera. Decididamente, num apartamento dos anos 60 ou 70 de Benfica não se consegue viver essa alma de uma casa antiga.

Esta casa em Fronteira, que parece conter dentro das suas janelas, toda uma sucessão de histórias familiares, atraiu-me pela beleza das cantarias, mas também pela elegância do trabalho de ferro forjado, em estilo D. Maria. Tentei encontrar alguma informação sobre  a origem ou o fabrico destes gradeamentos artísticos, mas não consegui obter nada. Há uma obra, Grades de Lisboa, de 1947, do período da casa portuguesa, que tem bonitos desenhos, mas com um texto fraco, pois a obra pretendia apenas exortar os portugueses de então a fazer as varandas das suas moradias e casas, copiando os modelos do passado e enfim, não podemos criticar o autor por essa intenção. Li também na obra Ferros forjados do Porto de 1955, que o distrito de Portalegre tinha uma grande tradição no fabrico do ferro forjado e que este trabalho tanto era feito pelos serralheiros, como pelos ferreiros. Imagino que a seguir ao terramoto de 1755, muitas oficinas em Lisboa tenham crescido exponencialmente, para satisfazer a procura que a construção de casas novas suscitava e talvez esta varanda, tenha sido executada por uma dessas oficinas pombalinas, mas é uma grande interrogação.


Em todo o caso, seja lá qual for a oficina que fez esta bela obra, apetece viver numa casa destas.

terça-feira, 20 de março de 2012

Chávena e Pires decorados com desenhos de Adam Buck (1759-1833)


Um dia na feira de Estremoz o Manel comprou já não sei que velharia e o feirante como brinde, deu-lhe esta chávena e pires.

Esta peça que era obviamente do início do século XIX deixou-nos aos dois encantados com a sua elegância neoclássica, bem como a sua pormenorização, já que na chávena e pires estão impressas ao todo três cenas distintas, todas elas representando uma mãe e um filho, em momentos de grande ternura.


A peça não tem marca de fabrico, apenas um número, que se deve referir talvez à decoração.


Fotografei e a peça e fui para o Google e claro, no www.rubylane.com, o melhor site de antiguidades de toda a net, descobri uma primeira chávena, muito semelhante a esta, datada dos primeiros anos do séc. XIX, e que me forneceu as primeiras pistas.
Chávena e pires à venda no www.rubylane.com

A chávena e o pires foram feitos em lustrina, um tratamento especial dado ao vidrado da faiança, que lhe confere um brilho especial. A decoração da chávena foi feita  segundo uma técnica de impressão muito inovadora para a época o bat printed, em que os desenhos eram impressos com um pontilhado, criando um aspecto delicado e adaptando-se muito bem a superfícies curvas
Chávena e Pires da Dawson, da colecção do Victoria & Albert Museum

Depois continuei as minhas pesquisas, desta vez em livros e numa obra de Geoffrey A. Godden, intitulada, British Pottery and Porcelain, descobri um conjunto ainda mais parecido com este, fabricado pela Dawson, cerca de 1815 e pertencente à colecção do Victoria and Albert Museum. Parti para o site daquele museu inglês, que tem uma colecção estupenda de faiança e porcelana e lá encontrei uma imagem da chávena referida no livro, mais outras peças idênticas, sempre à volta do tema da maternidade, com senhoras em trajes estilo império, em momentos de ternura com os seus filhos.
Prato do Victoria & Albert Museum, executado segundo desenho de Adam Buck

Acabei por descobrir que todas aquelas peças de faianças foram decoradas a partir de desenhos de Adam Buck (1759-1833), um pintor irlandês, que desenvolveu um trabalho de retratista e miniaturista em Londres, no mais puro estilo neoclássico.
Estampa segundo desenho de Adam Buck do V& A Museum

A chávena e o pires do Manel foram feitos certamente segundo um desenho de Adam Buck e à volta de 1810/1820. Todo o pormenor da decoração destes objectos cerâmicos objectos acusa o toque de um pintor minaturista.
Auto retrato de Adam Buck e sua família.

sábado, 17 de março de 2012

Bule e Açucareiro de Porcelana Vieux Paris


Este açucareiro e bule pertencem ao meu amigo Manel e certamente terão sido produzidos por um dos fabricantes de porcelana de Paris, provavelmente em meados do século XIX ou um pouco mais tarde. A porcelana produzida ou pintada por fábricas ou manufacturas sedeadas na capital francesa entre 1765 e 1870 é conhecida pelo nome Vieux Paris ou Porcelana de Paris.

As peças do Manel não estão propriamente marcadas. Apresentam uns traços incisos que serão mais uma identicação do operário e menos o selo de uma casa.

Aliás, era muito frequente a porcelana de Paris não ser marcada. Cerca de 70 % das peças não apresentam qualquer chancela. É pois muito difícil atribuir a produção não marcada a umas das muitas casas de que se conhece a existência através da documentação, além de que muitas delas compravam a porcelana por pintar em Limoges ou até mesmo a Sêvres. Portanto encontramos decorações diferentes em peças iguais.
Serviço Vieux Paris visto num site de leilões em França

Por outro lado, estas duas peças pertencentes ao Manel são também muito parecidas com a produção Vista Alegre no mesmo período. Veja-se o exemplo do serviço Vista Alegre do Museu Nacional de Arte Antiga. Talvez a única diferença, seja no brilho. A Porcelana de Paris apresenta uma pasta com um branco leitoso, brilhante e usa e abusa dos dourados.
Serviço Vista Alegre do Museu Nacional de Arte Antiga. As semelhanças com a Porcelana de Paris são evidentes
Muito embora nos manuais escritos sobre a fábrica de Ílhavo apenas sublinhem a influência de Sêvres, parece mais ou menos evidente que a Vista Alegre seguia de perto a produção dos fabricantes parisienses de porcelana. É certo que as casas de porcelana parisienses copiavam Sêvres, mas as semelhanças entre a Vista Alegre e a Porcelana de Paris são de facto óbvias, como já tivemos ocasião de ver em outros posts.

domingo, 11 de março de 2012

Jarro de Massarelos: 1912/1920

Há peças que não são muito antigas nem muito valorizadas no mercado de antiguidades e velharias, como este jarro da fábrica de Massarelos, do início do século XX, mas que tem um valor forte para nós. A minha avó materna só bebia água por ele. Tê-lo em minha casa e vê-lo todos os dias é como poder rever por um momento as férias da minha infância numa casa grande de Trás-os-Montes e recordar-me da minha mãe e das minhas tias, que me contaram a história dele. Hoje, já só eu sei a sua história.
Segundo o Dicionário de marcas de faiança/ Filomena Simas, Sónia Isidro. – Lisboa: Estar Editora, 1996, este jarro terá sido executado entre 1912/1920, anos que a minha avó estaria a ter os primeiros filhos. Começou a dar a luz aos 16 anos, teve sete crianças, tendo a última nascido em 1931.


Não sei o que é que os filhos têm a ver com o jarro, mas as memórias são muitas vezes causadas por simples objectos, que nos mostram que o tempo passou demasiado depressa, que os adultos que protegeram a nossa infância já morreram e que nós já estamos na meia-idade. Os tons sépias idênticos aos das antigas fotografias que Massarelos usou nesta época, emprestam também a este simples objecto uma carga sentimental, que me toca.


E depois há um certo ar de arte nova nesta peça que recorda a Cidade do Porto, que ao contrário de Lisboa manteve e preservou a arquitectura ecléctica dos finais do século XIX, princípios do século XX. Enfim, hoje estou sentimental.


sexta-feira, 9 de março de 2012

O império da crinolina (1852-1870)

Há umas semanas não consegui deixar de comprar esta pequena estampa, que presumo ter feito parte de um desses jornais de moda parisiense do século XIX, que eram avidamente lidos na Europa e na América. Talvez tenha sido extraída do mais famoso deles todos, o Journal de Demoiselles, publicado a partir de 1833 ou de outra qualquer revista de moda concorrente.




Sei que é uma estampa preciosa e arrebicada, mas o detalhe dela atrai-me. Julgo que o desenho pormenorizado era intencional, para que as modistas das elegantes de Varsóvia, Lisboa ou Barcelona, Rio de Janeiro ou Viena pudessem copiar os modelos de Paris. Mas havia também um óbvio prazer dos artistas em desenhar estas obras. Repare-se na forma como o desenhador anónimo representou com todo o cuidado, como pano de fundo, um jardim romântico composto, por um lago com um barco e uma cascata artificial, bem como por um caminho no bosque, pelo qual casais elegantes se passeiam.


Talvez goste tanto desta estampa, porque me transporta para a Paris do início do Segundo Império, onde a crinolina (1852-1870) reina em absoluto nas modas e em que são precisos pelo menos 10 metros de tecido para fazer uma saia.

Decidi colocar esta ilustração por cima do espelho da casa de banho, talvez para me recordar de que houve um tempo que as pessoas não se tinham que arranjar à pressa para ir trabalhar.


domingo, 4 de março de 2012

Angelika Kauffman, Bartololozzi e Vieira Portuense

Angelika Kauffman, Por Sir Joshua Reynolds e gravada por Bartolozzi. Estampa datada de 1780, propriedade do nosso amigo do Norte.

Ao longo deste blog fui escrevendo vários posts sobre gravura, uma área que conhecia muito superficialmente e aos poucos fui-me apercebendo que esta é uma arte de cópia, em que o conceito de direito de autor é qualquer coisa de inexistente. O gravador cópia obras de arte, ou muitas vezes reproduz partir de outras estampas que já por si são cópias de pinturas.


Também vimos que alguns gravadores, como Bartolozzi copiaram as obras originais através de desenhos feitos por si e só depois abriram as gravuras. Esta arte de tradução da obra de outros artistas, que fazem os gravadores é também sempre uma traição, pois acabam sempre por recriar o original.



Depois de receber mais algumas de Bartolozzi, que um amigo nosso do Norte me enviou por e-mail, consultei o catálogo da exposição Francisco Vieira o Portuense: 1765-1805. – Lisboa: IPM, 2001 e consegui entender um pouco melhor o que se passou no mundo das artes e da gravura nos finais do Século XVIII, inícios do XIX.


Neste período, os impressores, gravadores e artistas começam a perceber que existia uma burguesia emergente que queria ter bonitos quadros em casa, mas que não tinha dinheiro para comprar pinturas dos grandes mestres, nem sequer para cópias medíocres a óleo ou aguarela. Por isso, na segunda metade do Séc. XVIII generaliza-se a impressão e venda de álbuns de estampas, destinados às casas burguesas, que depois eram destacadas, encaixilhadas e postas a decorar as paredes das salas e quartos. Esta produção tornou-se mesmo um negócio chorudo e quer artistas, quer gravadores dedicaram-se a ele, pintando quadros com o único objectivo de os verem divulgados em gravura, coleccionando grandes mestres do Renascimento, do Século XVII ou mesmo de pintores contemporâneos, para os copiarem sem complexos ou pejo e os passarem a gravura.

Bíblia impressa em 1774. Estampa gravada por Bartolozzi a partir de uuma obra de Tiepolo. Da colecção do nosso amigo do Norte

Para ilustrar o que afirmo, apresento uma belíssima estampa, que integra uma Bíblia, gravada por Bartolozzi e cujo modelo original foi nada menos nada mais do que a obra de um dos génios da pintura europeia, o veneziano Tiepolo (1696-1770).


Esta estampa enviada pelo nosso amigo do Norte mostra bem que copiar a obra dos grandes mestres do passado é uma actividade bem vista e uma forma comum nesta segunda metade do XVIII de divulgar a obra da grande pintura junto de um público mais vasto. Neste caso, através de um livro.



E qual era o melhor sítio na Europa do Século XVIII para copiar as obras dos grandes mestres da Pintura? Naturalmente a Itália. Todos os artistas europeus para lá se dirigem e passam largas temporadas em Florença, Roma ou Veneza a copiarem os mestres do passado e a inspirarem-se na arquitectura e nas ruínas romanas. Angelika Kauffman, uma pintura anglo-suíça estava na década de 80 em Roma, a inalar este ambiente italiano, quando terá conhecido Vieira Portuense, que se também aí se encontrava a aprender arte e a trabalhar com gravadores italianos na reprodução dos grandes mestres. Desse encontro, resultou um retrato de Vieira Portuense feito por Angelika, que ficou por terminar. Essa obra tornou-se um exemplo célebre de que por vezes o inacabado é muito mais fascinante que uma obra concluída.

Vieira Portuense retratado por Angelika Kauffman. Voralberger landesmuseum


Pouco mais se sabe desse encontro, mas os especialistas dizem, que a obra da pintora influenciou Vieira Portuense e além disso haverá de comum entre eles, Bartolozzi.


Estampa de Bartolozzi a partir de um desenho de Angelika Kauffman. Col. da Royal Academy de Londres

Muitas obras de Angelika passaram a gravura pelas mãos de Bartolozzi, gravador que o artista português irá conhecer mais tarde em Londres, em 1797, e com o qual estabelecerá uma estreita colaboração. Aliás um dos trabalhos que se esta dupla italo-portuguesa se dedicará será precisamente à cópia e gravura de grandes mestres, como de Guercino (1591-1666), a partir do qual os dois fizeram esta reprodução de um Cristo e de que se conserva um exemplar na Biblioteca Nacional de Lisboa. Os dois estabeleceram uma parceria tão boa, que terá sido Vieira Portuense quem convenceu Bartolozzi a vir para Lisboa. Parece que o projecto era fazerem uma edição sumptuosa dos Lusíadas amplamente ilustrada.


Ecce Homo. Original de Guercino, desenhado por Vieira Portuense e gravado por Bartolozzi. Biblioteca Nacional de Lisboa

Bartolozzi e Vieira Portuense vieram para Portugal em 1802, mas foram apanhados pelo turbilhão que a revolução francesa e a política expansionista de Napoleão geraram na Europa

sexta-feira, 2 de março de 2012

Travessinha inglesa em forma de concha

Depois de tantos temas sacros, resolvi hoje aligeirar o blog apresentando uma azeitoneira, certamente de fabrico inglês do século XIX. Como já vimos em anterior post, os cidadãos britânicos não tem o hábito português de comer azeitonas às refeições e pickle dish é de facto o nome com que estes pratinhos são conhecidos na terras de Sua Majestade e seriam usados para servir pickles. Os americanos usam o termo Relish Dish. (obrigado, Maria Andrade!)




Este elegante prato em forma de concha apresenta uma marca impressa, que me vi grego para ler. Só depois de ir buscar uma lupa e de esbugalhar bem olhos, consegui ler a Iron Stone Ware, ou indian stone ware  ou talvez iron Stone China. Fiz umas pesquisas na net e fiquei um bocadinho desapontado, pois estas expressões referem-se a um tipo de faiança e não a uma marca de fabricante propriamente dita.



Iron Stone é uma faiança de qualidade superior, que tenta imitar a porcelana. Foi introduzida pelos fabricantes ingleses no início do século XIX, com o objectivo de arranjarem um produto barato, que imitasse a porcelana e fosse acessível a qualquer família burguesa sem especiais meios de fortuna. Foi produzida pela primeira vez em 1800, fabricada por Josiah Spode e celebrizada por Charles Mason, que detinha a patente, muito embora a Job and George Ridgway tenha fabricado um loiça com uma composição semelhante. Muitas outras marcas se lhes seguiram.

Travessa J & G Alcock com o padrão Flow Blue, cerca de 1840

Não consegui discernir com rigor, que fábrica produziu esta travessinha em forma de conha, mas inclino-me para a J & G Alcock, da qual encontrei duas travessinhas nos sites de venda on-line de antiguidades, feitas com o mesmo molde e datadas da primeira metade do XIX. uma em flow blue e outra com o padrão do salgueiro.

Outra peça da  J & G Alcock, com o padrão do salgueiro

Também não consegui interpretar a florzinha estampada no verso.