domingo, 14 de abril de 2013

Santo António de Lisboa por Debrie

D. Antonius Lisbonensis, domus mea, domus orationis
Nunca tive um grande interesse na figura de S. António de Lisboa, nem na sua iconografia. Talvez por excentricidade sempre me atraíram mais aqueles santos que caíram completamente no esquecimento como S. Facundo ou Santa Brígida ou então aqueles com uma conotação sexual mais ou menos evidente como S. Sebastião ou Maria Madalena a arrependida.


Mas quando vi esta estampa de S. António do século XVIII, com um desenho muito requintado encantei-me logo por ela. Achei uma delícia o dossel que cobre a figura do santo. Recordou-me imediatamente uma daquelas camas que estiveram muito em voga no último quartel do Século XVIII, o lit à la polonaise. Vemos um exemplar de um desses leitos no quadro Premier pas de convalescence, de António Pascutti, que embora tenha sido pintado em 1875, reproduz um interior em estilo Luís XVI (1774-1791), quando essas camas, guarnecidas por cortinas em tecidos luxuosos estavam na moda. Era o tempo em que as grandes figuras da aristocracia recebiam visitas formais no quarto e as camas eram pequenos compartimentos reservados.

O Premier pas de convalescence, de António Pascutti representa um interior em estilo Luis XVI, onde se vê um lit à la polonaise. Imagem de http://www.photo.rmn.fr
Quanto a esta estampa do Sto. António, encontrei-a referenciada, no Dicionário Iconográfico português / Ernesto Soares e Henrique de Campos Ferreira Lima. Lisboa: Instituto de Alta Cultura, 1950, que a descreve de forma precisa: S. António debaixo de um dossel de corpo inteiro, de frente, segurando com a direita uma cruz e um lírio e com a esquerda um livro, onde está sentado nu um menino com a coroa Real. A estampa descrita apresenta a mesma legenda que a minha e está assinada por Debrie, ou melhor Guilherme Francisco Lourenço Debrie, o gravador francês ou flamengo trazido para Portugal por D. João V e datada de 1745. 


Porém a minha estampa é mais tardia que 1745. Com efeito, o Dicionário Iconográfico português refere que esta estampa voltou a ser usada com o mesmo delineamento em 1761 no frontispício da obra Cultos de devoção e obsequios, que se dedicão ao Thaumaturgo Portuguez.
A minha estampa foi retirada da obra Cultos de devoção e obsequios, que se dedicão ao Thaumaturgo Portuguez., editada em 1787
Mais tarde, em 1787 esta obra foi reimpressa por Simão Tadeu Ferreira e é desta edição que a minha estampa foi retirada.

6 comentários:

  1. Uma estampa muito bonita.
    Boa tarde.

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  2. Luís, realmente esta gravura de Santo António cativa pelo inesperado enquadramento da imagem do santo, que, como explicou, é muito típico dos interiores nobres do século XVIII . O panejamento que cai do dossel parece ser de arminho, um símbolo de aristocracia e de realeza, o que, se por um lado é contraditório com os votos de pobreza do nosso Santo António enquanto franciscano, por outro deve pretender elevar as figuras ao nível da realeza, como se vê também pelo Menino Jesus coroado.
    Também estranhei o facto de a legenda estar em latim, sendo a gravura retirada de um livro escrito em português. Não sei se seria prática da época, mas nos livros que tenho, nos poucos em que há gravuras, estão legendadas na mesma língua do texto.
    Enfim, mais um pequeno mimo que o Luís aqui partilha, que provoca a minha admiração e desafia a discorrer sobre ele...
    Bjs.

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  3. Cara Ana

    Obrigado pelas palavras simpáticas.

    Um abraço

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  4. Cara Maria Andrade

    De facto desconheço com que regras se fazia convivência entre o latim e o português no mundo da impressão, em Portugal durante os séculos XVII ou XVIII. Mas julgo que não era raro as estampas terem legendas em latim. Tenho uma estampa tb de Debrie, representando D. João I, com a legenda em latim e outra do Rei D. Fernando, tb legendada na mesma língua. Doravante estarei mais atento a esses pormenores, para perceber se há um padrão, que nos esteja a escapar

    Bjos

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  5. O entorno desta imagem é algo mais erudito e revestido de maior nobreza do que é habitual.
    O arminho, símbolo da realeza, não vai de encontro aos ideais ascéticos pregados.
    Não sei se o santo teria gostado muito de se ver rodeado de tal luxo.
    No entanto, a estampa é linda e com um desenho cuidado, que me encanta.
    Claro que, hoje em dia, tendo aprendido a ter prazer neste tipo de iconografia dou valor não só a estas formas mais cuidadas de representação, como às mais rústicas e ingénuas. Foi uma aprendizagem lenta, mas tem sido um caminho que me tem dado muito prazer.
    Manel

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  6. Manel

    As estampas religiosas desta época são uma delícia para os olhos e uma colecção pouco custosa para se constituir. E depois todas elas tem sempre pormenores engraçados, como por exemplo este dossel representando uma cortina forrada a arminho, que é um pormenor tão típico das artes decorativas da segunda metade do XVIII.

    Abraços

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