Hoje apresento aqui dois grandes pratos de faiança portuguesa, certamente do século XIX e dos quais não sei nada, além de que são bonitos. Não apresentam qualquer marca e também encontrei nada que se lhe assemelhasse nos catálogos de faiança, que tenho lá em casa, de modo a ter uma pista para identificar o seu fabricante ou local de produção. Aliás, estes dois pratos, que pertencem ao meu amigo Manel, são quase paradigmáticos do conhecimento que se tem de uma boa parte da faiança portuguesa do século XIX, quer dizer, há peças fantásticas e muito criativas, mas como não estão marcadas, pouco ou nada se sabe delas e limitamo-nos quase sempre a escrever meia dúzia de impressões, que podem perfeitamente estar completamente erradas, e, é precisamente isso que irei fazer neste post.
Pela boa qualidade da faiança ou talvez por mera intuição, eu diria que estes enormes pratos foram fabricados algures em Gaia ou no Porto.
Pela boa qualidade da faiança ou talvez por mera intuição, eu diria que estes enormes pratos foram fabricados algures em Gaia ou no Porto.
A decoração com motivos vegetais distribui-se assimetricamente pelas orlas dos pratos. É uma pintura de uma grande simplicidade, com os elementos estilizados de uma elegância despojada, quase japonesa, o que me faz pensar se não serão peças já posteriores a cerca de 1870-1880, quando a moda do japonismo aparece na cerâmica europeia. Contudo, mais a Sul, em Coimbra as oficinas de faiança produziam os modestos pratos ratinhos, que apresentam igualmente decorações assimétricas e por vezes despojadas, mas duvido que esses mestres coimbrões soubessem sequer o que era o Japão. Na prática, fico na dúvida se estes dois pratos são uma visão da natureza profundamente popular, que se encontra na também louça ratinha, ou se são uma interpretação popular de uma moda mais cosmopolita e erudita, como foi o japonismo na arte europeia nos últimos 20 ou 30 anos do século XIX.
Igualmente baseado numa intuição, julgo que estes dois pratos saíram da mesma fábrica e talvez até das mãos do mesmo artífice. Apetece-me fazer como os historiadores da pintura primitiva europeia, que criaram designações poéticas para oficinas de pintores, cujos nomes não conseguiam identificar, como por exemplo os Maîtres à l'œillet ou o Mestre do Retábulo do Paraíso. O artesão que decorou estes dois pratos merecia bem ficar na história da cerâmica como o mestre das folhagens.
Em todo o caso, seja lá qual foi a inspiração que moveu as mãos deste mestre das folhagens, o trabalho que deixou nestes pratos evidencia bem a enorme criatividade da faiança portuguesa do século XIX.
Luis,
ResponderEliminarUm alô.
E umas tentativas:
1- Sempre gosto de ver os fundos... Nem sei por quê.
2-Aprendi com Vc mesmo que sempre devemos desconfiar das atribuições..
3- Os desenhos seguem como que um comando natural de estilo e estética.Da esquerda para a direita.
4- No segundo prato (considerando as fotos isoladas) vi muito mais de PT que no primeiro. Embora seja tão iniciante para assim julgar.
5- Talvez pelo estampilhado ou estanholado, que não vi ou não tenha no primeiro. Ficou muito legal a combinação de um detalhe "mecânico" sobre o desenho à mão livre...
6- Mas estes estanholados enganam. Um dia desses comprei, por foto, um prato com flores bem coloridas nesta técnica. Mas quando recebi vi a marca jamais suspeitada: Czechoslovakia...
7- De toda forma são muito belos e merecem sólidas paredes ou encerados móveis.
8 - Em tempo: Revendo as fotos, ampliadas, acho que o prato mais "japonês" apresenta também a técnica de estanhola em suas flores em azul e amarelo.
Um abraço.
ab
Sim Amarildo, no primeiro prato também houve uso de estampilha. Muito menos elaborada do que a do segundo, mas está lá, nas flores amarelas.
Eliminarabraços
Fábio C.
ResponderEliminarObrigado pela confirmação.
Sabemos que além de curioso, apaixonado e teórico de Louças, Vc é também um artista e artífice, de mãos na massa, de trabalhos em cerâmica e afins.
Devo alternar a última postagem, sobre um vaso S. Antpnio do Porto todo estilhaçado e (mais ou menos) remontado por mim, com uma postagem sacra para fazer em seguida um post sobre louças. Mas não decidi ainda. Sem querer, acabei ampliando meu interesse inicial que era de peças brasileiras e portuguesas pelas inglesas e francesas, sobretudo as faianças decoradas à mão. Quando postar adoraria ter sua opinião.
Um abraço.
ab
Caros Amarildo e Fábio
EliminarSou pouco entendido em técnicas de cerâmica, mas julgo que estes dois pratos combinam a técnica de estampilha e pintura manual.
Os fundos são as paredes exteriores caiadas da casa alentejana do Manel. Achei que se coadunavam com a decoração estilizada destes pratos.
A Checoslováquia foi um país muito industrializado, que produzia automóveis, locomotivas, aviões, calçado, vidros e cristais e claro está, faiança e porcelana.
A minha ex-sogra tinha os restos de um serviço de chá, arte déco, com uma porcelana muito fina, comprado em segunda mão, pela mãe dela, em Angola nos anos 50. Sabe-se lá como lá foi parar, mas era uma coisa linda.
Um abraço aos dois
Olá Luis,
EliminarÉ exatamente isso! Ambos paresentam combinação de pintura à mão livre com estampilha, o segundo o uso da estampilha foi em maior extensão.
abraços e até muito breve.
Muito obrigado, Fábio!
EliminarO que me agrada nestes pratos é a assimetria a par de um traço livre e fluído das folhagens, que denotam uma mão segura. Gosto da forma como se desenha na cerâmica, pois quando se sobrepõem traços, perde-se a vivacidade e frescura do trabalho. O traço pintado na cerâmica é muito frágil.
ResponderEliminarReparei isso na cópia de uma peça ratinha que comprei há mais de dois anos atrás, o que, aliás, mais tarde, foi aqui objeto de um post teu. Comparando-a com o original, o que consegui fazer, graças a generosidade dos seus donos, a diferença é absolutamente gritante.
Mas voltando a estas peças, a combinação de cores e a assimetria apontam para alguma possível influência oriental, que se manifestou na Europa pelos finais do século XIX, e que invadiu o organicismo de vários movimentos quer decorativos quer arquiteturais.
Aonde e quem terá produzido estes pratos, não tenho qualquer ideia, nem ainda consegui encontrar outras peças semelhantes que apontem para pistas, mas ... um destes dias poderá surgir uma luz qualquer.
Até lá basta-me observá-los pois encontro nisso prazer
Manel
Manel
EliminarOlhamos para estes pratos, admiramo-los, mas parece que não conseguimos desvendar o seu segredo. Eu até lhe encontro um ar de família com aquele meu prato, que um dia comparei à árvore da vida. Mas, querer estabelecer assim famílias com base em intuições, incorre-se sempre em riscos de disparate. Em todo o caso, quem pintou e concebeu estes pratos era alguém com uma criatividade intensa.
Um abraço
Luís
ResponderEliminarSei que gosto das cores, do tema, do movimento do "mestre das folhagens" como, muito a propósito, lhe chamou. A incógnita da sua origem perde-se no anonimato dos seus artesãos. Mas o prazer de os admirar, faz esquecer esse pormenor. Não cometeremos grande afronta ao apontarmos a sua produção como nortenha, talvez das bandas de Gaia.
Esperemos novas pistas...
Gosto especialmente do prato com as folhagens verdes, naquele tom um pouco esmaecido, que lembra Fervença (?). As pinceladas são certas, precisas, denotando uma mão experimentada que sabe o que desenha, não necessitando de esquema prévio.
O "decor" que os enquadra é perfeito.
if
Ivete
EliminarConfesso que aguardava a sua opinião, porque sei que além de um olho experimentado, fez da faiança objecto de estudos académicos. Ainda bem que partilha a minha intuição de que estes pratos serão provavelmente de Gaia.
Quanto a determinar o seu centro de fabrico, teremos que ser pacientes e aguardar que apareça um prato marcado com as características destes ou que alguém publique mais resultados de escavações arqueológicas no Porto ou em Gaia.
A simplicidade das paredes caiadas de uma casa alentejana vai bem com estilização quase japonesa destes pratos.
um abraço
Que belo par de pratos, Luís e Manel!
EliminarE as fotos de "casal" ficaram lindas!!!
Razão tem o Manel para encontrar prazer ao desfrutar da sua companhia!
Também adoro a assimetria na decoração, mas hesitei em dar o meu palpite sobre a origem, porque ao contrário do Luís e da Ivete, não diria que serão ambos do Norte, de Gaia particularmente. O das folhagens a azul sim, inclino-me para Gaia, mas quanto ao outro, leva-me mais para Coimbra, vá-se lá saber porquê!
Nestas coisas, não havendo marcas e conhecimento de pastas, às vezes é mais o feeling, o déjà vu, sei lá...
Mas que casam muito bem juntos, disso não há dúvida!!!
Beijos
Maria Andrade
EliminarObrigado pela sua opinião.
Sabe que muitas vezes quando não sei acerca de uma peça, coloco-a aqui com que à consideração dos outros, porque é sempre bom conhecer as outras opiniões e de facto às vezes dá resultado. Por exemplo, há uns anos coloquei uma estampa aqui com as legendas ao contrário, que eu não percebia a razão e um comentador anónimo, passado um ano, escreveu-me em inglês a explicar que aquela gravura era uma vue optique, destinada a ser lida por um aparelho óptico, do qual constava um espelho e uma lupa.
Mas voltando às faianças, embora pense que pela boa qualidade do vidrado, me pareçam do Norte, não me deixaram de recordar de alguma forma a decoração dos ratinhos coimbrões, com as suas ramagens e flores dispostas assimetricamente. Enfim, mais um mistério da faiança portuguesa e teremos que aguardar pacientemente por novas pistas, como referiu a Ivete
Bjos
Luís,
ResponderEliminarSão ambos lindos. Talvez prefira o azul, não sei mas parece-me mais antigo que o verde. Porém o verde tem um movimento delicado. O Manuel teve sorte em encontrar estas duas peças bonitas.
É um desafio sempre voltar aqui. Gostava de encontrar estas raridades e não me perder em tudo.
Beijinho.:))
Ana
EliminarEstes pratos que não apresentam qualquer marca são sempre um mistério. Quando já se tem o olho muito treinado, consegue-se perceber mais ou menos a época e talvez o centro de fabrico, mas em todo o caso, não se consegue ir mais além e fica sempre a incógnita.
Beijinho