segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

O Solar dos Montalvões inventariado nos monumentos.pt

O Solar dos Montalvões em Outeiro Seco. Foto de Humberto Ferreira
A maioria de nós sente-se impotente para lutar contra a degradação do património cultural português. Limitamo-nos a protestar aos gritos quando a televisão mostra as imagens de uma igreja arruinada, a indignarmo-nos com os amigos quando passeamos por uma rua do centro histórico de uma qualquer vila ou cidade e deparamo-nos com as casas antigas devolutas, ameaçando ruína ou ainda rosnamos sozinhos, quando lemos nos jornais mais uma notícia de uma antiga capela, cujo tecto desabou. Partilho esse sentimento de impotência com quase todos os cidadãos. Também não faço parte de nenhuma associação de defesa do património, sou pouco empreendedor e falta-me energia para escrever cartas de denúncia dessas situações aos presidentes das Câmaras, aos directores dos jornais ou para à Direcção Geral do Património Cultural. Gostaria de ser diferente, ter uma natureza mais aguerrida, mas infelizmente faltam-me essas qualidades. De certa forma, tal como todos os portugueses, sou pouco ou nada participativo na vida do País e sou por isso cúmplice passivo do abandono ou destruição do património cultural português.
Foto Humberto Ferreira

Contudo, o cidadão hoje tem à sua disposição a internet, onde através de um simples clic, pode publicar as suas opiniões, os seus gostos e de certa forma participar na vida pública da comunidade. Foi precisamente isso que fiz e usei este blog para denunciar o estado de abandono total de um velho solar de transmontano, outrora pertencente a minha família e hoje propriedade da Câmara Municipal de Chaves, que se está absolutamente nas tintas para a degradação progressiva do edifício. Esta denúncia foi aparecendo de forma subtil nos textos do blog, pois muito mais do que berrar contra a autarquia, que é sempre uma actividade pouco educada, procurei antes fazer qualquer coisa mais útil, publicando fotografias antigas, as plantas e alçados da casa, contando histórias sobre os seus habitantes e a utilização de cada uma das salas ou dos quartos e até o catálogo da antiga biblioteca, cheia de obras raras e infelizmente hoje dispersa. Além de um objectivo sentimental de recordar histórias de antepassados e fazer a história da família Montalvão, procurei fornecer elementos úteis a quem um dia queira reconstruir o solar, ou pelo menos, proporcionar uma memória mais clara e precisa do edifício aos seus verdadeiros proprietários, os cidadãos do Concelho de Chaves, quando um dia as suas paredes caírem de vez. 

Feito sobretudo a partir das memórias coligidas pelo meu pai e com a ajuda de amigos, o Manuel Sousa Cardoso e o Humberto Ferreira, este trabalho de reconstituição do solar dos Montalvões em Outeiro Seco desenvolvido neste blog obteve uma pequena vitória, pois aquele edifício passou agora a fazer parte do inventário nacional do património cultural, que se encontra on-line no site http://www.monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=35397. Para quem não saiba o monumentos.pt é um inventário criado pela antiga e prestigiada Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais e se bem que constar desse cadastro do património arquitectónico não seja uma classificação, significa porém que o solar foi considerado um bem cultural por uma entidade tutelada pelo Ministro da Cultura 

 Agradeço aqui publicamente a Dra. Ana Paula Noé, do Forte de Sacavém, o interesse que demonstrou desde logo para que o Solar de Outeiro Seco constasse do inventário dos monumentos.pt, bem como ao Sandro Campos-Matos, que sempre insistiu para que eu saísse da minha habitual inércia e empreendesse todos os contactos para que o referido Solar fosse registado naquele site.

24 comentários:

  1. Bom dia Luís,
    Estás de parabéns. Este é o culminar de um grande esforço da tua parte.
    Resta agora que as entidades públicas percebam o que estão a deixar destruir.
    Um abraço,
    Berto

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    1. Caro Humberto.

      Muito obrigado. Já vi que fizeste também uma notícia no teu blog sobre este assunto, que importa não deixar morrer.

      O registo no inventário dos monumentos.pt significa que há uma instituição pública, que guardará memória do que foi o solar, das plantas, das fotografias e um pouco da sua história. Significa igualmente que a casa está numa lista de bens culturais do Ministério da Cultura. No fundo, acrescentámos dois pontos de eventual preocupação à autarquia de Chaves, na eventualidade de os seus decisores e gestores terem alguma consciência cívica. Julgo que não a terão, mas nós querermos acreditar que sim.

      Um abraço

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  2. Caro Luís
    Muitos parabéns por este feito. Pode ser que esta inventariação desperte algum interesse nos responsáveis e alguma proteção comece a ser dada ao solar. Ao ler o seu post lembrei-me da história infantil em que o vento convencido da sua força propõe ao tranquilo sol uma aposta sobre quem conseguiria fazer um homem despir o casaco. Pois tal feito foi conseguido não pelo vento, mas sim pelo sol que usou não a força espalhafatosa e bruta mas sim persistência. :) Deformação profissional. Tantas vezes a vida me faz lembrar as histórias que conto às minhas crianças. Mas a verdade é que os seus posts sobre o solar dos Montalvões produziram um efeito que, quem sabe, poderá ser o inicio de uma bola de neve.
    Bjs

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  3. Caro Luís
    Muitos parabéns por este feito. Pode ser que esta inventariação desperte algum interesse nos responsáveis e alguma proteção comece a ser dada ao solar. Ao ler o seu post lembrei-me da história infantil em que o vento convencido da sua força propõe ao tranquilo sol uma aposta sobre quem conseguiria fazer um homem despir o casaco. Pois tal feito foi conseguido não pelo vento, mas sim pelo sol que usou não a força espalhafatosa e bruta mas sim persistência. :) Deformação profissional. Tantas vezes a vida me faz lembrar as histórias que conto às minhas crianças. Mas a verdade é que os seus posts sobre o solar dos Montalvões produziram um efeito que, quem sabe, poderá ser o inicio de uma bola de neve.
    Bjs

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    1. Maria Paula

      Obrigado por referir essa história que servirá eventualmente de alegoria ao trabalho, que aqui fiz de relembrar a ruína de um bem cultural. Provavelmente os meus escritos não travarão a deterioração do solar, mas pelo menos consegui que a sua memória subsista.

      Bjos e mais uma vez agradeço as suas palavras de encorajamento

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  4. Caro Luís,

    Não podia deixar de vir aqui escrever algumas linhas acerca deste assunto.
    Fiquei muito contente com o sucedido, não só pelo solar em si que é lindo, mas também por si que merece!
    Afinal de contas, foi justamente através de um seu texto referente a umas porcelanas Vista Alegre que entrei neste Universo do Solar dos Montalvão. Sim, porque naquela tarde li quase tudo o que a ele dizia respeito. O Luís conseguiu transportar-me no tempo. Adorei ter "conhecido" todos os personagens que nele habitaram, e que nele fizeram história!
    Faço figas para que esta novidade, seja apenas o início de um recomeço para outros voos que a esse Solar de Família possam estar destinados!!

    Beijinho

    Alexandra Roldão

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    1. Alexandra.

      Muito obrigado.

      Embora aparentemente as velhas histórias de famílias digam respeito apenas aos próprios, se forem bem contadas poderão ter um interesse mais abrangente. Por exemplo, encantei-me com a história daquele seu parente que combateu na Grande Guerra.

      O facto de o Solar estar já cadastrado no site monumentos.pt, organismo tutelado pelo Ministério da cultura, confere-lhe já a categoria de bem cultural.

      Bjos e mais uma vez obrigado

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  5. É uma boa notícia, que me apraz saber. Oxalá tenha eco em alguém que possua a capacidade para mudar o destino daquele que foi o solar dos Montalvões, pois aquele que vejo não é auspicioso.
    No entanto nunca se sabe. Há pouco tempo atrás, era mais uma ruína destinada ao esquecimento, e isso, pelo menos por agora, já não o é.
    A construção merece que algo se faça, no entanto é necessário que a edilidade e a população tenha esse sentido.
    A primeira fotografia, do Humberto, é muito bonita e dá uma ideia de uma das perpetivas do solar que não consegui descortinar quando o visitei há anos atrás.
    Boa continuação desta luta contra "moinhos de vento"
    Manel

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    1. Bom dia Manel,
      Essa fotografia foi captada, utilizando uma teleobjectiva, desde o alto de umas fragas que estão ao lado das lagaretas e da última sepultura cavada na rocha que resta na Mina.
      As restantes sepulturas, que estavam a poente da Capela de Nossa Senhora da Portela (do outro lado da estrada), como sabemos, foram destruídas pela CMChaves.
      Um abraço,
      Berto

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    2. Manel

      Quando se diz que o Solar dos Montalvões é propriedade da Câmara Municipal de Chaves, significa que aquela casa antiga é propriedade dos cidadãos do Concelho de Chaves e que todos eles se devem empenhar em defender o seu património cultural. A cidade de Chaves e o seu Concelho não tem assim tantos edifícios históricos, para se dar ao luxo de deixar cair este.

      Um abraço

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    3. Humberto

      O Manuel e eu interrogámo-nos acerca do sítio onde conseguiste este plano maravilhoso do Solar, envolto em arvoredo e com a serra lá ao fundo. Parece que resume em si todas as características do vale de Chaves. Foi realmente uma fotografia muito feliz, até porque não é fácil obter boas imagens da fachada nobre do solar, pois a rua em frente é estreita e os malvados dos fios de electricidade, estragam todos os planos.

      Um abraço

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  6. Caro Luís Montalvão,
    Como outeiro secano ainda que não residente, é também com tristeza e consternação que vou assistindo à degradação do solar. Assim fiquei muito satisfeito, com a notícia da sua inclusão na lista dos monumentos,porque desta feita Outeiro Seco passa a ter dois imóveis registados, o solar e a igreja da Senhora da Azinheira.
    Mas Outeiro Seco tem ainda mais património completamente ostracizado entre os quais os lagares cavados na rocha de Vale de Lagares que tudo indica remontam à época da romanização e mais recente os frescos descobertos e requalificados na capela da Sra do Rosário. Quanto ao solar, tem havido muita informação contraditória sobre o mesmo, umas vezes tem circulado de que o mesmo foi vendido pela Câmara Municipal, mas o certo é de que o mesmo, continua na sua imparável degradação.
    Obrigado Luís pela sua cruzada na defesa do solar-
    Cumprimentos,
    Nuno Santos

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    1. Caro Nuno Santos.

      Muito obrigado pelo seu comentário. Como sabe a minha família paterna é originária de Outeiro Seco e apesar de viver em Lisboa desde sempre, tenho uma ligação emocional forte a Trás-os-Montes, até porque a minha mãe é também originária desta província, de Vinhais, a uns sessenta e tais km dali. Talvez por esse apego à terra de origem ser ainda tão forte, o Solar de Outeiro Seco foi sendo sempre um tema presente neste blog. O objectivo destes escritos, foi colar e juntar as memórias que ainda existiam do seu passado e também chamar a atenção para a comunidade, que aquele edifício é importante do ponto de vista da arte e da história. Conseguir que o Solar passa-se a fazer parte do castro do monumentos.pt foi uma pequena vitória.

      Permita-me fazer uma correcção à sua afirmação de que no monumentos.pt só se encontram inventariados em Outeiro Seco o Solar dos Montalvões e a Igreja da Senhora da Azinheira. Na verdade, nesse site há também uma ficha de inventário para os seguintes bens culturais de Outeiro Seco:
      -Capela da Senhora da Portela
      -Cruzeiro da Senhora da Portela
      -Cruzeiro em Outeiro Seco ( o que fica em frente ao Solar)
      -Escola Primária de Outeiro Seco
      -Vale de Lagares

      O Forte de Sacavém, que é a entidade que gere o site monumentos.pt permite também ao cidadão sugerir monumentos que ali devam constar, como por exemplo igrejas, capelas, cruzeiros, castelos, ruínas romanas, desde que as pessoas enviem fotografias boa qualidade e textos fundamentados com bibliografia ou documentação de arquivos. Acho esta política muito interessante, até porque há por este nosso País fora centenas de edificações antigas, que estão por inventariar ou estudar e que só as pessoas que ali vivem perto conhecem.

      Um grande abraço e fico muito feliz por saber que há mais um amigo nesta causa.

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  7. Olá Luís,
    Obrigado pela informação pois desconhecia a existência dessa entidade Forte de Sacavém, pois conhecia apenas o IPAR, antiga DGMN.
    Quanto à causa da defesa do património de Outeiro Seco desde há muito que aderi a essa causa. Um abraço e parabéns pelo seu excelente blogue.
    Nuno Santos

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    1. Caro Nuno

      O Forte de Sacavém era o antigo centro de Documentação da DGMN, que entretanto foi extinta. Hoje, o Forte de Sacavém depende da Direcção Geral do Património Cultural, organismo do Ministério da Cultura, que sucedeu ao IPPAR. Enfim, as trapalhadas da administração pública portuguesa.

      Um abraço

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  8. Bom dia
    Valente Luis ....
    Agradeco o teu trabalho e coragem, so' por este blog vou sabendo algo sobre.....
    Um abraco

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    1. Cara Cristina Freixo

      Muito obrigado pelas palavras de apoio, que são muito importantes para mim.

      Um abraço

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  9. Meu caro Luís
    Regozijo-me consigo por esta vitória já alcançada!
    Acompanhei sempre com todo o interesse aqui no blogue as histórias e evocações da vida no solar, as descrições do seu património arquitetónico, o património familiar e social que lhe esteve ligado, e muitas vezes me indignei com o abandono a que foi votado!
    É certo que o abandono continua, mas o reconhecimento do seu valor através da inclusão no cadastro de monumentos nacionais, pode ser a pedrada no charco para despertar consciências e vontades e fazer com que a sorte do edifício mude qualquer dia.
    Dou-lhe os meus parabéns pela sua ação persistente e sistemática a favor deste velho monumento de Outeiro Seco! Água mole em pedra dura tanto bate até que fura, não é assim? Desta vez foi assim, resta esperar que a água que já passa faça mover algum moinho!!! ;)
    E já agora, a foto do Humberto Ferreira ficou um encanto!
    Beijos

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    1. Maria Andrade

      Muito obrigado. Até agora, as informações sobre o Solar da família Montalvão andavam dispersas por dois ou três blogs particulares. Agora o edifício consta do inventário de uma instituição oficial dependente do Ministro da Cultura, o que parecendo que não, empresta um valor mais importante ao Solar. Embora duvide que algum cargo dirigente da Câmara Municipal de Chaves tenha pachorra para ler o que aqui escrevo ou consultar o monumentos.pt, pode ser que exista por lá algum espírito iluminado que se lembre que o Concelho não tem assim tantos monumentos históricos, para se dar ao luxo de deixar cair este.

      Concordo consigo. A fotografia do Humberto é estupenda e consegue dar uma visão do Solar inteiramente nova.

      Bjos

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  10. Luís,
    Parabéns. Vejo que os esforços envidados levaram a um bom final. Deixemos o resto para a consciencialização de quem defende o património e a História local.
    Desejo que agora cadastrado dignifiquem o edifício e que o Luís veja que as pessoas podem aprender com o passado a si ligado.
    Beijinho.:))

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