sexta-feira, 24 de outubro de 2025

Um tête-à-tête de Limoges para um homem só



Este pequeno serviço de chá incompleto foi a minha última compra na feira de velharias de Estremoz. Foi uma tolice, pois não preciso dele para nada, tenho um belo serviço de chá da Vista Alegre, com uma marca usada ente 1922-1947, herdado da minha avó Mimi e que está completo, além do mais, não tenho propriamente vida para oferecer chá e bolos aos dias de semana, nem tão pouco ao fim-de-semana.

Mas o serviço era tão bonito e como estava a um preço convidativo lá voltei eu com ele debaixo do braço. É aquilo que se designa pela expressão francesa, tête-à-tête, isto é um serviço de chá para duas pessoas. Fiz até a experiência, enchendo o bule de água e serve exactamente para dois, ou melhor, cada pessoa pode tomar duas chávenas de chá. O servicinho está incompleto, falta-lhe uma das xícaras e o tabuleiro, que fazia quase sempre parte destes conjuntos.

A decoração dourada em relevo


O serviço não apresenta qualquer marca e se a teve, estaria talvez na chávena que se perdeu ou no verso do tabuleiro em porcelana. A decoração é rebuscada, estilo rocaille, com dourados em relevo, mas a grinalda de flores, que corre já tem um certo movimento da arte nova. Enfim, é um conjunto típico dos finais do século XIX ou eventualmente dos primeiros anos do XX, em que se mistura um pouco de todos os estilos.

No início quando o comprei, pensei que se tratava de qualquer coisa alemã, ou checa, ou para ser mais exacto da Boémia Morávia, já que a Checoslováquia só surgiu como estado independente em 1918. Contudo depois de buscas sistemáticas no google encontrei à venda uns quantos serviços de Limoges da época já acima referida, com a mesma decoração rebuscada e dourados em relevo. O problema é que temos todos a ideia feita de que existiu e existe apenas uma fábrica de porcelana em Limoges, a Haviland. Contudo, à época em que este serviço foi executado existiam umas quantas fábricas na cidade de Limoges, produzindo porcelana e claro, muitas das suas peças eram relativamente parecidas, pois procuravam satisfazer o gosto da época e toda a gente queria louça sumptuosa ao estilo Luis XV, Luís XVI, com muito e muitos dourados, enfim uma produção pour épater le Bourgeois como dizem os franceses.

Serviço de chá Limoges à venda na Proantic



Tête-à-tête de Limoges à venda na Proantic. O meu serviço terá tido um tabuleiro como o deste


Não consegui concluir qual das fábricas poderá ter executado este serviço, mas foi certamente em Limoges, algures entre 1890 ou 1900 e poucos.

É um tête-à-tête, expressão francesa, que designa uma situação de duas pessoas a sós, seja para uma conversação privada ou para uma refeição. Como só tenho uma chávena no serviço e sou um homem só, talvez esta compra não tenha sido tão inútil e nele ofereça um chá a mim próprio.



8 comentários:

  1. Oi, Luis !
    No tea for two ?
    But tea for you !!
    Igualmente "bem achado" no teu escrito.Bem merecido também. E igualmente bem acompanhado pela música romântica que todos temos no ouvido.
    Obrigada pelo blog em que sempre aprendo .
    Bijis
    Bli

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    1. Bli

      Este post tornou-se uma brincadeira, um jogo de palavras acerca de um serviço para dois, um chá para dois e a realidade, que é uma chávena para um e um homem solitário. Há que ir tratando estas coisas com humor. Bjos

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  2. É verdade que não precisas destas peças para nada, face à quantidade de objetos semelhantes que inundam a tua casa, mas tem mais a haver com a necessidade de aquisição que se tem e o prazer da posse de belas peças que possam ser admiradas, ainda que não usadas.
    Nunca contei, mas temo que centenas de chávenas inundem os meus aparadores (elas encavalitam-se umas em cima das outras, expõem-se em expositores envidraçados, penduram-se em camarões presos às prateleiras, encafuam-se e escondem-se nos espaços deixados livres por outras peças mais volumosas), e creio que, ainda que utilizasse uma chávena a cada dia, elas não se esgotariam no período de um ano. Andam aqui por casa desde a mais fina porcelana até à mais espessa faiança, provenientes dos mais diversos locais de produção destes artefactos, e estendem-se por períodos que vão de meados do XIX ao XX. Não obstante, das poucas vezes que bebo um chá, utilizo uma caneca de paredes grossas, em porcelana contemporânea que vai ao micro ondas!!!!!!! Vicissitudes da vida monótona e hábitos adquiridos ao longo de uma vida.
    Por isso não creio que haja problemas em teres mais uma chávena de porcelana francesa em casa.
    Admirar belas peças também é salutar, ainda que inútil em termos funcionais
    Manel

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    1. Manel
      Desde que comprei esta casa tenho me moderado e comprado aquilo que realmente precisava, como tapetes, uma vitrina, um escaparate ou uma mesa de apoio. Mas, tantas vezes o cântaro vai à fonte, que lá me tentei com este tête-à-tête incompleto, mas com uma decoração tão preciosa. Claro, são peças que não podem ir à máquina de lavar e muito menos ao micro ondas, mas são tão bonitas...

      Um abraço

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    1. Cara Margarida

      Muito obrigado pelo seu comentário. Um abraço

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  4. Amei o texto, kkkkkk antes só e acompanhado com um serviço Limoges mesmo que desfalcado. A solidão é preenchida com essas coisas, às vezes melhor . Xícara não fala. E nem cria confusão.
    Abraços.

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    1. Caro Jorge. Adorei o teu comentário. A solidão tem destas coisas e os objectos não nos perturbam o sossego. Um grande abraço

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