segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Prato de faiança de Lisboa do 1º quartel do Século XIX


A propósito do post da faiança de Sto. António do Vale da Piedade, uma das seguidoras deste blog, muito amavelmente enviou-me por e-mail um magnifico prato da sua colecção, colocando-me a hipótese de se tratar de uma peça um fabrico daquela fabrica do Norte, pois apresenta a mesma delicadeza de desenho e cores.

Quando abri o ficheiro e vi a imagem fiquei absolutamente encantado e percebi de imediato, que a peça é muito mais antiga do que as faianças apresentadas de Sto. António de Vale da Piedade, que foram produzidas entre 1861-1886. O prato apresenta os amarelos e verdes e uma decoração miúda com flores e folhinhas, que estiveram muito vem voga nos últimos anos do século XVIII e ao longo do primeiro quartel do Século XIX. Embora não seja de todo um especialista na história do traje, parece-me também que a figura humana do centro enverga uma fatiota e um chapéu muito típicos dos finais do XVIII, princípios do XX.

Para não variar o prato da nossa seguidora não está marcado, o que complica a sua atribuição a uma fábrica específica, pois como referi antes, no período de transição entre o XVIII e XIX as decorações com grinaldas a amarelos e verdes estão na moda e o Rato, Miragaia, Massarelos, Bica do Sapato, Estremoz, Viana e Sto. António de Vale da Piedade produziram todos louça com esta decoração.

Esta cópia de decorações, cores e até moldes era muito frequente nessa época. Alexandre Nobre Pais e João Pedro Monteiro explicaram muito bem esse fenómeno da cópia de modelos e decorações da faiança, que tem origem na Fábrica do Rato. Com efeito, além de objectivos meramente comerciais de ganhar dinheiro a produzir e vender louça, a Fábrica do Rato tinha também por função servir como escola de formação para aprendizes de cerâmica vindos de todo o país. Segundo o espírito do iluminismo, que presidiu a esta fábrica de criação pombalina, pretendia-se melhorar o nível das manufacturas cerâmicas do Reino e assim, os jovens quando terminavam a sua formação no Rato e partiam para Estremoz, Viana, Porto ou Aveiro podiam levar consigo não só técnicas como desenhos e moldes. Assim se explica porque é por vezes a produção das manufacturas de faiança nesta época é tão parecida nos centros de produção de Norte a Sul do País.

Voltando a este prato, fiz alguma pesquisa sobre ele, sobretudo no catálogo da exposição, Cerâmica neoclássica em Portugal. – Lisboa: IPM, 1997 e pude constar o mesmo ar de família na faiança desta época.

Sto. António de Vale da Piedade produziu efectivamente loiça a amarelo e verde, mas os motivos mais são mais delicados, conforme se pode observar neste prato do Museu Nacional de Soares dos Reis, inv. 210, também datado do primeiro quartel do século XIX.

Encontrei bastantes semelhanças do prato da nossa seguidora com a loiça de Estremoz, nomeadamente com este prato datado de 1795-1808 da col. Francisco Caldeira Mora.
Mas, a peça mais próxima do prato da nossa seguidora, foi uma bacia de barbear pertencente ao Museu Nacional Machado de Castro, inv 9785, datada do primeiro quartel do século XX e com um fabrico atribuído a uma qualquer fábrica Lisboeta

Seja de que fábrica for o seu prato, a nossa seguidora tem uma peça do primeiro quartel do Século XIX, digna de Museu

5 comentários:

  1. Belíssimas peças e fotos,parabéns e obrigado por nos dar a possibilidade de ver tais preciosidades.
    Os meus cumprimentos
    José Castro

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  2. Caro José

    Muito obrigado pelo seu comentário e fico contente por ter sido útil e proporcionar prazer aos seguidores deste blog

    Abraços e volte sempre

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  3. Caro Luís,
    Este prato é realmente magnífico, uma verdadeira peça de museu, e o Luís fez um excelente trabalho ao explicar como os conhecimentos, os modelos e os desenhos fluiam de fábrica para fábrica, acompanhando trabalhadores ceramistas q recebiam formação na Real Fábrica do Rato e depois regressavam às suas unidades de origem e até podiam circular entre elas.
    Estas cerâmicas neo-clássicas têm uma beleza muito delicada, pelas cores e pelos motivos, e este prato não foge à regra, embora nunca tenha visto um desenho tão cheio como este. Conheço o catálogo q refere pois tinha-o à disposição na biblioteca do Centro de Formação a q pertencia e consultei-o várias vezes.
    Enfim, o Luís disse tudo o q havia a dizer, mostrou exemplares fantásticos e a nós resta-nos admirá-los...
    Agradeço também à possuidora deste prato que ao enviar-lhe a foto permitiu aos seguidores deste blogue conhecer mais uma bela peça de faiança antiga portuguesa.

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  4. Olá Luís.
    Interessante esta partilha que por aqui se vai no tempo constatando.Todos ficamos mais ricos com o que acrescenta.
    De facto nunca vi nenhum prato igual nem parecido.Algo me despertou, há tempos a Maria Andrade mostrou um pequeno prato da sua colecção atribuído à fabrica CAVACO cujo motivo central, homem a baloiçar um relógio. Num repente, apesar do prato Cavaco ser de uma fase mais antiga do que este apresentado, acho o motivo central com semelhanças, aliás não é bem visível mas leva nas mãos também alguma coisa.O vidrado do verso do prato é muito bom,possivelmente da Bica do Sapato que pintou muito em amarelo.

    De qualquer das formas concordo consigo, é por certo um bom prato digno de Museu.
    Parabéns à seguidora deste blog que possuí rara peça de faiança. Interessante seria a meu ver saber a sua proveniência, se o adquiriu ou foi herança, isto uma mania minha, por aqui também será sempre um caminho de descobertas.

    Beijos
    Isabel

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  5. O prato é fantástico, uma peça de museu, sem quelquer dúvida! O brilho do vidrado perfeito, o desenho cuidado e de uma elegância na melhor tradição da nossa cerâmica!
    Esta peça é algo que raro nos é dado ver fora de um museu e, quando aparece, alcança preço proibitivo!
    Explicaste muito bem todo o percurso e das inter-relações entre mestres de cerâmica por forma que hoje se torna muito difícil destrinçar entre quem produziu o quê.
    Nem sei se haverá alguém que o consiga fazer de forma íntegra e correcta ... claro que há muitos curiosos e "aprendizes de feiticeiro" que não têm quaisquer dúvidas e dizem sempre de forma assertiva "É Coimbra", "É Porto" ... tendo a duvidar muito e tenho de me conformar com as hipóteses que se podem colocar através de comparação, mas nem mesmo assim as coisas são conclusivas.
    Esta tem sido a minha experiência e até hoje deixo-os, aos auto-denominados "expert", fazerem as suas afirmações pomposas das quais não têm qualquer dúvida, tal com'ó outro, sua excelentíssima nulidade "que nunca se enganava e raramente tinha dúvidas"!
    Manel

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