Ultimamente tenho apresentado aqui tantas obras de arte sacra, que os seguidores deste blog já devem estar fartos de tanta beatice. Por isso, resolvi mostrar aqui uma travessa de faiança da Fábrica de Viana (1774-1855), que pertence ao meu amigo Manel. A travessa está em mau estado, foi partida, gateada e arranjada, mas mesmo assim é uma peça de Viana, uma das mais carismáticas fábricas de faiança portuguesas e ainda para mais está marcada, o que não deixa sombras de dúvidas sobre a sua atribuição.
O característico "V", a marca da Fábrica de Viana do Castelo |
Segundo a obra, A colecção de faiança do Museu de Arte Decorativas de Viana do Castelo. – Viana do Castelo: Câmara Municipal, 2015 esta marca e decoração são típicas do segundo período de laboração da fábrica, que decorre entre 1790-1830. Aliás, esta comprovação pudemos faze-la ao vivo, quando visitamos recentemente o Museu onde está exposto um conjunto de terrina e travessa com esta marca e pertencente à mesma família decorativa.
A travessa do Manel foi em tempos a base de uma terrina. Imagem reproduzida de A colecção de faiança do Museu de Arte Decorativas de Viana do Castelo. – Viana do Castelo: Câmara Municipal, 2015 |
Aliás esta não é propriamente uma travessa comum. Servia de base a uma terrina, tal como se pode ver na imagem que aqui reproduzo do catálogo A colecção de faiança do Museu de Arte Decorativas de Viana do Castelo. É aquilo que se costuma designar pelo termo francês présentoir.
Quanto à decoração desta travessa é inspirada na China, naquilo que em história da arte se designa por chinoiserie.
Uma "chinoiserie" ou uma China imaginada pelos europeus |
A chinoiserie é um modelo artístico europeu, de influência chinesa, que é caracterizado pela utilização de uma linguagem figurada e fantasista de uma China imaginada e ainda pela assimetria. As chinoiseries espalharam-se na arte europeia na segunda metade do séc. XVII, a sua popularidade conheceu o apogeu em meados do séc. XVIII e foram assimiladas pelo estilo rococó.
Embora o fabrico desta travessa esteja balizado entre 1790 e 1830, a decoração em chinoiserie permite-nos supor, que tenha sido executada na última década do século XVIII.
Embora o fabrico desta travessa esteja balizado entre 1790 e 1830, a decoração em chinoiserie permite-nos supor, que tenha sido executada na última década do século XVIII.
Fontes consultadas:
A colecção de faiança do Museu de Arte Decorativas de Viana do Castelo. – Viana do Castelo: Câmara Municipal, 2015
https://fr.wikipedia.org/wiki/Chinoiserie
Fico sempre impressionada com o trabalho de pesquisa que apresenta para colocar aqui as histórias das peças que mostra.
ResponderEliminarLuisa
EliminarObrigado pelo seu comentário.
No caso da faiança, vou comprando quase todos os livros que vão saindo no mercado sobre este tema, de modo que estou actualizado sobre o que tem escrito sobre as fábricas de faiança em Portugal.
Depois, como este blog é sobretudo um site de divulgação do que outros investigaram, achei que era interessante explicar o conceito de chinoiserie em arte e para tal usei para da definição da wikipédia francesa.
Um abraço
Já a comprei há alguns anos em Estremoz, a um simpático vendedor. Inicialmente esta travessa estava completamente pintada, o que deverá ter acontecido aquando do seu restauro, pelo que a marca não estava aparente.
ResponderEliminarFoi o vendedor que deu conta deste achado ao proceder à sua limpeza.
Realmente, hoje em dia recuso-me adquirir peças com restauros, e se os têm limpo-os, pois é bem preferível ver traços limpos executados por mestres, ainda que interrompidos pelas linhas de quebra, do que traços frustres, como que tacteados (para mim até algo irritantes) executados por amadores, ainda que cheios de boa vontade, pois não acredito que haja sempre vontade de enganar o outro.
Parece-me que não é muito difícil perceber um restauro numa peça, por melhor que seja.
Bem, é melhor não assegurar, pois poderei enganar-me ... que sei eu.
Mas o desenho desta peça é absolutamente delicioso, e foi isso que me convenceu a adquiri-la (namorei-a durante um ano, sem nunca me decidir pela sua aquisição, mas o dono acabou por me fazer um preço melhor e ... lá veio ela comigo).
Realmente, e por sorte, o Museu de Viana tinha uma peça muito semelhante a esta, pelo que não foi difícil posicioná-la numa época de fabrico mais precisa
Manel
Manel
EliminarEu também prefiro as peças com as marcas do tempo, sem pintalgadelas posteriores, que prejudicam a leitura da pintura original do mestre ceramista.
Valeu a pena adquirir esta peça de uma das mais interessantes fábricas de faiança portuguesa. Aliás vale imenso a pena visitar o Museu de Arte Decorativas de Viana do Castelo para admirar as faianças desta terra minhota. O núcleo de faiança está muito bem organizado e além disso o museu tem uma colecção de mobiliário indo português e português de grande qualidade, para não falar da azulejaria.
Um abraço
Luis
ResponderEliminarA travessa é lindíssima. Não importam os gateados. Só demonstram que foi uma peça estimada, pois foi preservada, apesar de seu estado. Por coincidência vi, há dois dias, na feira de artes decorativas da Sociedade Nacional de Belas Artes, um conjunto completo, também de Viana, com o mesmo motivo decorativo com a chinoiserie. Nem perguntei o preço, porque me encantei com outra peça. Temos que fazer escolhas e cedências.
Parabéns ao Manel pela aquisição.
If
Ivete
EliminarSabe que aqui neste blog, raramente falo de preços, mas creio que o Manel conseguiu a travessa por um valor simpático, precisamente por causa do mau estado da peça. Mas, imaginamos que uma travessa deste período, marcada Viana, deva atingir preços muito elevados nos antiquários de Lisboa.
Concordo consigo, os gatos fazem parte da história da travessa e demonstram o apreço que os seus donos tinham por ela.
Um abraço