segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Prato Companhia das Índias: parras e cachos de uvas


Nunca foi um entendido em porcelana da China. Gosto de a ver nos museus, encanto-me com a delicadeza da pintura e olho com cobiça para as porcelanas de exportação, aquelas peças que os chineses produziram para o mercado europeu e até otomano, com motivos decorativos ao gosto ocidental ou islâmico. Na Europa e nas Américas, essa porcelana chinesa feita de encomenda para o Ocidente durante o século XVIII e ainda XIX é designada pelos antiquários e coleccionadores por Companhia das Índias. Mas, como não sou um entendido e os preços que se praticam nos mercados de velharias costumavam ser proibitivos, nunca comprei nenhuma peça da chamada Companhia das Índias.
O prato não está marcado

Em 2011 tinha visto no Museu Nacional de Arte Antiga, na exposição Coleccionar em Portugal: doação Castro Pina umas peças de um serviço Companhia das Índias, decoradas no bordo com uns cachos de uvas e parras, pelas quais me tinha apaixonado loucamente. Mas pensei logo para os meus botões escusas de suspirar pois estas peças não são para o teu bico. E de facto assim parecia, pois passado uns dois anos vi uma molheira decorada com essas parras e cachos de uvas na feira de Estremoz, e estava à venda por quase duzentos euros, apesar de esbeiçada.
Imagens retiradas do catálogo Coleccionar em Portugal: doação Castro Pina. Lisboa: MNAA, 2011

Mas a paciência é a melhor amiga do coleccionador de antiguidades, velharias e trastes e recentemente consegui comprar um prato com essa decoração de cachos de uvas e parras, por um preço muito aceitável na Feira de Estremoz. Segundo o catálogo da exposição Coleccionar em Portugal: doação Castro Pina, as várias peças apresentadas desse serviço são da Dinastia Quing, período Jianqing (1796-1820) ou da mesma dinastia, mas do Período Daoguang (1821-1850). As peças da antiga colecção Castro Pina diferem do meu prato no motivo central. Enquanto que as primeiras ostentam um brasão, o meu prato apresenta uma paisagem com casario. Mas, no Oportunity leilões, no Lote 4413, encontrei um conjunto de 4 chávenas, exactamente iguais ao meu prato, com o mesmo motivo central e atribuídas ao período Jianqing (1796-1820).

Oportunity leilões, no Lote 4413

Se o meu prato é do período Jianqing ou Daoguang, não tenho conhecimentos de louça oriental, para fazer atribuições, mas posso afirmar com segurança que é Companhia das Índias, Dinastia Quing, fabricado durante a segunda metade do séc. XIX na longínqua China, com motivos tipicamente ocidentais, as parras e as uvas, já que os chineses não bebiam vinho.
 

 Alguma bibliografia:
-Coleccionar em Portugal: doação Castro Pina. Lisboa: MNAA, 2011

6 comentários:

  1. Curiosamente estou lendo agora o livro "O Caminho da Porcelana - A jornada de uma obsessão", do ceramista e escritor inglês Edmund de Waal, onde ele narra uma peregrinação pelos "três montes brancos", mas não é apenas um diário de viagem, vai muito além disso! Estou justamente na primeira parte, sobre a China.
    abraços!

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    1. Fábio

      Também li essa obra de Edmund de Waal, que descreve os lugares de produção da porcelana chinesa e custa a crer como é que nessas terras perdidas do interior da China conseguiam produzir peças com uma decoração tão requintadamente europeia como a deste prato. Claro, sabemos que usavam desenhos, amostras de tecidos enviados da Europa, mas não deixa de ser incrível.

      O Edmund de Waal tem outro livro fantástico, a Lebre dos olhos de âmbar, que é um verdadeiro tesouro para quem se interessa por colecionismo.

      Um abraço de Lisboa

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  2. A peça é muito bonita, como aliás quase toda a porcelana dita "Companhia das Índias", que possui desenhos preciosos, feitos com uma graciosidade e uma mestria de forma e colorido que me fazem ficar sempre a pensar "Como conseguem fazer isto?".
    E a elegância das próprias peças é de fazer ficar a desejar continuar a ter mais peças.
    O toque da porcelana quase argênteo, um brilho por vezes algo baço, o ar um pouco rústico do tardoz de algumas peças, fazem delas um encanto, ou pelo menos, são as que gosto mais, em detrimento daquelas muito perfeitinhas e inócuas, parece, quase sem história.
    No entanto, conseguiste encontrar alguma história sobre este prato, o que nem sempre é fácil, dada a quantidade inumerável de desenhos e formas provenientes do oriente.
    Ainda bem que a adquiriste, pois sabia que tinhas essa vontade desde há algum tempo
    Manel

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    1. Manel

      Encanto-me com o preciosismo da pinturas destas peças chinesas destinadas ao mercado europeu. Não admira que no século XVIII e ainda na primeira metade do XIX as grandes famílias tivessem encomendado milhares e milhares de peças da longínqua China.

      Foi curioso, porque fiz várias pesquisas em inglês no Google com palavras chave descrevendo este prato e a sua decoração e não encontrei nenhum resultado pertinente. Quando pesquisei em português por Companhia das Índias + decoração cachos uvas e parras, obtive de imediato resultados, o que me faz pensar que este motivo decorativo deve ter sido popular entre as famílias portuguesas que encomendavam estes serviços na China.

      Um abraço

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  3. A pintura é maravilhosa, delicada e precisa. Bonita peça, Luis.

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    1. Maria da Gloria

      Estes pratos feitos na China, destinados ao Ocidente, apresentam uma pintura primorosa e tão pormenorizada, que parece feita com a "paciência de um chinês", como se costuma dizer.

      Bjos

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