Hoje, sem grande assunto para escrever sobre seja o que for, resolvi apresentar duas fotografias do solar de Outeiro seco, que mostram o mesmo lado da casa, a primeira é uma fotografia de grupo com toda a família, no tempo em que esta a habitava e a segunda (http://chaves.blogs.sapo.pt/) é tirada nos dias de hoje, com a casa abandonada, esventrada e a escadaria em ruínas, com as cantarias que a compunham pilhadas e desaparecidas.
Por vezes interrogo-me porque escrevo tanto sobre Outeiro Seco, uma casa que conheci numa infância remota ou numas visitas fugazes na adolescência. Sem dúvida terá a ver com o prazer que sempre experimentei em ouvir as histórias do passado, contadas vezes sem conta pelo meu pai. As imagens e as histórias que o passado faz despertar em nós são uma saborosa fuga a realidade, uma forma de romantismo. Aliás não é por acaso que o movimento romântico do século XIX é o grande impulsionador dos estudos históricos por toda a Europa.
Piranesi, Arco de Tito, 1756-57
Por outro lado, por muito que nos doa ver velhas casas fidalgas abandonadas por todo o País, em risco de ruir, não há dúvida que há um certo prazer na contemplação da ruína e da decadência. No Século XVIII o artista italiano Giovanni Battista Piranesi (1720-1178) celebrizou-se por toda a Europa com as suas gravuras de templos romanos derrocados, mausoléus pilhados, esculturas partidas e todo um mundo antigo abandonado e invadido por vegetação. As suas veduttas ou vistas, que eram uma espécie de postais ilustrados da época sobre Roma e a Itália, popularizam-se pela Europa fora, de mal maneira, que se tornou moda nos jardins das grandes casas aristocráticas, construir falsas ruínas e enche-las de hera, para que os seus proprietários pudessem imaginar que contemplavam os vestígios grandiosos duma vila romana ou de uma abadia medieval, saqueada pelos vikings ou cavaleiros muçulmanos. Com o movimento romântico, no século XIX, a ruína tornou-se praticamente um ideal de beleza. Por exemplo, nesse período, em Portugal, optou-se por não reconstruir o Convento do Carmo, em Lisboa, deixando o corpo das naves da igreja a céu aberto e criando, assim, um idílico cenário de ruína, ao gosto do estetas oitocentistas e que ainda hoje encanta os visitantes.
Piranesi, vista do Túmulo na Via Ápia
Talvez o gosto pela ruína seja um sentimento semelhante ao que os poetas experimentam quando se abandonam à tristeza nos seus sonetos.
Luís
ResponderEliminarAo ler o post julguei que iria ler mais uma daquelas exaltações mayores da Yourcenar, que em abono da verdade, desde sempre me deleitou quando decide partilhar alguns dos seus paradigmas,a título de pleonasmo acho eu,no mítico enfoque de autenticidade mais eloquente
Fiquei desfraldada, como é possível não a mencionar nessa contemplação de beleza da ruína e da decadência...no caso de Outeiro Seco...coberta numa das fachadas com hera, uma trepadeira forte,que não desgruda da parede facilmente, mui verde, resistente de folha talhada a imitar corações...
No caso, o Luís em prosa presenteou os leitores com uma frase bela e mui bem conseguida ...Chave de oiro!
"Talvez o gosto pela ruína seja um sentimento semelhante ao que os poetas experimentam quando se a abandonam à tristeza nos seus sonetos"
Amazing!
Beijos
Isabel
A última e única vez que visitei o solar, o que deve ter sido há cerca de 4 ou 5 anos, ainda o telhado da cozinha estava em pé e podia-se visitá-la através da escadaria que dava para este terreiro.
ResponderEliminarReparo que já nem o telhado está de pé nem as cantarias da escadaria que dava acesso à cozinha, e o local que se vê na fotografia de família, estão lá, impossibilitando de todo o acesso ao alpendre que dava acesso à cozinha! Triste, pois este alpendre era lindíssimo ... mas segue o caminho que seria de prever!
Nem o Piranesi lhe poderia socorrer com a beleza que conseguia encontrar nas ruínas!
Manel
Na verdade, quando escrevi "Talvez o gosto pela ruína seja um sentimento semelhante ao que os poetas experimentam quando se a abandonam à tristeza nos seus sonetos" tinha em mente um ou dois sonetos da Florbela Espanca, em que ela se comprazia com a suas mãos lívidas, já com a cor da morte, mas não me recordava com precisão se era esta a imagem literária ou o nome do poema sequer. Acontece que deixei esse livro em casa da minha ex-mulher e não tinha maneira e de o consultar, Mas enfim, a frase é uma citação vagamente baseada num ou noutro soneto da Florbela Espanca.
ResponderEliminarBjos