Pedra na R. Presidente Arriaga |
Este blog não será exactamente um programa de discos pedidos, mas por vezes pedem-me para escrever sobre coisas que eu próprio acho tão interessantes, que não lhes resisto.
O Carlos Pereira, que é um dos seguidores deste blog, aficionado de faiança ratinho e coleccionador de objectos relacionados com o café, pediu-me há muito tempo para escrever sobre aquelas pedras com barcos, que se encontram afixadas nos prédios da velha Lisboa, nas zonas ribeirinhas em particular. Sempre gostei dessas lápides com caravelas e sempre me despertaram a curiosidade, mas nunca aprofundei o assunto e andava também com azar, porque a última vez que tinha passado por uma, ali em Santa Apolónia, fiquei sem bateria na máquina.
Outra pedra com um barco na Rua do Presidente Arriaga. A toalha que estraga a foto é de um daqueles cabeleireiros de bairro, com um nome impossível, qualquer coisa como salão Gaby ou Rosette |
Mas, quem vive e trabalha no Centro de Lisboa, está rodeado de coisas fascinantes por todo o lado, que nos surpreendem a toda a hora e com efeito, hoje, sem me mexer muito do meu caminho habitual, consegui numa só assentada fotografar 4 dessas pedras com naus. Uma no jardim do Museu Nacional de Arte Antiga e outras três na Rua do Presidente Arriaga, que é a continuação da Rua das Janelas Verdes.
Pedra no jardim do Museu Nacional de Arte Aantiga |
Procurei saber mais alguma coisa sobre estas pedras e o seu significado. Li algures no Google, que por vezes são designadas caravelas foreiras e significavam, que alguém na casa onde estavam colocadas, tinha uma obrigação de qualquer natureza com o Senado de Lisboa. Enfim, quem afirma isto, interpreta estas caravelas como se representassem a nau de S. Vicente, que faz parte desde há muito da heráldica municipal de Lisboa.
Mas, como se achasse esta explicação um pouco vaga, vasculhei o Dicionário de História de Lisboa, 1994 e lá consegui dar com a entrada, intitulada Pedras esculpidas com embarcações, assinada por Nuno Valdez dos Santos. O autor afirma que estas pedras são um mistério, ninguém descobriu ainda exactamente para que serviam, nem conseguiu descortinar nelas, qualquer mensagem de poder hierárquico, significado religioso, forma de propaganda ou símbolo de uma associação religiosa.
Outra pedra com um barco na Rua do PresidenteArriaga |
Na prática, existem é constantes nestas pedras. Apresentam todas dimensões entre 30 x 30 cm ou 35x50 cm, estão inevitavelmente viradas em direcção ao rio Tejo e representam barcas, naus da época dos descobrimentos, naus de linha e até fragatas. Normalmente tem as velas desfraldadas, portinholas com as peças de artilharia abertas e navegam em mares calmos. Todas parecem representar navios de guerra e raramente estão datadas, mas as que o estão, foram feitas entre 1720 e 1860.
Talvez a única coisa que se possa afirmar com segurança é que certamente se relacionam com a intensa actividade marítima de Lisboa.
O mistério à volta delas continua a ser grande, tão grande como o encanto e a surpresa, que constituem quando damos com elas nos velhos prédios de Lisboa
Tema tão interessante e rico de interpretações.
ResponderEliminarTambém me fascinam estas representações, umas mais eruditas, outras mais ingénuas, mas todas relacionadas com a grandeza náutica do nosso País (que hoje já não nos dá motivos para orgulho, principalmente no que respeita aos politicos). Desde há muito que este tema me é muito caro e, como o Luís, gosto de observar a cidade e encontrar, por vezes, pequenos tesouros, que estão praticamente escondidos. Foi o caso de dois pequenos painéis de azulejos, ambos na calçada de Sant'Ana, um deles quase escondido pelo emaranhado de fios que lhe passavam pela frente.
Parabéns pelo post e bom fim de semana.
if.
Olá Luís,
ResponderEliminarAchei mto interessante este seu post onde pude admirar estas belas pedras com caravelas em baixo-relevo. Adorei sobretudo a que fotografou no jardim do Museu Nacional de Arte Antiga, onde já estive várias vezes sem nunca a ter visto.
Inclino-me a pensar que estas embarcações assim esculpidas aparecem pura e simplesmente como símbolos da cidade de Lisboa, claramente associada à expansão marítima, pela mesma razão que a caravela faz parte do brasão da cidade, com ligação também à lenda de S. Vicente.
O meu marido, que viveu em Lisboa enquanto estudante, lembra-se de ver caravelas nas placas com nomes de ruas, penso que também aparecem ou apareciam em chafarizes e há pelo menos uma placa dessas no Museu da Cidade.
Seja como for, são símbolos bonitos a embelezar a nossa capital, os pequenos pormenores que fazem a diferença.
Um abraço e bom fim de semana
Olá amigos,
ResponderEliminarNo livro Terra Portuguesa 2º de 1916, consta um interessantíssimo estudo sobre as " Naus de S. Vicente " - 8 páginas - escrito por Matos Sequeira na época, o qual pode fazer um pouco de história sobre este tão interessante tema.
Aí se reproduzem os desenhos de António Quaresma, desenhador da época, que se enamorou por tão singelas obras dos canteiros alfacinhas.
Abraço amizade
Carlos Caria
Olá Luís. Como já deve saber, cresci em Sintra e adoro pedras. Hoje ao visitar o seu blog, imediatamente recordei os enormes marcos em pedras que existem nos limites do concelho de Sintra, na zona das Covas de Ferro (próximo dos Negrais) e que no topo têm precisamente esculpida uma bonita caravela. Há coisa de 10 anos ainda existiam uns 4 e segundo reza a história, marcavam os limites da administração jurídica de Lisboa e remontam ao início do séc.XVIII
ResponderEliminarUm bom fim de semana
Cara Ivete
ResponderEliminarConheço muito bem desses dois registos de azulejos da Calçada de Santana e houve um que já o fotografei a pensar num post. Estão na mira deste blog
Abraços
Maria Andrade
ResponderEliminarA pedra está mais ou menos escondida no jardim do Museu. Creio que é até intencional, para dar aquele ar romântico da ruína envolta em vegetação.
Há também pedras destas em chafarizes, com efeito.
Abraços
Luís
caro Zé Júlio.
ResponderEliminarFico sempre contente por ver o criador dos jardins de plantas selvagens e dos belos muros de pedra neste blog. De facto, nesta pequena pesquisa sobre estas lápides que efectuei tive notícia de várias delas fora dos actuais limites do Concelho de Lisboa.
Contudo, acredito que essas pedras que estão fora de Lisboa são de facto símbolos heráldicos da cidade, representando a nau de S. Vicente, enquanto que estas serão barcos comuns.
Mas, não sou um especialista na matéria, apenas um admirador destas pedras
Abraços e volte sempre aqui
Caro Carlos Caria
ResponderEliminarAgradeço então que me envie os elementos que dispõe.
Abraços
Caros amigos
ResponderEliminarJulgo que a única destas pedras que se relacionará com o Concelho de Lisboa seja a do Museu Nacional de Arte Antiga, que apresenta os corvos e será portanto a nau de S. Vicente. Todas as outras serão simples barcos.
Boa noite
ResponderEliminarDe facto estas pedras além de representarem o símbolo da cidade identificam também locais onde se situavam as guildas ou associações de mercadores e armadores, gente ligada ao mar, não é por acaso que uma boa parte delas está localizada no bairro de Alfama, junto á antiga cerca da cidade próximo do rio...perto de uma dessas portas tive a oportunidade de fotografar um pedra com o brasão real e com a inscrição "armazéns do reino e respectiva data", encontra-se perto do arco do beco escuro na rua dos bacalhoeiros...
A foto do arco está no meu blog muraldaspetas.blogspot.com, se quiserem identificar o arco e se desejarem deslocar-se até lá...
El Mano del Tajo
encontrei o seu blogue ao fazer uma pesquisa sobre os títulos publicados pelo meu pai.
ResponderEliminaracho que o Luís gostaria de saber que ele tb publicou um estudo sobre "Pedras que falam do mar"
faz hoje apenas 1 mês que o meu pai faleceu...
achei que deixar-lhe este comentário era uma forma de lhe agradecer pelas duas referências que faz ao meu pai no seu blogue, assim como, neste dia difícil para mim, prestar-lhe (ao meu pai) uma minúscula homenagem.
obrigada.
graça valdez dos santos
Cara Graça Valdez dos Santos
ResponderEliminarO seu comentário também me emocionou. Este blog é dedicado a velharias, antiguidades e memórias familiares e já tem acontecido, mais que uma vez, ter comentários de descendentes de pessoas que aqui menciono e por vezes transmitem-me informações muito engraçadas.
O texto do seu pai no Dicionário de História de Lisboa foi o mais claro e sério que encontrei sobre este assunto dos barcos em pedra, ao qual ainda gostaria de voltar quando tiver mais tempo.
um abraço e fico feliz por de alguma forma ter aqui homenageado a memória do seu pai
http://luisdesenha.blogspot.pt/2009/04/ja-se-foi-de-barco-odivelas.html
ResponderEliminarÉ só para deixar, no caso de ainda não conhecer, uma imagem de uma pedra com um "barco" que existe em Odivelas. Segundo informação do Museu Arqueológico de S. Miguel de Odrinhas pedras deste tipo fariam parte dos marcos de limitação do Concelho de Lisboa.
Caro Luís Filipe
EliminarDesculpe só agora lhe responder, mas de facto sei pouco sobre estas pedras, embora as ache fascinantes.
Na altura, em que escrevi o post, limitei-me a repetir a opinião de Nuno Valdez dos Santos no artigo Pedras esculpidas do Dicionário de História de Lisboa, 1994, pois pareceu-me a opinião mais sensata.
Se de facto muitas destas pedras poderão ser os emblemas heráldicos de Lisboa, sobretudo as que apresentam os corvos, outras que apresentam mero barcos são um bocadinho mais misteriosas. Por exemplo, há quem diga que elas estão colocadas também locais onde se situavam as guildas ou associações de mercadores e armadores, gente ligada ao mar.
Em todo o caso, gostei de saber que outrora a ribeira de Odivelas foi navegável.
Um abraço e obrigado
Claro que terá sempre de se partir do principio, que estas "pedras", indicam que aqui viveu alguém ligado à actividade maritima. Talvez um armador,um piloto, um capitão...
ResponderEliminarCaro Mário Pereira
EliminarSem dúvida que estas pedras estão relacionadas com a actividade marítima, até porque estão sempre colocadas em edifícios virados ao Tejo.
Um abraço
Estas placas assinalam que o terreno em que o edificio assenta é propriedade do Município de Lisboa, pagando, por isso, foro à autarquia.
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