Tenho em minha casa há muitos anos esta gravura representando o martírio de S. Lourenço. Foi impressa por um dos mestres gravadores mais conceituados nesta arte, Armand-Durand (1831-1905), que teve o seu atelier em Paris. Trabalhou sobretudo com obras dos grandes artistas dos séculos XV, XVI e XVII, que eram aqueles que ele mais admirava, realizando para esse efeito aturadas pesquisas nas colecções privadas e públicas.
Os irmãos Van Gog, Vicent e Theo tinham uma admiração enorme pela obra de Armand-Durand.
Armand-Durand notabilizou-se sobretudo pelas gravuras que executou da obra do pintor holandês Rembrandt. Como na época, as pranchas de cobre das gravuras originais do pintor holandês eram pouco conhecidas e não apareciam nos mercados de antiguidades, a partir de um estudo minucioso das gravuras e quadros existentes, o artista francês executou um caderno de pranchas de cobre absolutamente magnifico. As gravuras executadas a partir desse caderno de matrizes tornaram-se apreciadíssimas em toda a Europa. Nos anos 80 do século XX, esse caderno com pranchas de cobre que estava nas mãos da família Dominique Vincent foi alvo de uma disputa renhida entre o Museu do Louvre, a Bibliotéque Nationale de França e um marchand americano de arte. O americano venceu a disputa e levou para a casa as 348 pranchas de cobre.
Esta minha gravura terá sido pois imprensa na segunda metade do século XIX, em Paris por Armand-Durand, mas infelizmente não foi feita a partir de nenhum Rembrandt, porque senão, eu poderia vende-la e dar talvez uma entrada para um carro novo, que o meu já começa a dar sinais de cansaço. Terá sido executada para o mercado português e brasileiro da época, que devia justificar monetariamente a encomenda, pois como já sabemos, no século XIX as obras com temas piedosos eram altamente apreciadas nas lusas paragens, ainda que este S. Lourenço tenha um corpo capaz de tentar as mais devotas e os mais tementes a Deus...
O mestre gravador francês usou uma obra de Baccio Bandinelli (1493-1560) um pintor, escultor e desenhador do Renascimento italiano, que teve o azar de ser contemporâneo de Miguel Ângelo, e por essa razão foi sempre visto como um artista mediano, já que suas esculturas e pinturas sofriam sempre com comparação das obras primas saídas da mão do Buonarroti. Bartolommeo Bandinelli ou Baccio Bandinelli como ficou conhecido, era filho de um ourives florentino e trabalhou mais ou menos toda a vida sob mecenato dos Médicis. Dele os críticos diziam, que era um excelente desenhador, um óptimo escultor de obras em pequena escala, mas infelizmente só gostava de executar esculturas colossais, para as quais lhe faltava definitivamente o talento e a mestria de execução de Miguel Ângelo.
Este martírio de S. Lourenço que aqui vemos fazia parte de um projecto para um grande fresco, encomendado pelo Papa Clemente VII, para a capela de S. Lourenço em Florença e que nunca chegou a ser concretizado. Percebe-se assim porque é que o desenho é tão arquitectural, pois destinava-se a preencher o espaço de uma grande parede. Temos assim uma composição repleta de personagens num vasto espaço arquitectónico, mas que não negligencia a legibilidade da cena central, o martírio do santo na grelha. O fundo arquitectónico à antiga, elaborado com um forte eixo de simetria, com o efeito das aberturas e jogos dos planos, confere uma teatralidade dramática ao martírio de S. Lourenço.
O S. Lourenço encontra-se nu e apresenta um corpo de atleta, como só os gregos, romanos e artistas do renascimento italiano souberam desenhar ou talhar. Veja-se este admirável torso masculino de Baccio Bandinelli também do Louvre.
Os irmãos Van Gog, Vicent e Theo tinham uma admiração enorme pela obra de Armand-Durand.
Armand-Durand notabilizou-se sobretudo pelas gravuras que executou da obra do pintor holandês Rembrandt. Como na época, as pranchas de cobre das gravuras originais do pintor holandês eram pouco conhecidas e não apareciam nos mercados de antiguidades, a partir de um estudo minucioso das gravuras e quadros existentes, o artista francês executou um caderno de pranchas de cobre absolutamente magnifico. As gravuras executadas a partir desse caderno de matrizes tornaram-se apreciadíssimas em toda a Europa. Nos anos 80 do século XX, esse caderno com pranchas de cobre que estava nas mãos da família Dominique Vincent foi alvo de uma disputa renhida entre o Museu do Louvre, a Bibliotéque Nationale de França e um marchand americano de arte. O americano venceu a disputa e levou para a casa as 348 pranchas de cobre.
Esta minha gravura terá sido pois imprensa na segunda metade do século XIX, em Paris por Armand-Durand, mas infelizmente não foi feita a partir de nenhum Rembrandt, porque senão, eu poderia vende-la e dar talvez uma entrada para um carro novo, que o meu já começa a dar sinais de cansaço. Terá sido executada para o mercado português e brasileiro da época, que devia justificar monetariamente a encomenda, pois como já sabemos, no século XIX as obras com temas piedosos eram altamente apreciadas nas lusas paragens, ainda que este S. Lourenço tenha um corpo capaz de tentar as mais devotas e os mais tementes a Deus...
O mestre gravador francês usou uma obra de Baccio Bandinelli (1493-1560) um pintor, escultor e desenhador do Renascimento italiano, que teve o azar de ser contemporâneo de Miguel Ângelo, e por essa razão foi sempre visto como um artista mediano, já que suas esculturas e pinturas sofriam sempre com comparação das obras primas saídas da mão do Buonarroti. Bartolommeo Bandinelli ou Baccio Bandinelli como ficou conhecido, era filho de um ourives florentino e trabalhou mais ou menos toda a vida sob mecenato dos Médicis. Dele os críticos diziam, que era um excelente desenhador, um óptimo escultor de obras em pequena escala, mas infelizmente só gostava de executar esculturas colossais, para as quais lhe faltava definitivamente o talento e a mestria de execução de Miguel Ângelo.
Este martírio de S. Lourenço que aqui vemos fazia parte de um projecto para um grande fresco, encomendado pelo Papa Clemente VII, para a capela de S. Lourenço em Florença e que nunca chegou a ser concretizado. Percebe-se assim porque é que o desenho é tão arquitectural, pois destinava-se a preencher o espaço de uma grande parede. Temos assim uma composição repleta de personagens num vasto espaço arquitectónico, mas que não negligencia a legibilidade da cena central, o martírio do santo na grelha. O fundo arquitectónico à antiga, elaborado com um forte eixo de simetria, com o efeito das aberturas e jogos dos planos, confere uma teatralidade dramática ao martírio de S. Lourenço.
O S. Lourenço encontra-se nu e apresenta um corpo de atleta, como só os gregos, romanos e artistas do renascimento italiano souberam desenhar ou talhar. Veja-se este admirável torso masculino de Baccio Bandinelli também do Louvre.
Como já escrevi anteriormente, esse fresco, não chegou ser executado, porque entretanto os Médicis, patronos da obra caíram em desgraça. Mas conservaram-se esboços e gravuras. Descobri um dos esboços na base de dados, Joconde, guardado no Museu do Louvre.
Baccio Bandinelli teve também tempo de dar um dos desenhos do projecto a um gravador célebre na altura, Marcantonio Raimondi (colaborador de outro génio do renascimento, Rafael) que executou esta gravura em 1526. O British Museu conserva um exemplar com esta data, que aqui reproduzo.
Alguns séculos mais tarde, no Século XIX, Amand-Durand que admirava incondicionalmente o renascimento, reimprimiu esta gravura de Baccio Bandinelli, que os críticos hoje em dia tendem a valorizar mais, sobretudo pelos seus méritos de desenhador, que bem podemos apreciar neste martírio de S. Lourenço
Legenda:
Marthyrio de S. Lourenço, Diácono
10 de Agosto de 258
Desenho de Baccio Bandinelli gravado por Marco António em 1526 pouco mais ou menos e dedicado ao Santo Padre Clemente VII. Ao Centro vê-se o perfeito Cornélio Secularis, rodeado de membros do Senado e dando ordem aos carrascos. Mais acima uma varanda cheia de Christãos pobres, a que o santo distyribuira os thesouros da Egreja e que o prefeito reclamava. S : Lourenço meio deitado nas grelhas ergue-se e confirma com o gesto estas Formosas palavras “ aquellas virgens, aquelles desvalidos, aquellas viúvas é que são os thesouros da Egreja” Trazem os carrascos materiaes combustíveis para atear a chama , um d’elles armado de um forcado forcejava para derrubar o Santo sobre o seu leito em brasa
Olá Luís
ResponderEliminarAdorei, em particular este S. Lourenço.
Gostei do que li, sobre ele.Pouco sabia.
Quis o meu fértil imaginário fazer-me eco da toponímia de uma Rua com o nome do Santo e de um Lugar com o nome de Igreja Velha junto ao cemitério de Ansião.
Há que tempos andamos,eu e um amigo historiador Manel,a tentar perceber onde se localizou essa igreja. As nossas opiniões divergem na localização.
Eu avento a hipótese de a mesma ter existido onde fizeram o cemitério em finais de 1800.
A provar o facto, um dos terrenos confinantes era dos meus avós e na escritura diz chamar-se Ribeiro da igreja,de facto o ribeiro delimita a dita propriedade.
Quanto ao meu amigo, aventa outra hipótese que a igreja se localizou mais a cima, a uns 80 metros, no Vale Mosteiro. Em miúda num dia de chuva, decidi visitar as grandes ruínas. Ao chegar, lembro-me que o terreno se apresentava rectangular tipo sapata alta, que me obrigou a puxar pela pernita para saltar . Ao fundo avistei uma grande porta que mais tarde quando estudei percebi ser do estilo gótico. Ao entrar recordo que se abria sob o comprido um corredor com uma passadeira em lages de pedra polidas . Ao fundo deste, o que restava da igreja do Mosteiro, a fazer jus à toponímia,com arcos,altares e vestígios de incêndio recente. Assustada pelo cenário de barrotes a cair do céu escuro, fugi pelas traseiras com a minha irmã.Hoje nada resta. Tudo foi destruído em 50 anos.A diferença é que eu estive lá dentro e ele não, e tem dificuldade em acreditar que tal mosteiro lá existiu de facto. Só não é radical porque há pouco tempo lá foi com outro amigo que lhe mostrou nas traseiros o único arco de volta perfeita existente e ai balançou.
Mas dirá, o que tem isto a propósito?
Digo eu...tudo!
A imagem do Santo é Brutal!
Prefaciando as suas palavras...admirável torso masculino de Baccio Bandinelli também do Louvre.
Que inspiração temática.
Onde andará o Santo, pergunto eu, que nunca lhe pus a vista em cima?
Desculpe a ousadia...Mas deu-me para delirar
Muito por saudades suas...Há muito que não me liga patavina!
Só o Manel, gracioso, lá vai dizendo um arzinho da sua graça...Gosto.
Por isso hoje abusei.
Isabel
Gostei do seu comentário. Dei uma boa gargalhada na última parte. Tenho tido menos tempo para escrever aqui no blog ou para visitar seu e o da Maria Gabela, este último parece que tem muito boas fotografias. Sabe, normalmente demoro algum tempo a escrever os meus posts. Primeiro, imagino-os, depois faço umas pesquisas aqui e ali. Escrevo-os e corrijo muito e só finalmente publico-os.
ResponderEliminarEste nosso S. Lourenço, que foi grelhado vivo é uma devoção muito popular em Portugal e Espanha. Filipe II de Espanha mandou construir o Escorial segundo uma planta que reproduzia a grelha de s. Lourenço. É o padroeiro dos bibliotecários, arquivistas e cozinheiros.
Segundo o Moisés do Espírito Santo, em Portugal, o S. Lourenço mais não é do que uma adaptação do deus pagão, Thamuze, um dos deus dos rios, conforme referi no post http://velhariasdoluis.blogspot.com/2010/04/nossa-senhora-da-piedade-da-mercenana.html e por isso talvez a sua capela em Ansião se situasse junto a um curso ou nascente de água, mas é sempre complicado afirmar estas coisas sem provas. Não desista da procura.
Abraço
Ai Isabel conheço tão mal Ansião que, um destes dias, terei de reparar a ignorância!
ResponderEliminarNão perderá este sítio pela demora!
E ainda mais me incita esta procura porquanto a vou lendo por aqui e fico com vontade de ir à procura do bom que Ansião tem para oferecer, pois o que conheço do local não abona muito a favor dele, mas, confesso, não tenho procurado de forma aturada.
Hoje em dia, se se quiser encontrar a presença do passado nos sítios é necessária uma busca aturada, pois os habitantes locais já se encarregaram de tudo fazer desaparecer.
É o varrer do passado que tanto ocupa os autóctones de algumas regiões do país (a região de Pombal é especialmente rica nesta "limpeza"). Mas adorei a sua descrição da edificação religiosa que teve ocasião de visitar em criança!
Agora, quanto à figura propriamente dita do "teu" S. Lourenço, não é mais do que uma outra versão da "Criação de Adão" da Capela Sistina, ainda que em negativo.
Posto que em consonância com o resto da cena, e restantes corpos, o Adão da Capela Sistina, apesar de me fazer ficar em contemplação admirativa, não me surpreende nem o estranho, no entanto, este S. Lourenço, que estou habituado a recriar como figura ascética (apesar de, segundo o que consta, ter sido martirizado ainda relativamente jovem, vejo-o corpo descarnado, emaciado), surge aqui de forma completamente surpreendente, qual deus mitológico, de proporções no mais puro classicismo greco-romano. Claro que o entorno recria uma paisagem arquitectónica típica do estudo aturado que então se fazia sobre as leis da representação cónica.
É interessante verificar que este modelo de representação do martírio do santo deve ter sido popular pois servirá, algumas décadas depois, para uma outra obra com a mesma temática que existe em S. Lourenço de Florença, da autoria de Agnolo Bronzino(http://www.artchive.com/web_gallery/A/Agnolo-Bronzino/Martyrdom-of-St-Lawrence.html).
Manel
Manel e Luís
ResponderEliminarQuando quiserem e assim se proporcionar visitar Ansião, é só dizer. Fica combinado. Terei muito gosto. Se for no verão comemos uma sardinhada ou o que quiserem.
Ansião de facto não é bonita, pouco ou nada terá de interessante. Mas que fazer, foi a terra onde vivi até aos 20 anos, onde tenho as minhas raízes, onde viveram os meus antepassados e ainda hoje vive a minha mãe e irmã, solteira e boa rapariga. Lá tenho uma grande casa, cheia de velharias. Adoro a serra, muito gosto de a subir a pé, sentir os cheiros. Gosto de mexer na terra, ainda agora na Páscoa o quintal foi lavrado e lá ajudei na sementeira das batatas, hoje a minha mãe confidenciava-me, que já nasciam.
Depois tenho a casa rural a 10 Km. Quando lá vou faço a trilogia , salto de casa em casa...muito cansativo, mas deliro.
Fica o convite!
Espero do coração que aceitem.
O meu marido iria gostar por certo.
Beijos
Isabel
Mais uma vez utilizo este blog para referir a Maria Isabel, espero que o Luís não fique melindrado (não ficará, creio, mas as regras da ética levam-me a pedir licença pela intrusão).
ResponderEliminarPoderia optar por deixar o comentário no blog da Maria Isabel, mas como o convite foi endereçado a ambos, decidi que o melhor seria fazê-lo por aqui.
Assim, quero dizer que fiquei encantado pelo convite da Maria Isabel e agradeço-o pois não é todos os dias que surgem sugestões tão simpáticas.
É verdade que não me desloco a Ansião amiúde, mas, de quando em vez, por se encontrar relativamente próximo da minha casa de aldeia (a cerca de 20 km, e gosto de usar os caminhos da serra para lá chegar!) nós, a minha irmã, cunhado e eu, vamos lá jantar num pequeno local por eles descoberto há cerca de dois ou três anos a esta parte.
A comida é boa, bem confeccionada, o local tem um ambiente simpático e os preços são razoáveis para a qualidade apresentada (não me recordo bem do nome do restaurante, mas tem algo a ver com "Estrela ...", sou péssimo em nomes ...).
Pela minha parte (e quando calhar estar o Luís por aquelas bandas), terei todo o prazer em combinar um encontro gastronómico com a Maria Isabel e os seus. Conhecer uma terra através dos olhos de um natural dela faz sempre toda diferença! Esperemos então pela oportunidade.
Manel
Pronto,
ResponderEliminarSubscrevo a opinião do Manel e aceito com gosto o convite da Isabel, quando as coisas se proporcionarem. Mas, também não é preciso combinar grandes patuscadas, com toneladas de louça para lavar. Um café, uma visita aos locais históricos de Ansião e boa conversa já serão suficientes.
Abraço
Obrigada por terem aceite o meu convite.
ResponderEliminarUma boa alegria...hoje!
Vou começar por idealizar o roteiro.
Vou gostar imenso de nos conhecermos.
O passar do conhecimento virtual ao pessoal é fantástico.
Assim será quando a todos se proporcionar.
Bem hajam
Isabel