Mantenho o hábito de me dedicar à arqueologia nos contentores das obras do centro da cidade de Lisboa e os resultados são surpreendentes. Só numa semana, arranjei uns oito azulejos.
Encontrei a primeira fornada perto da minha rua, naqueles sacos de serapilheira branca, que os homens usam para colocar os restos de demolições, nos bairros com ruas estreitas. Farejei-os, comecei a escavar, escavar e arranjei uns seis. Penas que sejam quase todos desirmanados.
O Manel acha que quando isto voltar a acontecer, eu devia chama-lo para ele vir com a sua carrinha e transportarmos os sacos todos para vê-los um a um e retirar todos os azulejos. O pior é que moramos os dois em terceiros andares sem elevador. Em todo o caso é tentador tal é a estupidez das pessoas que fazem obras nestas casas da velha Lisboa, que deitam tudo fora. Muitos dos azulejos que aqui apanhei estão numerados no verso o que nos indica que terão feito parte de um painel. Os restos do friso com uma ramagem parecem-me da primeira metade do XVIII. No centro terá havido uma composição qualquer, da qual sobreviveu a cabeça deste cão com um ar feroz.
O segundo achado decorreu numa ruela qualquer que sai das escadinhas do Duque. Apesar de estar todo pintado de branco, vislumbrei-o logo. Estranhei ser de um tamanho muito pequeno e pensei que fosse talvez um azulejo do século XIX, daqueles que costumam ornamentar os prédios daquele bairro. Contudo era muito espesso para ser uma peça já industrial do século XIX. Cheguei a casa e raspei-o da tinta, que o cobria e descobri maravilhado um azulejo de padrão azul, verde e amarelo do século XVII.
Não sei muito bem o que vou fazer deles. A maioria são desirmanados, mas o cachorro vai ser embutido na parede e tenho que expor obrigatoriamente o do século XVII, mas não sei como. Só gosto dos azulejos encastoados nas paredes. O problema vai ser se um dia eu mudar de casa. Vou ter que mandar picar tudo
Os restantes ficarão aguardar no meu arquivo de azulejos achados na rua, que já vai nuns trinta exemplares
Luís
ResponderEliminarQue bom voltar aos azulejos pombalinos
Lindos, como sempre, o do cão, é fabuloso
Acho que vi os tais sacos lá para os lados da calçada do Duque, subia eu a caminho do jardim do Carmo, ali fiquei sentada num banquinho, a fazer horas de almoço, para ir ter com a minha filhota à Santa Casa da Misericórdia
Vi prédios em remodelação e sacos de entulhos, acredite, bem me lembrei de si, o que gosta de "farejar" neles à procura deles...dos azulejos, claro!
Admiro a sua coragem, destemido, valente, um herói em reverter o lixo em preciosidade
Ainda vem que já pensa noutra forma dos expor lá em casa
Que tal começar por os emoldurar numa desses caixilhos antigos que se vão encontrando na feira da Ladra
Evitaria no futuro problemas ao retirá-los das paredes com risco agravado de ainda se partir algum
Ai, como adoro azulejos, julgo pelo fascínimo das cores, azul e amarelo
Isabel
Cara Isabel
ResponderEliminarObrigado pelo eu comentário.
Não sou corajoso por andar ao entulho. Tenho é lata, que é compensada pelos achados e pelas situações cómicas, que se vivem enquanto se chafurda nos cacos. Ao pé de minha casa, enquanto catava azulejos apareceram duas turistas holandesas, que queriam ir para o castelo e ficaram fascinadas com os achados, enquanto eu lhes explicava que estavam na colina errada. Depois apareceu uma rapariga indiana tontinha, que mora na minha rua, que em vez de apanhar um belo baú em pele, levou um oleado nojento para pôr na cozinha dela. Enfim, esgravatar os contentores das obras é sempre uma ocasião para conversas mirabolantes com os transeuntes.
Quanto a emoldurar azulejos acho sempre uma coisa meia triste. É como animais selvagens em gaiolas. A azulejaria em Portugal é uma arte ao serviço da arquitectura. Precisa de fazer parte das paredes, onde consegue transformar os espaços, fingir portas, janelas e as mais fantásticas ilusões e sugestões
Abraços
Olá Luís
ResponderEliminarAzulejos!Outra das minhas paixões.Só tenho um que resgatei da casa em ruínas dos meus bisavós. Arranhei-me toda naquela tarde, nas silvas que invadiam o pouco que restava da casa.Hoje está em local de destaque,na minha casa. Também não sou apreciadora de azulejos emoldurados, por isso não me sinto tentada a comprá-los pois não sei muito bem onde, e como colocá-los.Integrá-los nas paredes, também não me atrevo...
Quanto aos seus achados são magníficos!Também gosto do do cão, mas o da florinha amarela não lhe fica atrás!Eu acho que me está a dar ideias:)Outro dia dei comigo a olhar para umas obras no centro de Braga e a pensar onde estariam os contentores...!
Um abraço
Maria Gabela
Ó Maria Gabela não deixe de espreitar os contentores das obras e ainda por cima em Braga, onde há aqueles azulejos lindos, fabricados no Norte por Massarelos e Miragaia. Adoro aqueles azulejos de relevo com flores tão típicos das fachadas dos prédios das cidades nortenhas.
ResponderEliminarHá uns tempos andei nuns antiquários em Lisboa, na Rua D. Pedro V e observei que eles vendem aqueles grandes paineis historiados colados em placas de madeira, que depois se encastoarão nas paredes, mediante parafusos, o que permitirá retirar no futuro todo o painel sem grande risco. No entanto, não percebi exactamente como o sistema funciona. Terei que averiguar melhor.
Abraço
Sim, é verdade, quando tiveres que sair dessa casa será necessário muito cuidado para tirar as tuas preciosidades da parede e não te atrevas a deixá-los lá, ou acabarão num outro saco, triste, abandonado num qualquer canto desta cidade que deita tesouros pela janela fora!
ResponderEliminarParece que só os estrangeiros dão o devido valor a esta nossa arte de antanho que, como bem dizes, só tem sentido quando ao serviço da arquitectura. E que serviço fantástico lhe prestam!!!!!!!!!!!!
Manel
Olá Luís
ResponderEliminarVolto novamente ao tema só para aflorar que também não aprecio os azulejos encaixilhados.
Quando o referi foi no sentido de um dia mudar de casa, não se danificarem, acaso continue a aposta em os encastrar nas paredes
A propósito, a minha irmã tem uma casa minimalista onde conjuga um painel de azulejos por dentro de uma moldura que pintou a branco sujo,curioso,não é preenchido na totalidade, cativa o olhar ao deparamos com uma moldura incompleta que nos transcende pela anormalidade
Não sei se consegui exprimir-me, mas que é diferente e esteticamente belo, asseguro-lhe que sim
Quanto à resposta que dá à Maria Gabela, devo acrescentar que há mais de 25 anos mandei fazer um grande painel a um ceramista na Fil de Coimbra de 1786
Azulejos feitos manualmente em jeito de imitação, muito bons, dos antigos,todos numerados e colados sob cartão que por acaso emoldurei para expor numa sala
Acontece que mudei de casa, e o painel não se adapta a esta nova, jaz na casa de Ansião junto à lareira, muito maior
Sei, que um dia poderá sempre ser aplicado directamente numa parede, sem qualquer estrago
Pessoalmente adoro-o, foi caríssimo
Talvez por isso não me incomoda o facto de ter uma pequena moldura que mal se dá por ela
Se o tivesse colocado directamente na parede da casa, teria lá ficado...
E, eu, teria-o perdido para sempre!
Eu sei, eu sei, mas azulejos em moldura nunca. Prefiro picar as minhas paredes quando me for embora. Também são tão velhas, que aquilo vem tudo atrás. O Luís XIV de França transportava as suas percas de tanque em tanque cada vez que mudava de palácio...lololl
ResponderEliminarQuanto muito, não me choca ver azulejos colados em placas de acrílico, que já vi e não berra muito, pois é um material neutro e poderemos coloca-los ao nível do rodapé, que é o sítio para onde normalmente os azulejos foram talhados.
A azulejaria em Portugal não é uma arte decorativa. É arte de apoio a arquitectura e portanto há que evitar meter azulejos em quadros, para respeitar a sua natureza.
A Isabel há-de me desculpar se pareci muito dogmático, mas no que toca a azulejos...é parede com eles!!
Ola Luis,
ResponderEliminarCá estou eu novamente, desta vez para salientar que tambem sou uma "catadora" de caixotes do lixo...pena que não tenho tido grande sorte nas minhas procuras...e imagino sempre que deverá haver imensas coisas nos lixos das obras da Cidade, mas onde??? que eu não os encontro... :-( e Santarém deveria ser muito bom para descobrir Tesouros!!! Mas onde??? Será pelo mau estado geral da parte historica da Cidade??? Será que não há qualquer recuperação de imoveis??? Será que eu não sei onde procurar??? Será que há uma vaga de bom senso e os empreiteiros dão o devido valor à História?????lololol Estarei a sonhar??? Talvez. Acho que tenho procurado nos contentores errados!!!! De qualquer forma sonho com o dia em que vou acertar no contentor e com isso vou provar ao meu namorado que tem valido a pena aqueles olhares de estranhesa e repugnância que tantas vezes me contemplam... :-)
Obrigado Luis, não estou sozinha!!!!
Bem Haja
Marília
Cara Marília
ResponderEliminarA arqueologia dos contentores das obras é uma arte com algumas regras:
1- Espreite apenas os contentores das zonas velhas da cidade.
2- Invariavelmente os azulejos estão pintados de castanho ou branco e é dificil dar logo com eles. Quando vir uma pequena placa aflorar no entulho, espreite logo. Com a unha raspa e aparecem logo os azuis e brancos
3- os azulejos tem sempre imensa argamassa agarrada atrás o que torna tb complicado dar com eles no entulho
4- Os achados compensam a vergonha que se passa a esgravatar nops contentores das obras
:-) Obrigado Luis :-)
ResponderEliminarOlá.
ResponderEliminarAcho que devia de consultar com regularidade o site SOS AZULEJO:
http://www.sosazulejo.com/azulejosfurtados.php
Azulejos roubados são muitos e assim pode ser que alguns que encontre possam ainda ser recuperados :-) Boas buscas!!
Obrigado pelo seu comentário
ResponderEliminarNo entanto, convém sublinhar que estes azulejos são achados nos contentores das obras no centro da cidade, pois como sabe, as pessoas odeiam coisas antigas em casa e não descansam enquanto não poem cá fora na rua os azulejos antigos, as portadas de madeiras, móveis antigos e até fotografias de família.
Em suma, estes não são os belos paineis que aparecem nos antiquários, que em alguns casos poderão ter uma origem duvidosa. O que eu tenho são fragmentos, cacos que as pessoas desprezamk e deitam fora
Já conhecia o vosso site, pois há poucos conteúdos sobre azulejos na net
Abraço
Parabéns, uma caça ao tesouro!
ResponderEliminarEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarMoro numa casa pombalina na Baixa e estou agora a descascar os meus azulejos que estiveram décadas pintados. Como há falhas de alguns na sala de estar, vou tentar colocar os que faltam tirando-os da despensa, pois são os mesmos.Sabe-me dizer que massa se utiliza para colar os azulejos sem os estragar? Obrigado.
ResponderEliminarhttp://arteeoficios.blogspot.com/
Caro Miguel
ResponderEliminarUm dos seguidores deste blog, o Alberto, especialista em restauro informou-me de um método estupendo para inserir os azulejos na parede, que permite retira-los sem os partir, caso se mude de casa. O segredo é usar uma argamassa, que mistura 4 partes de areia fina com 2 partes de cal hidráulica. Segundo o Alberto, esta argamassa sai com água e por isso podemos sempre voltar a tirar os velhos azulejos da parede, sem danifica-los.
No entanto, este método tem um problemazinho. Só vendem a cal em sacos de 40 kg, o que é um exagero, para quem só precisa de pequenas quantidades.
Em alternativa, comecei a usar gesso, para fixar os azulejos e já vi que saem bem sem se estragarem.
Por último, conheço-te pessoalmente muito bem. Houve um período em que convivemos muito.
Abraços e o meu e-mail, está no profil, se precisares de mais alguma informação
Viva! Reconheci o "cão" de um par de albarradas que vi.. Pelo corpo, escamas e asas parece-me que seja mais um dragão.
ResponderEliminarhttp://doreyecardoso.pt/index.php?option=com_content&task=view&id=28&Itemid=54
É a segunda albarrada na lista e encontram-se 2 na loja da rua do alecrim
Atenciosamente
Caro Pedro Freitas
ResponderEliminarTem toda a razão é o dragão da segunda albarrada. Já me forneceu tema para mais um post. Abraço
Luís