segunda-feira, 17 de maio de 2010

Como era interior da capela do Solar dos Montalvões: fotografias de interesse excepcional

como foi

A internet não nos deixa de surpreender pela enorme capacidade que tem de pôr gente que não se conhece de parte nenhuma a comunicar. Com a net, muitos voltaram a escrever cartas, em formato electrónico é certo, mas ainda assim fazendo renascer antiga arte epistolar e dando origens a variantes curiosas deste género, na forma de blogues e fóruns.

Naturalmente todos sabemos, que na maior parte dos casos a Internet é usada para engatar e escrever tontices, mas creio que neste blog se tem criado um espírito muito positivo de comunicação entre nós, com bons resultados. Uma das coisas mais extraordinárias que aqui se tem assistido é uma investigação em directo, de carácter policial, histórico e arqueológico acerca do antigo Solar dos Montalvões, em Outeiro Seco. Eu comecei por explorar e divulgar a compilação de dados acerca da família pacientemente feita pelo meu pai, ilustrando-a com fotografias actuais e antigas, usando sempre as plantas da casa levantadas no terreno pelo Manel e contando com os sólidos conhecimentos de arquitectura e arte deste último, os incentivos da Isabel e ainda do Altino, que me convidou para participar numa publicação sobre Outeiro Seco.


Como é


Depois apareceu o Humberto e qual Indiana Jones e revolucionou tudo. Descobriu o paradeiro dos santos da capela do Solar, que na família julgávamos perdidos, achou o retábulo do altar mor da referida capela na Casa da Cultura de Outeiro Seco e ainda localizou o antigo sino na igrejinha de N. Senhora do Rosário, cujas fotografias custaram-lhe uma subida a uma escada de seis metros.


Por último, O Humberto fez uma descoberta ainda mais aparatosa. Encontrou fotografias da capela de Sta Rita, do Solar dos Montalvões, no seu esplendor de barroco final, antes da sua destruição e pilhagem. Foram-lhe cedidas pelo Carlos Nepomuceno, um amigo seu e conterrâneo, cujos pais ainda vivem na casa mesmo em frente à Capela.

Quando abri o e-mail com estas fotografias experimentei a mesma sensação de maravilhamento, que aquela jornalista alemã, que acompanhava as obras do metro da cidade eterna, sentiu quando a máquina perfuradora pôs a descoberto os frescos de toda uma antiga vila romana. Esta cena do imortal filme Roma, de Felini traduz a realidade da construção do metropolitano de Roma, que como todos sabem, foi uma trapalhada, pois os empreiteiros tinham que estar sempre a interromper as obras e a desviar a linha, devidos aos constantes achados arqueológicos no subsolo romano.


Nessa mesma cena, os frescos há tanto tempo preservados numa câmara fechada, que representam um cortejo fúnebre onde está retratada toda uma família, que viveu há dois mil anos, desaparecem e desbotam-se em escassos minutos contaminados pelo oxigénio, enquanto a jovem jornalista grita inutilmente, pedindo que alguém faça alguma coisa para parar aquela destruição. Quando a cena termina as pinturas a fresco desapareceram para sempre

No final da leitura do e-mail do Humberto, perante a destruição irremediável que a capela de Sta Rita sofreu, senti uma tristeza idêntica à da rapariga alemã do filme, quando viu desaparecer perante si os frescos romanos

5 comentários:

  1. Olá Luís
    Palavras, onde estão as palavras sábias?
    Tamanha eloquência quer na descrição quer nas fotos soberbas da capela do Solar dos Montalvões de Outeiro Seco
    Que orgulho!
    Arrepiei, só de ver tanta beleza, ostentação dos dourados...fatalmente a decadência da mesma e ruína aparente
    Adorei a analogia que fez com os frescos romanos...fascinante, em tempos vi uma descoberta análoga de tábuas escritas também romanas em Inglaterra,que se conservaram em terrenos alagadiços,quando o arqueólogo as descobriu em minutos as letras desapareceram
    O Luís, é um homem extraordinário, sabe sempre em momento oportuno intervir, e no seu perfil honesto e autêntico ainda agradece as ajudas e colaboração dos demais, onde eu própria me incluo...
    Fez-me sentir revigorada em dobro, porque as suas palavras tem sido para mim desde que travei conhecimento com o seu blog de um crescente amadurecimento e maturidade nos vastos temas tão sabiamente aflorados
    Reparo abonatório, também extensível ao seu excelente amigo Manel,que em abono da verdade eu considero um bocadinho também meu, apesar de virtual, quiçá o melhor comentador que alguma vez anseio em demasia ler
    Ah, qualquer coisa em vocês de especial, e não falo do trivial, falo de cultura de massas!
    Beijos
    Isabel

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  2. Não quero deixar passar as palavras simpáticas da Maria Isabel e agradecer-lhas referindo que os seus contributos estimulantes, os quais vou lendo cuidadosamente.
    Quanto a esta foto, é o culminar de uma pesquisa do que foi e que não é mais. Mas pelo menos perdura a memória e a vontade de uma pessoa pela redescoberta do passado.
    Não tendo tu o mérito da descoberta de tais documentos, foste a "pedra de toque", fomentando o aparecimento de tais fontes, interligando-as e dando-lhes coerência, serviste afinal como elemento catalisador para fazer reviver o passado (passe este termo que está, fatalmente e televisivamente, ligado a Evelyn Waugh), e até eu, que nada tenho a ver com a família, fico deslumbrado pelos achados, não tanto pelo seu poder estético e artístico, que esse é evidente, mas pelo que a obra me evoca emocionalmente.
    O altar, na sua forma original possui um arranjo, que, e guardada a sua distância, mais humilde e intimista, faz-me lembrar um pouco o de Tibães, com esse esquema espantoso que pontua no centro do altar e que, no dizer de Robert Smith, é exclusivo dos altares do mundo português: o trono eucarístico com estrutura piramidal utilizada para a exposição do Santíssimo Sacramento!
    Creio que o trabalho de talha prima por ser contido, pela elegância de linhas, cores e formas que já não enxameiam todo o espaço com elementos decorativos, tão ao gosto do barroco português joanino.
    Está mais próximo das linhas que caracterizam o 3º estilo, o rocócó (de acordo com a definição dada por Robert Smith) e prenuncia já a conclusão do ciclo da talha dourada portuguesa, destronada pelo aparecimento do neo-classicismo.
    Nesta linha, este altar está mais ligado à obra de André Soares, conhecido por, nas igrejas da região de Braga onde trabalhou(Tibães é uma delas), fazer a união da cor com o dourado e denotar já o aparecimento de elementos neoclássicos na sua obra (por exemplo, neste "teu" altar denota-se o aparecimentos de uma subdivisão bem nítida, levada a cabo por um entablamento bem pronunciado, entre a zona das colunas e a apoteose ao nível superior, e o uso pilastras laterais, algo neoclássicas já).
    Os meus parabéns pelos achados, extensíveis ao Humberto, lá por terras flavienses ... um bem haja!
    Manel

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  3. Obrigado pelo teu comentário certeiro Manel. De facto o altar também me recordou Tibães e tens razão lá está o trono eucarístico, tão típico do barroco português e apresenta as características do 3º estilo da nossa talha.

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  4. Caro Luis
    Pela noite dentro e lembrando-me o galo de que a madrugada está próxima, posso concluir que já li praticamente todos os temos do seu blog...muito interessante e profundamente estudado, detalhado e arrumado....Parei aqui e deparei-me com as várias fotos mostrando desde a glória à decadência do altar mor da capela do antigo solar...sente-se profunda tristeza e impotência.....pior que o tempo, só a acção destruidora do homem...Conheci em tempos um convento da ordem Franciscana cujo altar de rica talha dourada e majestosas colunas ornamentadas com parras e pássaros o qual durante o espaço de 1 ano deparei-me com o desmantelar daquela joia....toda a ornamentação da igreja foi feita em resultado de grandes quantias que D. João V ofereceu.......nos ultimos anos, até as tampas dos tumulos rasos do claustro foram levantadas....Falo do Convento de S.Miguel das Gaeiras- Óbidos.....conheci-o como se o ultimo frade tivesse partido na noite anterior.....hoje restaurado serve o municipio, mas perdeu todo o brilho,e a arte...um erro imperdoável da nossa geração....Conheci as ruinas de um outro convento chamado de Vale Benfeito perto de Serra de El´Rei ( sucessor do convento das Berlengas ) quando conheci este, só vi paredes despidas de cantaria...a fonte foi a ultima peça que desapareceu...hoje é um eucaliptal no lugar do convento, mas não deixa de ser um local de meditação....Entrei em muita casa antiga........muitos salões, muitos recantos..é claro que as ruínas da sua origem transmontana....estarão vivas sempre...porque aquilo que vê não são pedras...mas a alma.....a conversação com os antepassados...o orgulho de dizer: eu estou aqui e invoquei..
    um abraço
    Vitor Pires

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  5. Caro Vítor

    Muito obrigado pelas palavras simpáticas.

    Como sou bibliotecário, procurei que o blog tivesse uma boa arrumação de assuntos e fico contente que tivesse reparado nisso.

    COm efeito, este blog foi uma forma de dar vida a recordações familiares associadas ao Solar e esse processo foi-se tornando num crescendo, em que começaram a participar pessoas de Outeiro Seco, que eu não conhecia de parte nenhuma, como o Humberto e que me enviaram elementos que faltavam às nossas memórias, como as fotografias da capela ainda intactas. Eu já não me recordava da capela e o meu pai também tinha uma memória muito esbatida deste espaço. O Humberto deu-nos as peças do puzzle que faltavam e conseguiu-se reconstituir um espaço, antes de ser profanado e esventrado

    Um abraço e saber que o que escrevi lhe deu prazer, deixa-me feliz.

    um abraço

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