sexta-feira, 26 de março de 2010

Algumas recordações a propósito de uma chávena de café da Vista Alegre

Esta pequena chávena de café de porcelana casca de ovo estava em casa dos meus avós paternos em Chaves. Nas férias, quando regressávamos de Vinhais, para Lisboa, costumávamos sempre almoçar em casa deles, em Chaves, e no final da refeição o meu pai tomava sempre café por ela. Sempre gostou de tomar café forte, em chávenas de porcelana pequenas e esta, da Vista Alegre, produzida entre 1880-1921, estava-lhe sempre reservada. Sempre que a olho, regressa-me à memória a essa viagem da infância, que começava em Vinhais, de manhã e ao fim de cerca de duas horas numa estrada inacreditável, com centenas e centenas de curvas, vencíamos os 60 km que nos separavam de Chaves e lá saiamos do carro com os rabos moídos de tanta curva.


A casa dos meus avós em Chaves era um pequeno Museu. Tinham os dois muito bom gosto, muito bons móveis, sóbrios, mas aquilo era um desconforto de casa. A sala só era aberta nessas ocasiões especiais e tudo o que lá estava dentro tinha apenas uma função decorativa. Nenhuma cadeira ou sofá era feita a pensar no conforto.

No entanto, nesse dia serviam-nos sempre um bom almoço. Recordo-me ainda de tantos pormenores, do serviço de copos (hoje, dividido com os meus irmãos), ad sineta para chamar a criada, do faqueiro de prata, do grande relógio da sala e de todos aqueles pormenores, que criavam um ambiente a cheirar móveis bem encerados, que me custa descrever com clareza, pois falta-me o talento literário de Proust para descrever interiores.

O meu avô Silvino morreu quando eu tinha cerca de 9 anos. Conheci-o mal. Recordo-me de andar de mão dada com ele nas ruas de Chaves e que me levava a passear ao jardim da Madalena. Ainda hoje, quando regresso aquele jardinzinho romântico de província comovo-me sempre um bocadinho a pensar nele. Era um homem de rotinas, fazia todos os dias a mesma coisa, atravessava a rua nos mesmos sítios. Creio que herdei essa característica dele.
Os meus Avós Maria do Espírito Santo e Silvino

Ela, a minha avó Mimi, de quem já falei aqui conheci-a melhor, quando já tinha a idade da razão e pude assim aproveitar o seu convívio e não há dúvida que influenciou o meu gosto pela história e pelo passado.

Depois do almoço eram mais horas e horas de viagens por estradas nacionais, com curvas e ainda mais curvas e creio que íamos jantar a Coimbra. Deveríamos chegar a Lisboa lá pela meia-noite. Enfim, era a rede de estadas portuguesas nos primeiros anos da década de 70.

Bem, hoje dispersei-me muito. Estive como a Isabel que vai, volta, parte e regressa de todas as direcções e que tem andado ausente e temos sentido a sua falta. Na verdade a intenção deste post era chamar-vos a atenção, para que um dos comentadores deste blog, abriu também um blog, inteiramente dedicado ao coleccionismo de tudo o que é relacionado com o café o http://cafemuseu.blogspot.com/

7 comentários:

  1. Café! A bebida que tanto gosto, talvez por ter nascido em Angola numa região produtora de café.
    As minhas memórias mais remotas estão relacionadas com esta bebida, que antes de o ser é um lindo arbusto,de lindíssimas e aromáticas flores brancas.As noivas daquela região de Angola, quando casavam na época dos cafeeiros em flor, compunham o seu ramo com estas flores.Mas voltando à sua chávena. É muito bonita. Tanto o chá como o café bebidos, em peças delicadas têm outro sabor. Já espreitei o cafemuseu.É interessante.Qualquer dia encho-me de coragem e divulgo o meu blog que tem dois ou três dia de vida :) mas acho-o um bocadinho....nem sei bem.
    Um abraço e bom fim de semana
    Maria Gabela

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  2. Olá Luis...brigada!
    Que bom voltar a sorrir com o remate do seu post.
    Muito a propósito, aliviou a minha melancolia.
    O seu jeito doce que usa na escrita é encantador.
    Se porventura não comento algum post, acredite é apenas por falta de cultura.
    Nada saberia acrescentar.
    Lendo-o a si e aos comentários do Manel, fico absorta, de dicionário na mão.
    A vossa escrita lírica revela profundos conhecimentos que eu por não gostar de ler, não tenho....
    Sei que poderia tentar, se quisesse...mas não consigo...

    Bem, a chávena é finíssima, com o duplo fascínio de ter sido usada pelo seu pai na casa dos avós em Chaves...que considerou um Museu.

    Confesso que a leitura me transportou até lá, revivi todas as peças que lhe couberam por herança, e que já nos mostrou, foi só fechar os olhos...gostei de relembrar a travessa azul do "cavalinho" da Mimi ao mesmo tempo que saboreava um dos seus pastéis de massa tenra....
    Ouvi um barulho, estremeci, ah, que pena, era um sonho...adorei a visita ao Museu...muito porque é dos lugares mais emblemáticos onde me sinto bem.

    Tenho uma vasta colecção de chávenas de café. De todas, as minhas preferidas.

    Acredite, fiquei emocionada...estava mesmo a precisar de umas palavras doces.
    Sinto-me muito melhor!
    Um abraço com votos de bons divertimentos no fim de semana.
    Isabel

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  3. Li com prazer os comentários das duas senhoras, que, para além do teu "post", também me encantaram.
    Fiquei curioso sobre o blog da Maria Gabriela, oxalá nos permita ter-lhe acesso, seria um prazer.
    E, Isabel, confesso igualmente que já sentia falta dos seus comentários, e devo salientar aqui que já aprendi muitas coisas com estes seus escritos, sobretudo sobre a vida rural da região d'onde partilhamos raízes (adoro lê-la quando se vai lembrando sobre a sua juventude lá para aqueles nossos lados), apesar das minhas estarem, por força das circunstâncias, mais dispersas por esse mundo fora.
    Gostei imenso deste teu escrito Luís, intimista e algo nostálgico para variar.
    Deve ser do tempo, que este início de Primavera algo tíbio, chuvoso, de sol envergonhado e com ventanias fora de época, propicia este estado de espírito.
    Até eu que sou pragmático e pouco dado a ensimesmado, dou por mim, de quando em vez, a olhar para o vazio.
    No entanto, a quantidade de coisas pelas quais nutro interesses rapidamente me levará ao torvelinho que é afinal a vida!
    Quanto às chávenas de café, apesar de não as coleccionar (na realidade não colecciono nada, falta-me a disciplina e a vontade ... limito-me a comprar quando sinto empatia com uma peça e, "last but not the least", quando tenho com que a pagar!), tenho um fraquinho por elas quando são delicadas e pequenas (nada de potes nem púcaros para o café!).
    E esta que apresentas, para além da seu valor afectivo, é na realidade tão bonita quanto singela!
    Manel

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  4. Excelente sua narrativa. Lembranças do passado são muito boas para recordar pequenos detalhes!

    http://escrituraviva.blogspot.com

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  5. Cara Maria Gabela
    Achei imensa graça saber que o arbusto do café dá flores e que as noivas em Angola as usavam para fazer os seus bouquets. E eu que só concebia o café como uma coisa preta no fundo de uma chávena.

    Avance com o seu blog. É a oportunidade para escrever o que lhe apetece, sem ser avaliada por professores sem imaginação, ou chefes cretinos.
    Abraços e apareça sempre

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  6. Isabel
    Os comentários da Isabel já fazem parte do blog. Simpatizo com a forma como a Isabel se dispersa. A Isabel é como o Barroco das Igrejas Portuguesas, agita-se, movimenta-se em todas as direcções, perde-se e depois lá volta a encontrar-se no final. Há muitos anos, tive um chefe, que escrevia assim e de quem ainda sou muito amigo.

    E depois este blog não é um concurso de TV para avaliar a quantidade de conhecimentos. Tenho procurado aqui um estilo em possamos escrever sobre velharias de uma forma livre, bem como expressar sentimentos e ideias acerca de antiguidades, que não cabem num manual de história da arte ou num catálogo de leiloeiro

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  7. Cara Genilda

    Obrigado pelo seu comentário. Apareça sempre neste Blog

    Abraços

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