Tenho uma certa paixão pela escultura rude, ingénua e com força e há uns tempos encantei-me na feira-da-ladra por uma outra Vénus pré-histórica e trouxe-a para minha casa para admira-la e ama-la.
É difícil datar peças como esta comprada no mercado de velharias, até porque está fora de um contexto arqueológico, que, se hipoteticamente fosse conhecido, permitiria data-la através da camada estratigrafica e dos utensílios circundantes. Mas quando se compram peças arqueológicas no mercado de velharias, é mesmo assim. Ganha o nosso impulso de coleccionador e perde-se a informação histórica.
Em todo o caso esta estatueta filia-se na tradição das chamadas Vénus pré-históricas, da qual a chamada Vénus de Willendorf é a peça mais emblemática.
Em termos abstractos, estas figurinhas formam um losango, com duas extremidades afiladas que se vão alargando em direcção ao corpo. Abdómen, ancas, seios e nádegas e vulva são deliberadamente exagerados em detrimento da cabeça, braços e pés nestas Vénus do Paleolítico Superior, produzidas por mãos humanas entre 30.000 a 10.000 anos antes de Cristo.
Mas, comparativamente à minha outra Vénus, esta apresenta algumas diferenças. Está numa posição sedente, o que a aproxima mais de uma Vénus do Neolítico, o período em que o homem descobre a Agricultura. A peça que encontrei mais próxima desta foi a chamada Cíbele de Çatal Huyuk, uma deusa mãe sentada, que os especialistas dizem estar em trabalhos de parto (No Período romano as mulheres ainda davam à luz em cadeiras de parto). Durante o Neolítico este culto à Deusa Mãe propaga-se por todo as terras da orla Mediterrâneo e os historiadores afirmam que este culto feminino é uma associação que os homens daquele período fizeram entre a mulher e a terra. Era da capacidade reprodutora de uma e de outra que dependia a existência humana.
O Neolítico apareceu em Portugal através dos rios do sul por volta de 5.000 a 4.000 antes de Cristo e é provável que a minha Deusa-Mãe date pouco depois dessa época.
Experimentei algumas dificuldades em fotografar a minha Vénus sentada. Pensei num fundo preto ou azul para realçar as formas voluptuosas mas o resultado foi desastroso. O branco das paredes como cenário também não lhe evidenciava as formas. Até pensei coloca-la numa pedra, quando percebi, ao deixa-la ao acaso numa almofada de tecido vistoso, que esta minha Vénus era afinal como todas as mulheres de seios e nádegas opulentas da história da arte e pedia um fundo de veludo vermelho, de tecidos opulento para fazer brilhar as suas formas voluptuosas. Afinal a figurinha Neolítica não está tão longe da nudez descarada da Maja desnuda de Goya ou das mulheres pintadas no meio do luxo opulento dos lupanares de Paris, que Toulouse-Lautrec pintou no século XIX.
É difícil datar peças como esta comprada no mercado de velharias, até porque está fora de um contexto arqueológico, que, se hipoteticamente fosse conhecido, permitiria data-la através da camada estratigrafica e dos utensílios circundantes. Mas quando se compram peças arqueológicas no mercado de velharias, é mesmo assim. Ganha o nosso impulso de coleccionador e perde-se a informação histórica.
Em todo o caso esta estatueta filia-se na tradição das chamadas Vénus pré-históricas, da qual a chamada Vénus de Willendorf é a peça mais emblemática.
Em termos abstractos, estas figurinhas formam um losango, com duas extremidades afiladas que se vão alargando em direcção ao corpo. Abdómen, ancas, seios e nádegas e vulva são deliberadamente exagerados em detrimento da cabeça, braços e pés nestas Vénus do Paleolítico Superior, produzidas por mãos humanas entre 30.000 a 10.000 anos antes de Cristo.
Mas, comparativamente à minha outra Vénus, esta apresenta algumas diferenças. Está numa posição sedente, o que a aproxima mais de uma Vénus do Neolítico, o período em que o homem descobre a Agricultura. A peça que encontrei mais próxima desta foi a chamada Cíbele de Çatal Huyuk, uma deusa mãe sentada, que os especialistas dizem estar em trabalhos de parto (No Período romano as mulheres ainda davam à luz em cadeiras de parto). Durante o Neolítico este culto à Deusa Mãe propaga-se por todo as terras da orla Mediterrâneo e os historiadores afirmam que este culto feminino é uma associação que os homens daquele período fizeram entre a mulher e a terra. Era da capacidade reprodutora de uma e de outra que dependia a existência humana.
O Neolítico apareceu em Portugal através dos rios do sul por volta de 5.000 a 4.000 antes de Cristo e é provável que a minha Deusa-Mãe date pouco depois dessa época.
Experimentei algumas dificuldades em fotografar a minha Vénus sentada. Pensei num fundo preto ou azul para realçar as formas voluptuosas mas o resultado foi desastroso. O branco das paredes como cenário também não lhe evidenciava as formas. Até pensei coloca-la numa pedra, quando percebi, ao deixa-la ao acaso numa almofada de tecido vistoso, que esta minha Vénus era afinal como todas as mulheres de seios e nádegas opulentas da história da arte e pedia um fundo de veludo vermelho, de tecidos opulento para fazer brilhar as suas formas voluptuosas. Afinal a figurinha Neolítica não está tão longe da nudez descarada da Maja desnuda de Goya ou das mulheres pintadas no meio do luxo opulento dos lupanares de Paris, que Toulouse-Lautrec pintou no século XIX.
Que interessante a relação que estabeleceste com a "Maja desnuda" do Goya, a qual, segundo algumas línguas mais viperinas, representaria D. Caetana, a duquesa de Alba (hoje, esta identificação está definitivamente posta de lado, mas que me agrada, lá isso agrada!).
ResponderEliminarObserva também a Venus de Parzadzik, da Bulgária, uma figura em posição sedente também, mas com um detalhe decorativo muito mais cuidado.
Há uns tempos atrás também encontrei uma referência às Vénus, ainda mais antigas que as europeias, originárias do Norte de África, as "Vénus de Tan-Tan", encontradas em sedimentos datados entre 300 000 e 500 000 anos.
Achei o artigo muito interessante, e deixo-te aqui a sua direcção:
http://donsmaps.com/tantanvenus.html
Manel
Olá Luís
ResponderEliminarCá estou eu de novo.
Também tenho alguma atracção por pedras esculpidas, quer pela mão do homem, quer pela natureza - fósseis, estalactites - e vou reunindo as que vou encontrando.
Vivo no campo e o meu terreno, perto do leito de um rio, tem muito seixo em quartzito, por isso, sempre que apanho pedras para o jardim vou encontrando algumas que me parecem bifaces, machados, núcleos, lâminas, goivas, embora já muito rolados, todos à superfície. Por vezes consulto os museus da Matriznet e faço pesquisa por utensílios líticos para comparar as formas. Por outro lado, há zonas aqui perto onde aparecem fósseis de amonites, belemonites e até trilobites mas destas nunca encontrei nenhuma. As estalactites e estalagmites aparecem perto da minha terra natal, em grutas, e muitas pessoas do campo, não sabendo o trabalho que deu à natureza esculpir aquelas formas, cortavam-nas e ofereceram algumas aos meus pais. Enfim, a ignorância faz muitos estragos...
Quanto às suas Vénus, acho-as interessantes, mas são o tipo de peça que eu nunca me senti tentada a comprar. Acho sempre que são peças para estar em museus e que a forma como foram obtidas, à margem dos estudos arqueológicos, pode impedir o conhecimento de contextos pré-históricos ainda por estudar, como aliás o Luís também refere. Conhecia a Vénus de Willendorf mas nunca tinha visto outras tão toscas e com o formato de losango tão acentuado, como a sua primeira.
É curioso que algumas pedras que guardo, têm também forma losangular, quem sabe se são estilizações ou abstracções dessas Vénus primitivas?
Um abraço
Maria A.
Olá Luís
ResponderEliminarQue subtileza falar novamente de Vénus
Iria quase jurar que a vi...
estava? na mão de um homem que a mirava, demorei a olhar, lembrei-me logo de si, feira da ladra há coisa de 15 dias
Sim, porque a que tem pendurada na parede a cheguei a ver também nas feiras antes de a comprar
No próximo post sobre este tema espero saber mais sobre o que o Manel falou, só o Luís sabe tirar a súmula dos conteúdos e tornar apetecível a sua leitura. Fico à espera!
Lendo o comentário da Maria Andrade,comungo a mesma opinião que peças destas de rara beleza deveriam estar em Museus, ser estudadas...mas ainda bem que foi o Luís que as adquiriu e no seu jeito as retratou com informação suficiente até para os mero desconhecedores de tal arte escultórica
Aproveito para pedir licença e dizer que adoro os comentários da Maria Andrade, adora pedras, tal como eu, este 2º ano "cheira-me" ser deveras auspicioso
Beijos
Isabel
Gostei do que escreveu cara Maria Andrade.
ResponderEliminarExiste uma teoria para o nascimento da arte pré-histórica, que explica que o homem aproveitou as formas naturais existentes na natureza, nomeadamente, nas pedras, nos ossos e nas paredes das cavernas, que lhes recordavam animais ou formas humanas e que depois as afeiçou, para aumentar essa semelhança.
O supra sumo da escultura clássica, Miguel Ângelo, dizia sempre que a escultura já existia na pedra e que ao artista competia, desvenda-la, retirar o que estava a mais. Por essa razão, ele próprio deslocava-se às pedreiras para escolher o mármore onde estava já contida a obra-prima
Abraços
Olá, de novo
ResponderEliminar(isto está a tornar-se viciante...)
Agradeço as palavras, quer do Luís, quer da Isabel, cujo blogue vou espreitando diariamente. Já sabia que gosta de pedras e também guarda fragmentos de faiança, tal como eu.
Voltando às Vénus do Luís, nunca me lembraria de associar aquelas figuras de formas exageradas, super opulentas, à beleza proporcionada da Maja de Goya ou às belas francesas do Toulouse-Lautrec. Iria mais facilmente para as gorduchas do Botero, mas os olhos masculinos vêm certamente as coisas de maneira diferente...
Quanto à ideia de que o artista se inspira nas formas naturais ou nelas descobre a peça que vai esculpir, acho que é sobretudo verdade na escultura popular. Há um artesão na serra da Lousã - chama-se Carlos Rodrigues e vive na aldeia típica de Gondramaz, mas já não trabalha - que fez belíssimas esculturas em pedra local, rudes e ingénuas. Ele procurava na encosta da serra os bocados de pedra que melhor serviam à forma e tamanho da peça que queria esculpir. Tenho duas "santas" dele de que gosto muito, mas nunca apanhei nenhuma pietá que eram peças muito procuradas.
Bem, por hoje é tudo, esperemos...
Abraços
Maria A.
Voltei
ResponderEliminarPara dizer à Maria Andrade que tenho um post sobre Gondramaz onde faço alusão, se a memória não me falha ao tal escultor Carlos Rodrigues, numa das paredes de xisto lá se encontra cravada uma mulher rude e ingénua...deliciosa, de regalar a vista
Beijos
Isabel
Manel Estive a ler mais atentatamente sobre as Vénus de Tan-Tan e fiquei impressionado. De facto as mais antigas datam dos finais do Paleolítico inferior (2 500 000 - 2 000 000 até 300 000 a.C) e as outras do Paleolítico Médio (300.000 a 40.000 a. C). Portanto, são duma época em que não existia o homem actual, o Sapiens Sapiens.
ResponderEliminarÉ exaordinário o avanço que arqueologia tem dado ao estudo da pre-história. Cada vez há mais dados novos e o que estudei na Faculdade, começa a ficar datado.Na altura, era um dogma assente que só havia arte no Paleolítico Superior.
Em todo o caso as Vénus de Tan-Tan não tem a forma de losango como as "minhas venus". Julgo que as peças que tenho serão mais características do Paleolítico Superior e do Neolítico (a Vénus sentada)
Abraço
Cara Maria Andrade
ResponderEliminarRepare que as Vénus pré-históricas, a Maja Desnuda e a prostituta pintada por Toulouse-Lautrec apresentam todas uma forma losangular.
Abraços e é um prazer ler os seus comentários
Luís
Estimado Luís,
ResponderEliminarParabéns pelo seu blogspot!
Quanto às vénus que adquiriu na Feira da Ladra, não tenho infelizmente boas notícias para dar-lhe.
Tratam-se de falsificações produzidas, a meu ver de maneira bastante inábil, pelo próprio vendedor. Foi ele mesmo quem mo confessou :)
Se as observar com atenção, verificará que foram esculpidas num arenito mal consolidado, e por isso de baixa dureza e com tendência a esfarelar... Se as deixasse durante 2 ou 3 dias dentro de um recipiente com água, acabariam por nela se dissolver.
Eu próprio adquiri algumas, por curiosidade, ao mesmo feirante e cedo me apercebi de que não eram genuínas :). No entanto dei como bem empregues os poucos euros que por elas paguei, pois são bastante decorativas...
Um abraço,
J. Manuel
Caro J Manel
ResponderEliminarObrigado pelo seu comentário.
De facto nunca mergulhei as minhas pobres vénus na água, mas tive sempre algumas dúvidas sobre a sua autenticidade e tal como o J. Manel, apesar de tudo, dei por bem empregue o meu dinheiro, porque mesmo para réplicas, são muito bem feitas. Já comprei boas reproduções de esculturas antigas nos museus portugueses e também em França e normalmente são muito mais caras do que estas Vénus
Abraço e volte sempre