quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Sta Ana ensinando a Virgem, em Espuma do Mar


Há pouco tempo arranjei esta pequena obra com uma moldura oval contendo uma Sta. Ana ensinando a Virgem a ler, ou a Sant'Ana Mestra, como é vulgarmente conhecida esta representação. É um trabalho estremamente precioso executado em cerca de seis cm de diâmetro e foi por isso difícil de fotografar. Apresento uma imagem desta obra de arte na minha casa para que possais ter uma ideia das suas dimensões mínimas.
O Manel que tem uma peça algo semelhante já me tinha dado umas pistas sobre a sua origem, contando-me, que a vendedora lhe tinha afirmado que o material, de que era feito o seu interior provinha da Turquia, duma zona conhecida por Pamukkale, hoje classificada património mundial da UNESCO e onde há umas nascentes termais calcárias, que produzem depois umas pedras que parecem algodão. Aliás Pamuk em Turco quer dizer algodão e fazendo um desvio ao assunto, como faria a nossa Maria Isabel, aproveito para recomendar a leitura de Orhan Pamuk, um escritor turco, que eu por vezes copio um bocadinho nos meus escritos, embora sem conseguir.

Não encontrando nada na internet sobre escultura religiosa feita em pedras de Pamukkale, fui pesquisar no http://www.rubylane.com/, e de facto, no catálogo do melhor site de antiguidades on-line, lá apareceram duas obras em tudo semelhantes à minha. Segundo este site, estas esculturinhas em miniatura eram feitas em França, entre 1850-1900, em vários conventos e casas religiosas daquele País e eram vendidas como objectos de devoção ou souvenirs de locais de peregrinação.






Também encontrei uma Notre-Dame du Chêne no site http://www.etsy.com/ com as mesmas características.


Estas esculturas delicadas eram executadas num material que ficou conhecido por Espuma do Mar (os ingleses usam a palavra alemã Meerschaum. Os franceses designam-na por écume de mer), que foi também muito utilizado no fabrico de cachimbos. A Espuma do Mar é um mineral branco e mole, que por vezes se encontra a flutuar no Mar Negro, e é daí que lhe advem o nome. A Espuma do Mar é opaca, de cor branca acinzentada ou creme e pode ser trabalhada só com uma unha. Presta-se pois a trabalhos de grande precisão. A maior parte deste mineral é sobretudo extraído na Turquia, em Eskişehir e perto de Ancara. O nome científico deste mineral é o Hidrogenosilicato de magnésio.

Portanto, a vendedora da peça do Manel, não andou muito longe da verdade, embora a peça não seja a tal pedra de Pamukkale, mas sim Espuma de Mar

6 comentários:

  1. Caro Luís
    Mais um post seu que me encantou, por várias razões, e que não resisto a comentar, embora já receie tornar-me demasiado intrusiva.
    Em primeiro lugar a sua Sant'Ana:
    Acho uma ternura a representação de uma mãe com um livro aberto a ensinar a filha a ler. O facto de ser uma miniatura num material aparentemente delicado - até parece um trabalho em miolo de figueira - aumenta-lhe o encanto. É a chamada Sant'Ana Mestra porque também há representações da Sant'Ana Guia, sem livro, levando a virgem menina pela mão. Dá-se ainda o nome de Santas Mães quando estão representadas mãe e filha com o Menino Jesus pois aí há efectivamente duas mães. Aconselho-o a consultar a colecção de Sant'Anas de Ângela Gutierrez, brasileira, que vai achar uma delícia. São umas trezentas pequenas esculturas, séc. XVII, XVIII, XIX e XX, ingénuas e verdadeiramente encantadoras. Basta ir ao Google e escrever Colecção de Sant'Anas de Ângela Gutierrez q encontra logo.
    Gosto de Arte Sacra, apesar de não ser crente, e tenho uma predilecção especial precisamente pelas Sant'Anas. Tenho uma Sant'Ana Mestra em terracota, pequenina, que comprei há menos de um ano numa feira e não foi nada cara,50 euros, considerando os preços proibitivos que atingiu a Arte Sacra. O meu marido gosta de Cristos e vi que tem um belíssimo na sua parede, mas eu prefiro esculturas de santos(as)
    em madeira ou terracota.
    Agora sobre o Orhan Pamuk:
    Li a obra dele "Istambul" e fiquei com muita vontade de visitar a cidade. Ainda pensámos ir até lá numa escapadela em Setembro mas porque vamos ao Brasil em Dezembro e não arranjámos viagens baratas só a Istambul, adiámos esse plano. Também já ouvi falar de Pamukkale com as nascentes termais calcárias e a Capadócia deve ser um lugar fabuloso, mas a minha prioridade é o palácio de Topkapi, com a bela colecção de porcelanas, e o Grande Bazar, sobretudo a parte das antiguidades.
    A obra "Istambul" é auto-biográfica, não sei se já leu, mas vai ver que aparecem descrições de infância - as enormes casas de família, o convívio com os avós e tios, os salões cheios de objectos antigos - que lhe vão recordar a sua própria infância, a avaliar pelo que li nos seus posts. Eu revi-me bastante nalgumas descrições: as saídas com a mãe pela cidade, as viagens de eléctrico, as ruas cheias de gente, fizeram-me lembrar Coimbra há uns cinquenta anos.
    Só mais um assunto:
    Vejo que consulta muito o rubylane mas eu prefiro outros sites de antiguidades, ingleses ou americanos, que não sei se conhece: o Trocadero (www.trocadero.com), o antiqnet(www.antiqnet.com) e o goantiques (www.goantiques.com).
    Bem, já chega por hoje.
    Um abraço Maria A.

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  2. Cara Maria Andrade

    Li o Instambul do Pamuk e fiquei encantado pelo estilo puro e pelas suas recordações cheias de sensibilidade feitas à volta de fotografias antigas e gravuras. Alguns dos meus posts de memórias familiares foram lá roubar algumas ideias.

    Obrigado pelas rectificações sobre Santa Ana. Faz falta um dicionário iconográfico para a arte portuguesa. Eu anda sempre as aranhas com as atribuições. Só tenho em casa um dicionário de santos portugueses, que é fraquinho e suspiro pela obra do Louis Reaud, que há muitos anos consultava na Biblioteca Nacional e que está esgotada e mesmo que a publicassem seria demasiado cara para o meu bolso.

    Há uns anos vi uma exposição de oratórios da colecção da Ângela Gutierrez ,em Lisboa, no Museu de S. Roque e fiquei encantado. Lembro-me da inauguração da exposição onde havia brasileiros com um ar estupendo, daqueles que só se encontram nas novelas. Mais tarde, o meu amigo Manel viu o seu Museu no Brasil, numa cidade qualquer de Minas Gerais e também ficou surpreso com a qualidade da colecção de Ângela Gutierrez. Terei que ver melhor o site...

    Já vi que percebe de arte sacra e aproveito para lhe pedir uma opinião, No meu post http://velhariasdoluis.blogspot.com/2010/04/descoberta-de-um-tesouro-perdido-da.html está uma imagem que eu creio tratar-se de Sta Teresa de Ávila, embora no museu onde se encontra a tenham por Sta. Ana. Por favor, diga-me o que lhe parece.

    Já conhecia o Trocadero e quanto aos outros registei a informação

    Abraços

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  3. Creio que a colecção de Ângela Gutierrez, milionária, filantropa, fabulosa herdeira da construtora iniciada pelo seu pai, mulher dedicada às artes e tendo ocupado cargos na área da cultura no Estado de Minas Gerais, no Brasil, e sendo também, entre outros cargos, consultora do Instituto do Património Histórico e Artístico do Brasil, está dividida por vários pólos, sendo que o dedicado às Sant' Anas se encontra, creio, em Belo Horizonte, igualmente no estado de Minas Gerais.
    A colecção que eu vi (parte dela esteve também exposta aqui em Lisboa), é a que ocupa um grande casarão em Ouro Preto, junto à Igreja do Carmo, onde, segundo a tradição, morou o célebre Aleijadinho (1738-1814).
    Numa noite cálida de Inverno (bem, o Inverno de Ouro Preto é uma nossa Primavera a atirar para o Verão) eu e os meus primos, com quem viajava na altura, decidimos assistir a um concerto de música barroca brasileira, rodeado por aqueles oratórios todos ... uma visão esplendorosa ... eu nem sabia bem para onde cravar a minha atenção, se nos oratórios povoados por mil imagens místicas e feitos dos materiais mais díspares, se na música executada em instrumentos de época.
    Creio que me dividi e não prestei a devida atenção nem a uns nem a outros.
    Mas foi uma noite mágica e inesquecível, só suplantada pelo dia seguinte quando me desloquei a Mariana para assistir a um concerto na catedral, no único orgão barroco, alemão, a funcionar no Brasil (pelo menos na altura, não sei se entretanto não terão recuperado mais algum), oferta de D. João V àquele templo.
    Mas desviei-me do tema ... são as influências da Maria Isabel, e de como é bom por vezes serguirmos os nossos impulsos.
    Esta tua escultura tem cerca de um terço da altura da minha, o que aumenta o espanto pela capacidade de pormenor necessário! A minha já é uma minúcia de pregueados e fragilidades, agora esta tua é ainda mais incrível, e começo a imaginar que tipo de instrumentos seriam necessários à produção de tais peças.
    A obra denominada "Notre Dame du Chêne", cuja foto apresentas, é absolutamente fantástica!!!!
    Achei muito curioso porque, a partir das tuas pesquisas, acabei por saber que igualmente se explorava este tipo de mineral, a sepiolita, aqui na Península Ibérica, na região de Madrid, próximo das margens do Tejo.
    Manel

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  4. Luís, ao contrário da impressão que lhe possa ter dado, não percebo muito de arte sacra. Percebo alguma coisa de Sant'Anas porque, como já lhe disse, gosto muito dessas figuras e procurei informar-me, para o que tive valiosa ajuda na colecção da Ângela Gutierrez.
    De qualquer forma, já tinha lido o seu post de 04 de Abril há tempos, voltei a lê-lo e, pelo que sei de Sant'Anas e pelo que conheço da vida de Santa Teresa de Ávila, acho que tinha toda a razão na sua discordância. O atributo do livro na mão, sendo ela grande escritora, sobretudo de poemas místicos, a atitude de êxtase demonstrando uma entrega total ao seu grande amor, Deus, a tal que dizia num poema "muero porque non muero" desejando o encontro com o seu amado, tem tudo a ver com a imagem em causa que pertencia à capela da sua família.
    Ainda bem que pelo menos esse património foi salvaguardado.
    Acho desolador ver o solar naquele estado de abandono e ruína. As autarquias deviam ter mais respeito pelo património edificado que lhes pertence porque é muitas vezes uma parte importantíssima da história local, que pertence a todos, que se vai perdendo.
    Aqui perto do sítio onde vivo havia uma casa seiscentista com uma janela manuelina num corpo provavelmente mais antigo, integrada numa quinta duma família com história e onde havia uma outra casa do séc. XIX e os responsáveis da Câmara, tendo adquirido todo o espaço,com o nosso dinheiro, passados uns anos foram lá com as máquinas e arrasaram tudo.
    Foi uma dor e uma revolta imensa, na altura, e ainda hoje me dói ao ver os edifícios modernaços de gosto duvidoso que lá construiram.
    Um abraço
    Maria A.

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  5. Olhe, Luís, entretanto encontrei uma Sant'Ana do séc. XVII num roteiro do Museu de Alberto Sampaio em Guimarães. Está sózinha e tem um livro aberto que segura com as duas mãos, olha para baixo em atitude de recolhimento ou de leitura, portanto numa postura muito diferente da que apresenta a imagem que o Luís atribui a Santa Teresa de Ávila. Eu continuo a achar que tem razão.
    Maria A.

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  6. Catra Maria Andrade

    Fui ver a imagem do Museu Alberto Sampaio ao Matriz, Inventário E 6, e de facto não apresenta a atitude de êxtase místico da escultura proveniente do Solar de Outeiro Seco. Em comum tem a pena e o livro.

    Faz mesmo falta dicionário de iconogradia portuguesa. Eu não se não tivesse um emprego estúpido e trabalhasse num departamento de uma faculdade de história da arte dedicava-me a isso

    Obrigado

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