sexta-feira, 28 de maio de 2010

Prato coberto em faiança inglesa


Na Feira da Ladra, há um senhor de bigode loiro ou arruivado, que deve ter por objectivo chegar ao final do dia, sem nenhum dos cacos e velharias que carregou de manhã. Quer regressar a casa de mãos a abanar. Por essa razão é particularmente perigoso, pois mal nos vê vagamente interessados numa peça, põem-na nas nossas mãos, faz-nos um preço convidativo e se nos vê hesitar, baixa ainda mais o preço. Assim, quase sem dar por isso, ou mesmo sem querer, porque normalmente compro praticamente tudo em azuis, dourados ou vermelhos, voltei para a casa com este prato coberto num magnífico estado de conservação, tendo apenas gasto 20 euros. Por este preço era pecado deixa-lo lá.
Infelizmente, o prato coberto não está marcado. Presumo que seja faiança inglesa do século XIX, talvez da segunda metade. O tema não anda longe das chávenas que mostrei em post anterior, Temos no primeiro plano uma fonte com uns putti, segue-se um lago romântico e ao fundo há um palácio com umas torres, que me recordam as do Alcazar de Toledo.

No entanto, provavelmente trata-se de uma paisagem imaginada, que traduz a moda de representar vistas e países na loiça, tão típica da cerâmica inglesa e copiada por toda a Europa. Vasculhei na internet todos os sites de faiança inglesa e não consegui encontrar nada sobre este motivo, nem quem o fabricou.
No entanto por extraordinária coincidência, o Manel descobriu que tem um prato coberto exactamente com a mesma forma, mas com um motivo decorativo diferente. O dele é decorado em jeito de chinoiserie e no verso tem impressa a palavra Hong, sem dúvida o nome do motivo decorativo ou do serviço. Em suma, são duas decorações diferentes saídas da mesma fábrica. Aceitam-se palpites para quem terá fabricado estes dois pratos cobertos.
Já agora, para os mais novos, que são exclusivamente anglófonos e para os menos conhecedores do jargão de arte, chinoiserie é termo pelo qual se designa uma imitação ou evocação dos estilos chineses na arte ou na arquitectura ocidentais, em particular nos séculos XVIII e XIX

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Crucifixo

Comprei este crucifixo na feira-da-ladra por um preço muito em conta, a uma rapariga da minha idade, que curiosamente trabalhamos juntos na mesma Universidade. Vinte anos passaram e a vida deu-nos rumos distintos, ela tornou-se vendedora de velharias e uma das figuras características na feira-da-ladra e eu…enfim…tornei-me um funcionário qualquer. Em todo o caso, ela faz-me sempre bons preços e já lhe comprei umas quantas peças, entre as quais este crucifixo com uma bela peanha em talha dourada, o corpo numa madeira simples e uma aplicação em chumbo, toda rendilhada representando todos os elementos ligados à crucificação, como por exemplo, o escadote, os pregos, o galo, a Nossa Senhora da Conceição e por aí fora. Só lhe falta o Cristo propriamente dito. Quando a comprei sobrava apenas um bracinho, que não aproveitei.

Debaixo da orientação do Manel, que sabe muito de restauro, a aplicação em chumbo que estava preta e sem leitura foi limpa, a madeira foi desinfestada da bicharada com cuprinol, mantendo a peça envolta em película aderente durante uma semana. Tapei-lhe os buracos do bicho com cera e o dourado foi avivado com uma cera cor de ouro velho, que os douradores costumam usar para patinar a talha, que fica demasiado brilhante, depois da aplicação da folha de ouro. Eu teria avivado ainda mais o dourado, mas o Manel que não é tão barroco como eu, travou-me e talvez o resultado seja muito bom, pois mantém o ar envelhecido.

Embora a talha barroca sugira o século XVIII, julgo tratar-se mais duma peça do século XIX, que acusa o peso que o gosto do barroco exerceu durante tanto tempo nas artes e no gosto portugueses. Em todo o caso aquele rendilhado em chumbo dá-lhe um certo ar indo-português que me encanta.


Estes crucifixos faziam parte da chamada devoção doméstica. Eram colocados em oratórios, maquinetas ou pura e simplesmente numa mesa, coberta por um bonito pano ou pela inevitável renda (era necessário dar uso aos metros e metros de renda que sem parar as Senhoras faziam antigamente) e as pessoas deviam rezar piedosamente perante crucifixos, hábito estranho para a maioria de nós, que estamos cada vez mais descristianizados.

Como não tenho espaço em casa, o meu crucifixo foi posto na parede e é mais umas das dúzias de objectos, que traduzem o horror ao vazio que constitui a minha casa

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Vinhais: o regresso do passeio de Santo António


Gosto desta fotografia da minha mãe e dos seus irmãos, tirada nos finais dos 30. É uma daquelas fotografias, que volto sempre a contempla-la com prazer não sei exactamente porquê.

Talvez em primeiro lugar por ser um documento histórico, pois mostra um troço da estrada entre Vinhais e Bragança ainda em Macdame. Depois, o grupo familiar está enquadrado magnificamente por um conjunto de árvores majestosas, os Negrilhos, de que eu ainda me lembro de ver em pé nesse mesmo sítio. Nos anos 80, foram vítimas de uma doença, cortaram-nas e esta curva ficou nua e sem a graça. As suas folhas eram muito úteis e serviam para fazer a sopa dos porcos. Ao fundo, há uma casa de xisto muito bonita, coberta por uma argamassa castanha clara, que se usava muito na região.

O instantaneo, apresenta, da esquerda para a direita, a minha Tia Chica (a dos pasteis de massa tenra), depois uma senhora amiga da família que não conheço, a minha avô materna, a tia Maria Adelaide e depois o grupo das crianças. O que esconde a cara é o tio Zé Paulino, segue-se a minha mãe com as bonitas pernas longas, que a minha filha Carminho herdou, uma amiga dela com uma boneca,  a Maria Teresa Setas Campilho Lima Barreto e por último o meu tio Chico.

O instantâneo terá sido tirado no final dos anos 30, provavelmente no período em que a guerra civil decorria em Espanha e que fui vivido com sobressalto pelas povoações raianas portuguesas. Houve muitos casos de grupos armados dos “rojos” que passaram para o lado de cá, fizeram assaltos, amedrontando a população

A fotografia traz-me também uma certa nostalgia, pois o grupo regressa de um passeio que ainda era hábito fazer na família no final dos anos 70. Pelo final da tarde, aproveitando o fresco, ia-se a pé da casa de Souto Covo até à capela e miradouro de Sto. António, a cerca de uns 800 metros dali, por uma estrada que as árvores cobriam, conforme esta imagem mostra muito bem. A meio caminho havia sempre uma paragem na fonte de Sto. António, para beber uma água quase doce e sem sabor a desinfectantes e depois finalmente o miradouro de St. António, onde se contemplava uma paisagem de cortar a respiração, sobre montanhas e montanhas, dum verde anunciando o Norte da Europa. Fiz dúzias de vezes esse passeio. Hoje, essa estrada é uma espécie de via rápida e ninguém no seu perfeito juízo se aventura a percorre-la a pé, sem correr o perigo de vida e de aparecer num qualquer noticiário sensacionalista, desses em que está sempre tudo aos gritos.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Montalvões, Álvares, Ferreiras e as suas pedras de armas


Pedra de armas do Solar de Outeiro Seco


Como já expliquei algures neste blog, a genealogia e a heráldica nunca fizeram parte dos meus interesses ou gostos. Aquelas listas infinitas de nomes, acompanhadas das frases “nasceu, casou e morreu” sempre me entediaram de morte. As conversas entre amadores de genealogia são uma coisa de fugir e eu já assisti a muitas. Falam de parentes que casaram há 200 anos e enumeram, enumeram, enumeram nomes e mais nomes e tudo aquilo surge sem sentido ou objectivo. Ora eu gosto de história, desejo saber mais do que “sujeito nasceu, casou e morreu, ou pelo menos se não for possível conhecer mais do que isso, quero presumir como pensaram ou viveram homens e mulheres nos finais do século XIX ou em meados do século XVIII. Também é minha intenção perceber até que ponto os meus antepassados influenciaram a minha cultura e a minha forma de estar na vida.

Por esses motivos, tenho tentado reviver aqui velhas histórias de família, fugindo ao esquema da enumeração de nomes da genealogia.

A pobre heráldica levou por tabela da genealogia. Sempre a associei a essa gente chata, que perante uma assistência estupefacta conta que uma tia quatrisavô casou com uns Albergaria e que “nós” e os Sarmentos ainda somos primos por parte da Tia Manita”

Tenho presente que esta é uma visão exagerada e emocional, pois reconheço à genealogia e à heráldica grande valor auxiliar para a história e admiro o trabalho paciente nos arquivos paroquiais que os genealogistas levam a cabo.

Bem, tudo este arrazoado vem a propósito do brasão que está no Solar de Outeiro Seco, na fachada nobre da casa e de que eu nunca falei e a nossa pobre Isabel, já andava mortificada por causa deste silêncio. Ora a pedra de armas pura e simplesmente não é da família Montalvão. São as armas dos Álvares Ferreira que estão ali representadas. A razão deste facto, que parecerá estranho aos seguidores deste blog, é que o grosso das construções da casa terão sido levadas a cabo pela família Álvares Ferreira, a quem a casa pertencia há muito. Era uma família ligada à cavalaria, conforme se pode ver pelas lojas da casa, onde abundam manjedouras em pedra. Os Montalvões só aparecem nesta casa de Outeiro Seco, em 1746, por via do casamento de uma senhora , Antónia Maria de Montalvão Morais, com um ilustre varão dos Alvares Ferreira, o Miguel Álvares Ferreira. Portanto o brasão que está naquela casa, é anterior a este casamento, 1746, e talvez este nem sequer fosse o seu local original, pois este corpo da casa acusa já as modas de arquitectura da segunda metade do século XVIII ou até mesmo dos finais deste século.


Acerca do brasão dos Alvares Ferreira, repito o que J. T. Montalvão Machado diz na sua obra os Montalvões. Tem o escudo dividido em duas partes, que têm sido assim interpretadas: à esquerda, quatro faixas horizontais querem dizer Ferreiras; à direita, nove cruzes de Avis, dispostas em três linhas horizontais, significam Alvares.

Encima-o um animal, um Bácoro, provavelmente um javali. Pedi a este propósito a opinião ao Pedro Abreu Peixoto, um amigo meu entendido em Heráldica e confirmou tratar-se dum javali. O porco só aparece na heráldica institucional, nunca na familiar. Desde a Antiguidade Clássica à Idade Média, o javali foi sempre considerado como espécie cinegética de prestígio, especialmente os machos adultos, que eram vistos como o paradigma da coragem e bravura. Foi também um animal comum na heráldica medieval europeia. Foi símbolo pessoal do rei Ricardo III de Inglaterra e surge nos brasões de várias cidades.


Daqui se depreende, que um dia se quisermos estudar nos arquivos a construção do solar, teremos que remontar ao tempo dos Álvares Ferreira, para procurar informações no Arquivo Distrital de Vila Real ou em outra qualquer instituição que tenha a sua guarda arquivos pertinentes para a região em causa.

Antes de 1746, quando Antónia Maria de Montalvão Morais, casa com o Miguel Álvares Ferreira os Montalvões estão a uns escassos kms de Outeiro Seco, na aldeia de Vila Frade, encostada à vizinha Espanha, que é o seu berço de origem em Portugal. Creio aliás que ainda há por lá propriedades que pertencem à família.

Os Montalvões tinham aparecido em Portugal há 5 gerações atrás, no século XVII, quando um Joseph de Montalban, oriundo da Galiza, atravessou a linha imaginária que separava o reino de Espanha do de Portugal, para casar com uma senhora portuguesa, instalando-se em Vila Frade. Se hoje, apesar da castelhanização do galego, a diferença entre os galegos as gentes de Portugal a Norte do Douro é pequena, em pleno domínio filipino as pessoas de um e do outro lado da fronteira partilhavam praticamente mesma língua e costumes e muitas famílias espanholas vieram para Portugal nessa época.
Vila Frade. Portão de quinta da família Montalvão. Propriedade que confina com Espanha. Foto gentilmente roubada de http://chaves.blogs.sapo.pt/



O Joseph de Montalban casou então com uma senhora portuguesa, uma tal D. Maria Fernandes. Não se conhece a data do seu casamento, mas, sabe-se que em 1632 estavam já casados, pois constam como padrinhos de um livro de baptizados de uma criança nascida nessa data. Instalaram-se em Vila Frade e nessa povoação raiana, criaram os seus filhos e estes procriaram por sua vez e multiplicaram-se de modo que todas as pessoas em Portugal, que ostentam o nome Montalvão descendem deste casal primordial. A sua trisneta, a tal Antónia Maria de Montalvão Morais (1732-1808) de que já mencionamos vai para Outeiro Seco casar com o Miguel Álvares Ferreira e os seus descendentes acabarão por dar o nome desta antepassada ao solar .

Quanto à verdadeiro pedra de armas dos Montalvões, a única que se conhece, provem de perto de Vila Frade, mais exactamente de Vila Meã da Raia, local onde a família também tinha propriedades, mas que também andou por Outeiro Seco, sendo que por desavenças familiares, foi transportada de lá.




Transcrevo mais umas vez as palavras de J. T. Montalvão Machado

A casa onde viveu António Vicente, em Vila Meã da Raia, ostentava uma pedra de armas, que se encontra hoje em Carcavelos, subúrbios de Lisboa, na posse de D. Maria Alda Montalvão Santos e Silva (n° 327).

Essa pedra foi há anos interpretada pelo Sr. Coronel Afonso Dornelas, mestre de Heráldica, que dela disse:
No 1° quartel, um leão vermelho em fundo azul, atravessado por uma faixa contendo três flores de lis, quer dizer Montalvões. Este leão era frequente nas insígnias da fidalguia do noroeste das Espanhas e lembrava o esforço iniciador das gentes do Reino de Leão, na Reconquista e expulsão dos muçulmanos. (Lembramos a este respeito o esforço de Alonso de Montalban, na conquista do Reino de Granada, no tempo dos Reis Católicos, Fernando e Isabel, vide documentos da nossa prova n° 2).




No 2.° quartel, quatro faixas horizontais de ouro, em campo vermelho, significam Ferreiras.

O 3° quartel está dividido em pala: a parte esquerda contém duas espadas de prata, com punhos de ouro, e pode significar Ximenes; a segunda contém três flores de lis e traduz-se por Pessanhas.

O 4° quartel contém cinco conchas de ouro, que representam os Velhos.
Pelo que diz respeito aos quartéis 1° e 2.° nada temos a acrescentar à interpretação do Sr. Coronel Dornelas, porque vimos atrás, em n° 20 , a ligação de Montalvões com Ferreiras, em 1746.

Também não nos surpreende a existência de Velhos no 4° quartel, porque, como vimos, em n° 11, Francisco de Montalvão Coelho, casou, por 1700, com D. Luisa de Morais Castro, descendente de Martim Teixeira Velho.”


Relativamente ao 3º quartel, J. T. Montalvão Machado tem grandes dúvidas quanto à interpretação do Sr. Coronel Afonso Dornelas e não Crê que os referidos elementos possam representar os Ximenes e Pessanhas

A pedra tem por timbre o mesmo leão, dos Montalvões, que figura no 1° quartel.”

Neste momento não sei se quem são os actuais proprietários do Brasão dos Montalvões. Estarão aqui em Lisboa, mas não faço a menor ideia quem sejam. A minha avô Mimi deu-me um lenço com o brasão pintado por ela num lenço de seda, mas infelizmente perdi-o numa das mudanças de casa.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Mais sobre a faiança dos Ratinhos



Ratinho do meu amigo manel


É muito curioso observar nas estatísticas do blog, que os posts sobre a faiança Ratinho são muito consultados, além de que continuam a ser comentados com alguma periodicidade. Sem dúvida isso explica-se pela na ausência total de conteúdos, existente na net sobre esta faiança.

Como eu própio sentia necessidade de saber mais sobre o assunto, aproveitei a Feira do Livro e fui comprar António Capucho: retrato do homem através da colecção: cerâmica portuguesa do século XVI ao século XX. - Porto: Livraria Civilização Editora, 2004 e Cerâmica de Coimbra: do Século XVI – XX / de Alexandre Nobre Pais, João Coroado, António Pacheco. Lisboa: Edições Inapa, 2007, pois nas livrarias tem preços absolutamente proibitivos. Aliás não percebo esta mania portuguesa de levar o couro e o cabelo pelos livros de arte, pois assim ninguém os compra, ficam a apodrecer nos depósitos e ao fim de duas décadas queimam-nos ou vendem-nos a peso sem terem servido a função para a qual foram criados, ser lidos!

Mas o objectivo deste post não é dar lições de moral, mas antes tentar perceber mais alguma coisa sobre esta faiança de gente tão pobre e tão fascinante.

Segundo aprendi nestes manuais, a primeira pessoa a reparar e a valorizar esta louça na década de 80 do século XIX foi o historiador Joaquim de Vasconcelos.

Contudo, o primeiro grande coleccionador deste tipo de faiança será o poeta e escritor José Régio (1901 —1969), que deve ter arranjado pratos e pratos destes, quase dados, na região de Portalegre. Será secundado por António Capucho (n em 1918) e Júlio e Ruben A. A colecção de Ratinhos e faiança de António Capucho, pelas imagens quer pude ver no livro é uma coisa deslumbrante Em suma, devemos a todos estes senhores a valorização desta loiça, que anteriormente só era considerada boa para dar de comer as galinhas, como disse com muita graça o Carlos Pereira, um dos seguidores de blog. Hoje, graças a eles os Ratinhos estãon conservados em bons Museus ou são muito valorizados pelos antiquários e pelos coleccionadores de velharias.

o vidrado amarelado e com pouco brilho dos ratinhos



Em termos técnicos, segundo a Cerâmica de Coimbra: do Século XVI – XX / de Alexandre Nobre Pais, João Coroado, António Pacheco. Lisboa: Edições Inapa, 2007, os Ratinhos são rapidamente identificáveis, graças à sua pasta mais grosseira e ao seu vidrado amarelado e com pouco brilho, devido à menor percentagem de estanho incluída na mistura. A decoração era aplicada a esponja e a pincel, seguindo aliás o método típico dos pintores de louça de Coimbra. Segundo a mesma obra, houve ao longo do século XIX, o período em que a maioria dos ratinhos são datados, uma grande continuidade nas técnicas e na decoração.

Na mesma obra, escreve-se que os elementos zoomórficos (os animais), vegetalistas (plantas) e geométricos são os mais antigos. Seguem-se depois os que representam figuras populares, masculinas ou femininas, figuras fantásticas, caricaturas e retratos. O Prato que o Eduardo, seguidor deste blog me enviou pertence ao grupo das figuras femininas



O Ratinho pertencente ao Eduardo


Relativamente à herança islâmica e oriental destes pratos, a primeira pessoa a nota-la foi o Joaquim Vasconcelos, que escreveu é a única em Portugal que representa a tradição oriental e sobretudo, a influência de estudo árabe. Esta pintura, simulando penas e penachos de aves raras de plumagem aveludada deslumbrante de caudas de pavão, traçadas sobre um fundo formado por grandes fetos verdes, produz um efeito tão singular, que é impossível, confundi-la com a de qualquer outra região”

Prato com motivo zoomórfico da colecção António capucho

Comparem este Ratinho do século XIX da colecção de António Capucho com este prato do Museu de Mértola, do período da dominação dos mouros em Portugal, do Séc. XI,e digam-me lá se não há de facto qualquer coisa de comum entre eles?


Prato do Museu de Mértola


João Pedro Monteiro na página 64, da obra António Capucho: retrato do homem através da colecção: cerâmica portuguesa do século XVI ao século XX. - Porto: Livraria Civilização Editora, 2004 vai mais longe e afirma que algumas das peças como o prato da fotografia das linhas de baixo encontram uma filiação nas produções islâmicas de Iznik .

Prato da colecção de antónio Capucho com reminiscências da faiança de Iznik



No meu ver parece-me que a influência islâmica se nota mais nos pratos decorados com elementos zoomórficos (os animais), vegetalistas (plantas) e geométricos, até porque enfim, como toda gente sabe, a arte islâmica raramente representa o homem ou a mulher

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Vestes e objectos litúrgicos da capela de S. Rita do Solar dos Montalvões

A investigação policial e arqueológica do nosso amigo Humberto sobre a capela de S. Rita, do Solar dos Montalvões, que nós temos acompanhado em directo, aqui no blog, produziu mais resultados. Houve alguém que mostrou ao Humberto algumas vestes e objectos litúrgicos, que pertenceram à capela do Solar dos Montalvões e se encontram presentemente na sua casa, a salvo dos ratos. O Humberto foi autorizado a fotografar essas peças.

Tratam-se de duas casulas, uma estola e ainda um corporal, que estariam na capela, talvez guardados naquilo que me parecem ser dois armários, um de cada lado do retábulo.


É provável que tenham pertencido ao meu trisavô, o Padre Rodrigues Liberal Sampaio, muito embora o meio-irmão da minha trisavó, Francisco Luís Ferreira Montalvão (nº 222 do livro os Montalvões), também fosse padre e provavelmente terá oficiado na capela de Sta Rita, talvez com as mesmas vestes. Os dois terão aliás travado conhecimento, já que o Liberal Sampaio, foi amante da Maria do Espírito Santo, a meia-irmã do referido Francisco Luís (1830-1905). Contudo, esse meu tio trisavó morreu em 1905, em Fafe e pelo menos é certo que o Padre Rodrigues Liberal Sampaio (1846-1935) tenha sido a última pessoa a usar estas vestes. Isto é partindo do princípio que os mesmos religiosos podem usar as mesmas vestes e que estas estão afectas ao templo e não a às pessoas que as envergam


Seguindo a Wikipédia, a casula é uma veste litúrgica do rito católico que é frequentemente confeccionada em seda ou damasco, nos século XVII e XVIII, variando as cores conforme o rito litúrgico. A Casula Utiliza-se sobre a alva e a estola durante a celebração da missa.


A estola


Segundo a mesma Wikipedia, a variação das cores da Casula é a seguinte:

-O branco é usado na Páscoa, no Natal, nas Festas do Senhor, nas Festas de Nossa Senhora e dos Santos

-O Vermelho, que é a cor do sangue é usado para os mártires, sexta-feira da Paixão e Domingo de Ramos.

-O Verde usa-se nos domingos e dias da semana do Tempo Comum. Está ligado ao crescimento, à esperança. Será a cor mais comum

-O Roxo é usado no Advento e na Quaresma a par do violeta. É símbolo da penitência, da serenidade e de preparação, por lembrar a noite. Também pode ser usado nas missas dos defuntos e na celebração da penitência.

-O Rosa pode ser usado no 3º domingo do Advento e 4º domingo da Quaresma. Simboliza uma breve pausa, um certo alívio no rigor da penitência da Quaresma e na preparação do Advento

-O Dourado e Prateado usam-se nas solenidades ou celebrações importantes, substituindo a cor litúrgica do dia.


Ora eu não percebo nada de cores e não consigo dizer ao certo os tons dominantes destes dois trajes. Percebe-se nitidamente que a casula das ramagens com cravos será certamente usada para dias litúrgicos de maior solenidade, que a de damasco com a barra púrpura ou vermelha.

Aceitam-se opiniões sobre as categorias onde se encaixarão estes trajes, porque eu para cores…enfim. Se houver algum padre a ler estas linhas, também agradeço a sua ajuda


Por último, o Corporal que faz já da categoria dos objectos litúrgicos e é um Pano quadrangular de linho com uma cruz no centro e sobre ele é colocado o cálice, a patena e a âmbula para a consagração. Faz já parte da categoria dos objectos litúrgicos. Este está em muito mau estado, mas o damasco é bonito.



segunda-feira, 17 de maio de 2010

Como era interior da capela do Solar dos Montalvões: fotografias de interesse excepcional

como foi

A internet não nos deixa de surpreender pela enorme capacidade que tem de pôr gente que não se conhece de parte nenhuma a comunicar. Com a net, muitos voltaram a escrever cartas, em formato electrónico é certo, mas ainda assim fazendo renascer antiga arte epistolar e dando origens a variantes curiosas deste género, na forma de blogues e fóruns.

Naturalmente todos sabemos, que na maior parte dos casos a Internet é usada para engatar e escrever tontices, mas creio que neste blog se tem criado um espírito muito positivo de comunicação entre nós, com bons resultados. Uma das coisas mais extraordinárias que aqui se tem assistido é uma investigação em directo, de carácter policial, histórico e arqueológico acerca do antigo Solar dos Montalvões, em Outeiro Seco. Eu comecei por explorar e divulgar a compilação de dados acerca da família pacientemente feita pelo meu pai, ilustrando-a com fotografias actuais e antigas, usando sempre as plantas da casa levantadas no terreno pelo Manel e contando com os sólidos conhecimentos de arquitectura e arte deste último, os incentivos da Isabel e ainda do Altino, que me convidou para participar numa publicação sobre Outeiro Seco.


Como é


Depois apareceu o Humberto e qual Indiana Jones e revolucionou tudo. Descobriu o paradeiro dos santos da capela do Solar, que na família julgávamos perdidos, achou o retábulo do altar mor da referida capela na Casa da Cultura de Outeiro Seco e ainda localizou o antigo sino na igrejinha de N. Senhora do Rosário, cujas fotografias custaram-lhe uma subida a uma escada de seis metros.


Por último, O Humberto fez uma descoberta ainda mais aparatosa. Encontrou fotografias da capela de Sta Rita, do Solar dos Montalvões, no seu esplendor de barroco final, antes da sua destruição e pilhagem. Foram-lhe cedidas pelo Carlos Nepomuceno, um amigo seu e conterrâneo, cujos pais ainda vivem na casa mesmo em frente à Capela.

Quando abri o e-mail com estas fotografias experimentei a mesma sensação de maravilhamento, que aquela jornalista alemã, que acompanhava as obras do metro da cidade eterna, sentiu quando a máquina perfuradora pôs a descoberto os frescos de toda uma antiga vila romana. Esta cena do imortal filme Roma, de Felini traduz a realidade da construção do metropolitano de Roma, que como todos sabem, foi uma trapalhada, pois os empreiteiros tinham que estar sempre a interromper as obras e a desviar a linha, devidos aos constantes achados arqueológicos no subsolo romano.


Nessa mesma cena, os frescos há tanto tempo preservados numa câmara fechada, que representam um cortejo fúnebre onde está retratada toda uma família, que viveu há dois mil anos, desaparecem e desbotam-se em escassos minutos contaminados pelo oxigénio, enquanto a jovem jornalista grita inutilmente, pedindo que alguém faça alguma coisa para parar aquela destruição. Quando a cena termina as pinturas a fresco desapareceram para sempre

No final da leitura do e-mail do Humberto, perante a destruição irremediável que a capela de Sta Rita sofreu, senti uma tristeza idêntica à da rapariga alemã do filme, quando viu desaparecer perante si os frescos romanos

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Um feroz cão de guarda

Recordam-se daqueles azulejos que apanhei recentemente do lixo?

Pois bem, o azulejo com feroz mastim já encontrou o seu lugar na parede e vê-se logo, mal se abre a porta lá de casa. Talvez assuste um ou outro rato que por lá insiste em aparecer, apesar de um aparelho que já lá coloquei, daqueles que emitem sons desagradáveis para os roedores. Antigamente, tinha que os envenenar com trigo roxo, o que era sempre desagradável. Nunca tive muito feitio para Bórgia.

Lá fiz um roço na parede e coloquei-o com cimento cola. Contudo, pouco depois de o encastoar na parede, um dos leitores deste blog, o Alberto, especialista em restauro informou-me de um método estupendo para inserir os azulejos na parede, que permite retira-los sem os partir, caso se mude de casa. O segredo é usar uma argamassa, que mistura 4 partes de areia fina com 2 partes de cal hidráulica. Segundo o Alberto, esta argamassa sai com água e por isso podemos sempre voltar a tirar os velhos azulejos da parede, sem danifica-los.

Segundo me disse o Alberto, esta argamassa era abundantemente usada pelos romanos, que, como toda a gente sabe eram um povo de construtores civis, que faziam obras práticas e sólidas, feitas para durarem uma eternidade. Se era usada pelos romanos, então é certamente um material de confiança.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

O balcão alpendrado do Solar dos Montalvões

Há uns quatro anos ou cinco anos, quando voltei a visitar o Solar dos Montalvões, em Outeiro Seco, um dos sítios por onde tentamos entrar na casa foi por onde antigamente existia o jardim e um balcão alpendrado.
Penetrar no mato denso que ali se formou entretanto constituiu uma aventura. No entanto, fiquei quase comovido ao ver no meio dum silvedo uma hortênsia com uma grande flor azul, a lutar ainda pela vida. Fez-me recordar como foi aquele espaço há trinta anos atrás. Era formado por uma alameda, onde do lado da casa existiam hortênsias azuis e por um pequeno pátio, servido por uma bica, sempre com água a correr. Recordo-me bem da sensação frescura de lá meter a mão, pois claro, um garoto não resiste a brincar com água.

Segundo o meu pai, “todo o jardim era coberto por um dossel de videiras [bem visível na fotografia], que proporcionavam um espaço de sombra e frescura e ainda uma atmosfera de sombra verde. Havia encostado num dos muros do jardim, uma coluna de pedra trabalhada”. Ainda segundo o meu pai, esta coluna de pedra “deveria servir para uma das muitas obras que não foram completadas”.
Essa coluna foi hoje transferida para uma área, ajardinada junto à Igreja de Nossa senhora da Azinheira. Reproduzo aqui duas fotografias tiradas pelo nosso amigo Humberto.
Este jardim conduzia a uma escadaria em pedra, para onde se subia para um balcão alpendrado, mobilado com peças simples e rústicas. Uma delas, uma cadeira em tesoura ainda veio parar as minhas mãos, mas desfez-se em pedaços roída pelo caruncho, no tempo em que ainda vivia na Av. do Uruguai. As colunas do alpendre eram em granito e muito bonitas. Hoje, estão a partir-se pela pressão das raízes de uma hera.

Na primeira fotografia que aparece no post, encontram-se debaixo deste alpendre, a minha avô Mimi, o meu bisavô José Maria Ferreira Montalvão, uma menina, talvez a irmã do meu pai e ainda um fiel Piruças, de que a história não guardou registo. Nessa fotografia é Verão, conforme se pode ver pelas mangas curtas da minha avó e da menina. Com efeito, o jardim e este balcão eram zonas da casa muito frescas e procuradas por toda a família durante o Verão, que é uma estação muitíssimo quente em Outeiro Seco. Mesmo quando já só vivia uma velha criada perfeitamente só naquele velho casarão, na década de 70, continuavam-se a fazer reuniões familiares nestas duas áreas e é desse tempo que datam as minhas escassas memórias desta parte da casa.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

A escadaria do patio interior do Solar dos Montalvões

No álbum de fotografias do meu pai, descobri mais uma fotografia do pátio interior do Solar dos Montalvões em Outeiro Seco, datada da década de 30. Mostra o meu bisavô José Maria Ferreira Montalvão, o meu avô paterno Silvino da Cunha e a criança será a irmã do meu pai, Maria Helena que ainda está viva. Mas, talvez o melhor da fotografia, seja o pormenor com que se pode ver a voluta final da escadaria.
Na porta do topo da escadaria, está uma data, 1782, que conforme eu referi no post 23 de Outubro de 2009 deve referir-se à data de construção da escadaria. Tal como o sino, esta obra terá sido feita no tempo Antónia Maria de Montalvão Morais (1732-1809)(n.20 do livro Os Montalvões), que na altura já se encontrava viúva do seu marido, Miguel Alvares Ferreira, falecido em 1779, ou talvez ainda por algum dos seus filhos mais velhos.

Segundo J. T. Montalvão afirma na sua obra, Os Montalvões, terá sido o sogro desta Senhora, o Capitão José Alvares Ferreira o principal construtor da casa, ou conforme interpreto eu, foi o responsável pela fachada nobre do edifício, que dá para o lado sul. O único brazão da casa, que se encontra nessa fachada é dos Álvares Ferreira. Os Montalvões aparecem nesta casa por via do casamento em 1746 desta Senhora, Antónia Maria de Montalvão Morais com Miguel Alvares Ferreira, filho do tal capitão de cavalos, José Alvares Ferreira. A Antónia Maria morava ali numa povoação ao lado, Vila de Frade, os dois pertenciam mais ou menos ao mesmo meio, fidalguia rural e o casamento entre os dois deve ter sido combinado espontaneamente entre os pais. A pequena Antónia Maria casou com 14 anos, acto que hoje seria considerado pura pedofilia, mas na época era comum casarem as raparigas um ou dois anos depois da primeira menstruação.

Todos os descendentes deste matrimónio, inclusive eu, deviam chamar-se Álvares Ferreira, em vez de Montalvão, mas na época, em que aquele casal viveu e gerou os seus filhos, pelo menos na zona de Chaves, transmitia-se o nome à espanhola, isto é, o nome ou nomes do pai eram colocados logo a seguir ao nome próprio. Mais tarde, julgo eu, que já no início do Século XIX, passaram a usar a regra portuguesa, em que o último nome é o principal e os meus antepassados passaram aos filhos Montalvão, o nome feminino, que já estava tão a jeito colocado no final, em vez de Álvares Ferreira.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Dia da Mãe


Há pouco tempo foi o dia da Mãe. Nem me lembro da data, pois estão sempre a muda-la consoante as estratégias das grandes superfícies, para nos coagirem a gastar mais dinheiro. Não fui visitar a minha Mãe. Há pessoas que morrem rapidamente, outras demoram muito tempo a partir e a minha Mãe é dessas que começou há muito a desapegar-se da vida, em virtude de uma doença prolongada. Já não sabe o que é o dia da mãe.

Coloco aqui uma fotografia da sua juventude, em Vinhais, daquelas imagens do esplendor da juventude com as quais gostamos de ser recordados para sempre, se é que “sempre” é possível, pois raramente sabemos muito mais sobre os nossos antepassados para além dos avós. Depois disso, o esquecimento leva tudo. As velhas cartas são rasgadas, deixa-se de saber quem são as pessoas representadas nas fotografias e num ápice apaga-se a memória de toda uma vida complexa. Ficam apenas os registos da conservatória. Fulano ou fulana de tal nasceu, casou, teve filhos e morreu.

Neste blog tenho sempre perseguido a memória. Deve ser talvez uma forma de esquecer que a morte existe e está próxima.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Chávenas inglesas do século XIX de Staffordshire

Tenho estas duas chávenas antigas, que nem sequer tem o pires. Uma delas tem a asa partida. Mas, encontro-lhes tanta graça. A bordadura é feita em folhas de parras e o fundo decorado com cachos de uvas e parras. A paisagem com um lago, cisnes, uma fonte e um palácio ao fundo era um motivo muito típico da faiança inglesa do século XIX. Já encontrei não sei quantas peças parecidas com decorações semelhantes nos sites de antiguidades americanos e ingleses, que dispõem de vastas colecções de faiança inglesa, mas nunca vi nenhuma igual a estas chávenas. Não estão marcadas. Só apresentam um 12, que deve representar o número do padrão ou o diâmetro da peça. Esta loiça com paisagens ou países como ficaram conhecidas em Portugal reflectia o gosto pelas viagens que os ingleses tinham, pois foram os primeiros europeus a fazerem turismo (o célebre grand tour) e alguns destes pratos eram como que postais ilustrados de cidades italianas, paisagens no Reno ou vistas do Bósforo. No entanto, creio que esta paisagem das minhas chávenas é imaginada, não corresponde à nenhuma realidade, mas antes ao conceito que se estipulava na altura do que era bonita paisagem, isto é qualquer coisa romântica com um lago, ruínas, palácios, cisnes e pares enamorados numa gôndola ou em contemplação, junto à margem.

Julgo que são de fabrico inglês, provavelmente da região de Staffordshire, onde estava concentrada a maioria das indústrias de faiança britânicas, que invadiram com os seus produtos a Europa e o mundo logo a partir do início do século XIX. Mas foram tantas as fábricas que laboraram nesta zona e nesta época, que a minha constatação equivale a dizer que a agulha que eu procuro está arrumada no palheiro.


A região inglesa de Staffordshire



No entanto, também já me lembrei que poderiam ser um fabrico antigo de Sacavém, já que esta fábrica com os seus patrões ingleses seguiu tão de perto as modas da velha Albion