Há uns meses fui contactado pela Câmara Municipal de Vinhais, pedindo-me autorização para usarem cópia de uma fotografia antiga, provavelmente tirada entre os anos de 1861 e 1888, mostrando a minha bisavó no recolhimento da Mofreita. A imagem destinava-se a uma exposição sobre os 500 anos do segundo foral de Vinhais e acedi com todo o gosto.
Um medalhão usado pelas Oblatas. Propriedade do Roberto Afonso |
Mais tarde, a mesma pessoa que me contactou da Câmara Municipal de Vinhais, o Roberto Afonso enviou-me por e-mail duas imagens de dois medalhões, que pertenceram ao Recolhimento das Oblatas do Menino Jesus da Mofreita. Quando tive ocasião de o conhecer pessoalmente, perguntei-lhe como é que ele sabia que os medalhões provinham da Mofreita e o Roberto Afonso respondeu-me chamando-me a atenção para três aspectos muito curiosos.
Outro medalhão usado pelas Oblatas, Um menino Jesus feito em cera e um trabalho semelhante aos registos ou verónicas. Propriedade do Roberto Afonso |
1- Em primeiro lugar, ampliando a fotografia, que eu lhe enviei, observa-se que todas as recolhidas ostentam um medalhão oval ao peito.
2 - O Roberto Afonso forneceu-me ainda fotocópias da obra O recolhimento da Mofreita e o espírito das ordens religiosas. – Lisboa: Imprensa de Lucas Evangelista, 1892, O autor, Ferreira Deusdado, que visitou o Recolhimento no último quartel do século XIX, confirma que as oblatas traziam um hábito roxo, cordão verde, Menino Jesus pendente de n’uma relíquia
3- Ainda segundo o Roberto Afonso as pessoas mais velhas da Aldeia da Mofreita lembram-se ainda de ouvir os seus pais falar nas irmãs oblatas com os seus medalhões ao pescoço. Aliás, o medalhão mais antigo foi dado aos avós do Roberto Afonso por uma senhora idosa da aldeia, como sendo proveniente do Recolhimento e algo muito valioso, uma espécie de talismã. Ao que parece, quando um porco estava doente, aproximavam-lhe a dita relíquia e o suíno curava-se imediatamente.
O medalhão com o Agnus Dei em cera |
É aliás muito curioso que as propriedades atribuídas pelas pessoas das aldeias vizinhas da Mofreita a estes medalhões com os meninos Jesus em cera sejam semelhante às das medalhas com os agnus dei (cordeiro de Deus), feitos com a cera derretida das velas das igrejas da cidade de Roma. A devoção aos medalhões com cordeiros místicos, feitas com a cera das igrejas da cidade eterna afastaria os espíritos maus, as tempestades, trovões, raios e granizos e ainda as pestilências e sabe-se lá que mais. A minha avó materna quando trovejava colocava um destes medalhões na varanda. Não sei se era este que aqui apresento ou outro qualquer, mas em 1887 a minha bisavó, Maria da Graça Pires, ainda estaria nas Oblatas.
O verso do mesmo medalhão. Em 1887 a minha bisavó, Maria da Graça (2-3-1854 a 11-10-1943) ainda estaria nas Oblatas. Este ou um destes medalhões era usado pela minha avó contra as trovoadas |
Penso até que talvez estes meninos Jesus em cera fossem também feitos com restos das velas de Igrejas e por essa razão eram considerados também uma espécie de relíquias, pois é com este termo que a tradição popular e Ferreira Deusdado os referem.
Só tenho a agradecer ao Roberto Afonso, Vereador da Cultura da Câmara Municipal de Vinhais, a relação que estabeleceu entre a fotografia de grupo das oblatas onde está a minha bisavó e estes medalhões. Certamente a minha bisavó usou um destes objectos. Fiquei também impressionado com a curiosidade do Roberto pelo passado e o seu gosto por juntar as peças deste puzzle que é a memória dos nossos antepassados.