Não me recordo se tinha prometido à Maria Isabel escrever sobre instrumentos do Neolítico ou se sido a nossa seguidora a pedir-me para falar nestas pedras polidas. Em todo o caso, como sei que a Maria Isabel gosta de pedras, este post é-lhe dedicado, um pouco à maneira, daquele célebre programa de rádio em que se telefonava a pedir discos.
O que vemos aqui nestas fotografias é pois um machado neolítico, um instrumento produzido, mais ou menos à volta de seis ou quatro mil anos antes de Cristo, na região de Chaves.
Neolítico quer dizer, nova pedra, isto é, o período em que há uma nova técnica de trabalhar a pedra, o polimento, em oposição ao período anterior, o Paleolítico (Pedra Antiga), em que a pedra era lascada.
De facto, neste machado podemos observar um perfeitíssimo trabalho de polimento característico do Neolítico, em que os artificies conseguiram um gume, que apesar de não ser usado há seis mil anos, continua afiado. Nota-se também uma pequena depressão de lado, que correspondia ao local onde era fixo o cabo.

Para os menos entendidos de história, o Neolítico caracteriza-se pela descoberta da agricultura e da pastorícia. O Homem deixa de ser apenas caçador e recolector e passa a produtor. No fundo, o ser humano descobre como se processa sexualidade dos animais e a reprodução das plantas e passa a intervir, manipular e a alterar esses processos.

Este machado, que sobreviveu seis mil anos às agressões do tempo, tem uma história recente curiosa. Fez parte do chamado museu do Solar de Outeiro Seco. José Rodrigues Liberal Sampaio, o meu trisavô recolhia, sem grande critério e um pouco por toda a parte peças arqueológicas. Tinha o espírito coleccionista da época, que consistia em recolher peças dum passado remoto, sem assinalar a sua proveniência, ou localização na jazida. Enfim, fazia o que podia numa época em que os seus conterrâneos ignoravam completamente o valor da pré-história. E é curioso, porque se tornou conhecido na região por esse seu estranho amor a pedras e moedas velhas. Já apanhei umas quantas cartas dirigidas a ele, em que um lhe promete enviar uma moeda do tempo de D. Miguel ou uma outra, como esta que reproduzo parcialmente, que lhe envia pelo Manel, “essa pedrinha, por me lembrar, que lhe darão algum apreço para o Museu”. Exemplificativa do coleccionismo do meu trisavô, esta carta foi escrita em 13 de Abril de 1924, por uma tal Senhora Custódia Florinda Fidalgo.

Depois disso, o machado foi-me dado pela minha avó Mimi e usei-o muito, na juventude, quando dei aulas no secundário, para exemplificar aos miúdos o Neolítico. Depois do meu divórcio, ficou em casa da minha ex-mulher, mas fui busca-lo há uns dias. Sentia-lhe a falta.