O Manuel continua a deixar-me explorar a sua pequena colecção de gravuras e desta vez decidi-me aqui trazer esta estampa, representando um parque frondoso, cheio de damas e cavalheiros britânicos, que com os seus cavalos e atrelagens estão prestes a participar em qualquer acontecimento mundano, por volta dos anos cinquenta do século XIX.
Procurei descobrir que sítio é este onde se desenrola esta cena e parti para o Google, usando os termos da legenda para a pesquisa. Constatei que a estampa foi retirada de um livro como é habitual, mais propriamente do quarto volume da A topographical history of Surrey, editada em Londres, pela G. Willis, em 1850.
Uma das ilustrações da A topographical history of Surrey |
A obra é uma impressão cuidadosa e muito bem ilustrada, que descreve a história e os monumentos da região inglesa do Surrey e é tão bonita que é difícil escolher qual das suas estampas é mais minuciosa. Percorri toda a versão on-line e encontrei a página de onde foi cortada esta gravura. Está impressa a preto e branco e portanto esta versão do Manel terá sido colorida posteriormente.
A ilustração do topo mostra a Nonsuch Mansion, que ainda hoje existe, ao contrário do Palácio do qual pediu emprestado o nome |
A cena desenrola-se à entrada da Nonsuch Mansion, um palácio construído no início do XVIII e remodelado em 1802-6, segundo o gosto de um gótico final. Estava situado no parque de um castelo ainda mais célebre, o Nonsuch Palace, uma loucura arquitectónica mandada erguer por Henrique VIII, o monarca das não sei-quantas-mulheres e que custou fortunas. De tal forma os custos e a arquitectura foram extravagantes, que o edifício tomou o nome de Nonsuch, que quer dizer mais ou menos sem paralelo ou incomparável. O castelo permaneceu nas mãos reais até ao reinado de Carlos II, o marido infiel da nossa Catarina de Bragança e que o deu à sua amante a condessa de Castlemaine, em 1670. Esta Senhora que devia ser muito virtuosa vendeu o castelo pedra a pedra para pagar dívidas de jogo e no momento em que na gravura do Manel aquele grupo galante é retratado, já nada restava da construção sumptuosa de Henrique VIII.
Na verdade, as senhoras e senhores elegantes da estampa do Manel dirigem-se para a corrida de cavalos de Epsom, ali nas redondezas, um acontecimento mundano a que assiste o crème de la crème da sociedade inglesa. São de tal maneiras elegantes, que uns 60 anos mais tarde, mais precisamente em 1913, o próprio Rei Jorge V nelas participa, ocasião que será aproveitada por uma certa sufragista Emily Davison, para se lançar aos pés do cavalo real e chamar a atenção sobre o direito de voto, que era negado às mulheres. Morreu espezinhada e ninguém sabe se pretendia matar-se ou só deter o cavalo do rei, o que certo é que conseguiu uma publicidade tremenda para o movimento sufragista e em 1921, a Inglaterra concedeu finalmente o voto às mulheres.
A morte de Emily Davison |