Em dois posts anteriores abordei a história do brasão da família Montalvão. Expliquei que a pedra de armas que se encontra no solar dos Montalvões, em Outeiro Seco reporta-se à família Álvares Ferreira, os proprietários originais do solar. Esse brasão terá sido mandado executar antes do casamento de Miguel Alvares Ferreira e Antónia Maria de Montalvão Morais, em 1746, ano que marca a entrada dos Montalvões naquela casa.
O Brasão dos Álvares Ferreira no Solar dos Montalvões |
Existe um brasão dos Montalvões propriamente dito, que eu reproduzi no meu post e que expliquei o significado heráldico. Contudo, fiz essa descrição a partir de uma fotografia péssima, extraída do Boletim Outeiro Seco: passado e Presente, nº 1. 1990, que por sua vez já era uma má reprodução da imagem da obra, o capitão de Vila Frade, de Montalvão Machado.
O brasão dos Montalvões na única reprodução disponível |
Esse Brasão tinha sido levado de Outeiro Seco em datá incerta, talvez na primeira metade do século XX, por uma Senhora, Maria Alda Montalvão Santos Silva, para o jardim da sua casa de Carvavelos, presumivelmente depois de 1908 e esta era a última notícia que se tinha dele. O paradeiro do brasão era mais ou menos desconhecido.
Há uns três meses, numa reunião profissional, conheci um rapaz, o Gastão de Brito e Silva, que alimenta um blog muito interessante inteiramento dedicado a casas, edifícios e monumentos em ruínas, http://ruinarte.blogspot.com/ e que quando ouviu o meu apelido, Montalvão, ficou de antenas imediatamente levantadas, porque há muito tempo que tem o desejo de fotografar as ruínas do Solar. Mostrei-lhe o blog, conversámos e descobri por mero caso, que ele conhecia o paradeiro actual do brasão, que está em casa do pai de um amigo dele em Carcavelos. O mais incrível disto tudo é que eu conhecia pessoalmente o pai desse amigo dele, meu primo afastado, tinha estado recentemente com ele em casa de um amigo comum, mas nunca me passou pela cabeça que fosse descendente da tal Sra. D. Maria Alda, nem o proprietário actual do Brasão.
As sumptuosas decorações |
Telefonei-lhe, fui fotografar o brasão e encontrei uma peça esmagadora, feita num único bloco de granito, com quase dois palmos de espessura e praticamente 1 m por 1,5m. As reproduções que eu tinha dele não lhe faziam de todo justiça, pois não mostravam as decorações lavradas à volta do escudo, que são sumptuosas. Contudo, nas suas deslocações pelo país inteiro, o Brasão perdeu o elmo, o que foi uma pena, porque seria uma peça ainda mais imponente.
Os meus primos colocarão a hipótese de esta pedra ser do século XVII, talvez em virtude do seu estilo pesado. Porém, é obrigatoriamente posterior a 1746, ano do casamento de Miguel Alvares Ferreira e Antónia Maria de Montalvão Morais, pois apresenta as armas combinadas das duas famílias. O Leão com as flores de Liz dos Montalvões e as quatro faixas horizontais dos Ferreiras.
O leão com as folhas de Liz da família Montalvão |
As 4 faixas dos Ferreiras |
Não sabemos para que casa este brasão foi concebido. Sabemos através da obra o Capitão de Vila Frade, de Montalvão Machado, que esteve numa habitação pertencente à família em Vila Meã, propriedade da família.
Nessa casa viveu António Vicente Ferreira Montalvão(1776-1838). Com o nº 31 da árvore genealógica da família, este senhor era o filho benjamim daquele celebre matrimónio entre o Capitão de Cavalos Álvares Ferreira, proprietário de Outeiro Seco e a Antónia Maria Maria de Montalvão Morais. Era padre morreu, sem deixar descendente. A casa foi doada ao seu sobrinho, António Vicente, filho do irmão João Manuel e os seus descendentes, os Montalvões Machados mantiveram a casa até há bem pouco tempo.
A Casa dos Montalvões em Vila Meã |
A pedra de armas da casa de Vila Meã terá tido outro destino, pois foi parar às mãos dos descendentes do outro irmão, o Miguel José, meu quinto avô. Este Miguel José teve 3 filhos, mas para esta história só interessam dois. O João Manuel (1806-1860), de quem eu descendo e a Rita Maria, uma senhora que casou duas vezes e se tornou famosa no seu tempo, como uma mulher enérgica, que geria directamente as suas extensas propriedades agrícolas e que é trisavô do meu primo. Terá sido ela a ficar com o brasão. A Rita Maria teve uma filha, Amélia, que casou com o general Celestino da Silva, o célebre governador de Timor e que foi companheiro de armas do rei D. Carlos e desse casamento nasceu a Alda, avó do meu primo e voltamos novamente a ouvir falar do Brasão.
O Brasão estava até 1940, numa casa grande em Outeiro Seco, propriedade desta Senhora, que não era o Solar propriamente dito. Nessa década, a Sra. D. Alda Montalvão Santos Silva, vendeu essa casa de Outeiro Seco e instalou o brasão no jardim da sua casa de Veraneio em Carcavelos, a Vila Alda. Aí esteve a referida pedra, até 1974, ano em que a casa foi vendida e posteriormente demolida, para dar lugar a um empreendimento qualquer, dessas coisas, que os portugueses adoram fazer para estragar sítios bonitos. O meu primo que a recebeu em herança levou-a para outra moradia em Carcavelos, mas o enorme bloco de granito não parou por aí e neste momento repousa num apartamento em Carcavelos, onde foi necessário interromper o trânsito na rua, para a fazer entrar pela varanda e demolir paredes para a instalar na sala.
A família andou com esta pedra de Herodes para Pilatos, o que em, termos de conservação foi-lhe prejudicial, mas comprendo perfeitamente que nunca se tenham querido separar-se dela, deixando-a numa das muitas casas por onde andaram ao longo de dois séculos. O enorme bloco de granito tem uma força e uma poesia extraordinárias.