Talvez a psicologia encontre uma justificação racional para este meu gosto de comprar objectos insólitos dos quais desconheço a utilidade. Pessoalmente tenho dificuldade em explicar esta atracção por ferragachos, que encontro no chão das feiras. Talvez porque aparecem descontextualizados, estes objectos pareçam mais misteriosos e consequentemente mais valiosos do que aquilo que realmente são.
Foi certamente o que aconteceu com a peça de ferro que mostro hoje. É bonita, tem uns restos de pintura dourada, mas não sei de onde veio, nem para o que servia. Suspeito, que talvez fizesse parte de um antigo portão ou da estrutura de uma varanda de ferro forjado. Também não excluo a hipótese de ser um elemento decorativo de uma velha cama de ferro.
Olhando, para o reverso e para os pregos grosseiros que prendem a chapa decorada à base, percebo que é definitivamente antiga. Mais de 100 anos terá de certeza. Suspeito, que será coisa do século XIX, feita ao gosto neo-renascença, estilo que surgiu em França por volta de 1830-1848 e que perdurou por todo o século e prolongou-se ainda pelo século XX fora. Aliás, as casas de velharias estão cheias de conjuntos de salas de jantar, compostos por aparadores, louceiros, trinchantes, mesas e cadeiras construídas neste estilo.
Sala de jantar em estilo neo-renascença no Palácio Nacional da Ajuda |
Claro, não são peças tão boas como as da sala de jantar do Palácio da Ajuda aquelas que encontramos nas lojas e feiras das velharias, mas em todo o caso, a renascença foi para muitas famílias da burguesia o estilo preferido para o mobiliário de sala de jantar.
Quanto a esta minha peça, apresenta todas as características deste estilo, o mascarão, os enrolamentos e os brotescos. Não é uma verdadeira antiguidade, mas a ignorância que tenho da sua função original empresta um certo ar de mistério a este ferragacho, que decora a entrada da cozinha.