domingo, 30 de abril de 2023

Um cavalheiro elegante e umas antigas histórias camilianas



Recentemente, a minha prima Ana Paula fez a gentileza de me oferecer mais uma resma de fotografias antigas. Entre eles, estava o retrato de um homem distinto, tirado há cerca de 110 anos, que me chamou de imediato a atenção. É uma daquelas imagens, que nos faz pensar que a verdadeira elegância é intemporal. Recordou-me até o retrato do Dr. Pozzi, que John Singer Sargent pintou 1881 e serviu de mote para o belíssimo livro de Julian Barnes O Homem do Casaco Vermelho. Mas afinal quem foi este belo homem da fotografia?

Retrato do Dr. Pozzi, John Singer Sargent ,1881 


A indumentária é a de um juiz, mas a dedicatória escrita sobre a fotografia é pouco legível. No lado direito, apercebi-me que o seu apelido era Machado, mas o nome próprio poderia ser João ou Júlio. No lado esquerdo, li que o retrato foi dedicado ao meu amigo Montalvão e que a data terá sido em 1919. Consegui ainda perceber que a fotografia foi tirada na Ilha do Pico, nos Açores. Suspeitei que este homem bonito e distinto fosse um dos membros da família Montalvão Machado e com efeito com meia dúzia de pesquisas no google conclui que só poderia ser Júlio Augusto de Montalvão Machado (1888-1968), formado em Direito e que em 1918 entrou para a carreira judicial como estagiário do Ministério Público em Peniche, exercendo funções como delegado nos Açores e só passando posteriormente para as terras transmontanas. Em suma, este retrato foi tirado no início da sua carreira, quando passou pelos Açores, nomeadamente na Ilha do Pico e dedicado ao meu bisavô, José Maria Ferreira Montalvão.

A fotografia foi dedicada ao meu bisavô, José Maria Ferreira Montalvão


Além da sua carreira judicial, Júlio Augusto de Montalvão Machado dedicou-se à literatura, de feição regionalista, escrevendo algumas obras sobre a história das famílias da zona e foi também um republicano e um democrata activo, que se empenhou na campanha de Humberto Delgado. Em Chaves, Júlio Augusto de Montalvão Machado é ainda recordado pela sua postura de republicano de velha cepa, apesar do seu aspecto aristocrático, realçado pela barba e pela badine. O irmão, José Timóteo Montalvão Machado (1892-1985) licenciado em medicina, foi também um homem de letras e publicou em 1948 a genealogia da família, Os Montalvões.

António Vicente Ferreira Montalvão (1809-1894) 


Numa das suas obras, O capitão de vila Frade: esboço biográfico, 1956, Júlio Augusto de Montalvão Machado contou a história do seu avô, António Vicente Ferreira Montalvão (1809-1894) e dos seus pais. O livro é um retrato dos usos e costumes das famílias fidalgas no século XIX nas terras transmontanas e vai referindo aqui e acolá alguns membros do meu ramo familiar.

Este António Vicente Ferreira Montalvão (1809-1894) era neto de Miguel Álvares Ferreira e de Antónia Maria de Montalvão Morais, esse matrimónio primordial, realizado em 1746, que marca o momento em família Montalvão, de Vila Frade, estende um dos seus ramos a Outeiro Seco. António Vicente era primo direito do meu quarto avô, o João Manuel Ferreira Montalvão (1806-1851) e no tempo dos acontecimentos, que descreverei estes dois ramos familiares eram ainda muito próximos.

Em 1746, Antónia Maria de Montalvão Morais casou com Miguel Álvares Ferreira, e o solar de Outeiro Seco passou a estar ligado ao nome Montalvão

António Vicente foi um absolutista convicto, durante a guerra civil lutou ao lado de D. Miguel e depois do final do conflito, em 1834, naquelas muitas revoltas que houve até 1854, em que reapareciam os miguelistas, este fidalgo esteve quase sempre na linha da frente. Durante esses tempos, exerceu também cargos públicos na gestão do município de Chaves. Mas a partir da Regeneração, já na casa dos 50 anos, este homem conhecido pelo Capitão de Via Frade acalmou-se e dedicou-se ao governo da sua vasta casa agrícola, que se estendia por várias aldeias da Galiza, dos concelhos de Chaves, Valpaços e Mirandela e tornou-se uma figura quase lendária, acerca do qual correm muitas histórias. Não deixava que se cortassem árvores e nas suas terras, fossem galinhas ou cavalos, os animais não eram presos e corriam livremente. Como velho senhor feudal, julgava também pequenas disputas nas suas terras. Claro, as penas dos condenados eram leves, mas significativas no meio aldeão, como por exemplo entregar quatro cruzados e dois pintos à igreja local e saírem com hábitos de penitentes na primeira procissão da Senhora da Expectação

O rústico solar de Vila Frade

Este velho Miguelista era um solteirão inveterado, que entregava o governo doméstico das suas casas a senhoras de boas famílias, ainda eram parentes, mas que tinham permanecido solteiras. Até que por volta de 1860, foi chamada outra senhora, a D. Umbelina Rosa, também de famílias honestas, mas sem dinheiro e qualquer coisa que ultrapassou a amizade aconteceu entre os dois e nasceu em 1860 uma criança, a Maria Umbelina. Cheio de curiosidade, entrei no portal do Arquivo Distrital de Vila Real, para ler o assento de baptismo da pequena Maria Umbelina., do qual transcrevo uma parte.

O assento de Baptismo de Maria Umbelina

A 13 de Junho de 1860 foi baptizada na Igreja Paroquial de S. Vicente de Barreiros, Concelho de Valpaços, Diocese de Bragança, Maria Umbelina, que nasceu às 11 horas da noite de 7 de Junho de 1860, fila ilegítima de Umbelina Rosa. Teve a criança nos Louços, segundo me disse Maria Lomba, casada com Pedro Martinho, deste lugar, a quem a criança foi entregue para ser criada. Foi padrinho, João Rita, casado com Carnulina Rosa e Maria do Carmo, casada com José Lomba.

Nota ao lado, a mãe desta criança é natural de Alpande, freguesia de Erboins, [ Ervões], actualmente do concelho de Valpaços.

Assinada Padre Luís Manuel Pereira.

Portanto a Maria Umbelina era filha natural e foi entregue a alguém de confiança, para ser criada discretamente, para não dar origem a muito falatório, pelo menos nos primeiros tempos, como era costume da época. Mas Júlio Augusto de Montalvão Machado na sua obra, O capitão de vila Frade: esboço biográfico, dá-nos conta que rapidamente o velho António Vicente Ferreira Montalvão foi buscar a sua filha natural e educou-a junto a si, com todos os desvelos, como a morgadinha de Vila Frade. A menina foi educada, aprendeu a ler e escrever em casa com a Dona Teresa Montalvão, uma das tais parentes, que faziam o governo doméstico da casa e deslocava-se até a Chaves, para aprender bordados, culinária e até francês. Muito embora o Capitão de Vila Frade não visse com bons olhos as lições de francês, com receio que pudessem trazer mascarados alguns ensinamentos de tratante Jacobinismo. Quando adolescente, a menina frequentava o Salão da Assembléia Civilizadora, que mais tarde veio a ser a Sociedade flaviense e convivia com as melhores famílias de Chaves.

Tudo corria pelo melhor até que em Vila Frade, pequena aldeia do Concelho de Chaves, na fronteira com a Galiza, onde vivia esta gente, apareceu um jovem oficial, o alferes António Augusto de Sousa Machado, que tinha vindo vigiar a fronteira, em virtude de uma ameaça de peste bubónica, vinda de Espanha. O jovem oficial e a Umbelina enamoram-se, mas o velho miguelista António Vicente Ferreira Montalvão não queria ouvir falar de tal namoro, já que o Alferes Sousa Machado era um liberal. Aconteceu o inevitável e com a cumplicidade da mãe, a Maria Umbelina e o António Augusto de Sousa Machado fugiram para se casarem. Assim a 31 de Janeiro de 1887, na Igreja de São João Baptista de Capeludos, Concelho de Vila Pouca de Aguiar, casaram António Augusto de Sousa Machado e Dona Maria Umbelina Ferreira Montalvão, ele 26 anos, alferes de cavalaria, filho legitimo de António de Sousa Machado e Dona Clementina de Sousa Machado desta freguesia e ela de 26 anos, solteira, natural da freguesia de S. Vicente de Barreiros, Bragança, onde foi baptizada, residente na freguesia de Lamadarcos, filha natural de Umbelina Rosa.

O assento de casamento 


É curioso observar, que a jovem Maria Umbelina usava o nome do pai, Ferreira Montalvão, embora constasse apenas com filha natural de Umbelina Rosa. O pároco usa também o Dona, antes do seu nome, tratamento que nos registos paroquiais é só reservado às senhoras de condição elevada.

O velho Capitão de Vila Frade ficou irremediavelmente zangado com a filha e só se reconciliou com a Maria Umbelina por intervenção dos Morais Sarmento, de Sto. Estevão, depois do nascimento do neto em 1888, precisamente o Júlio, que mais tarde, veio a ser o elegante cavalheiro do retrato apresentado logo no início. É também interessante, ler o assento paroquial Júlio Augusto, que nasceu às seis da tarde, de 27 de Setembro de 1888, filho legítimo António Augusto de Sousa Machado (…) e de Dona Maria Montalvão Sousa Machado, natural de S. Vicente de Barreiros, Valpaços e neto materno de António Vicente Ferreira Montalvão, de Vila Frade, e de Umbelina Rosa, freguesia de Ervões, Valpaços. Quando nasceu o pequeno Júlio, a bastardia da Maria Umbelina foi omitida e o António Vicente Ferreira Montalvão consta inequivocamente como avô materno.


A minha trisavó, Maria do Espírito Santo Ferreira Montalvão era afilhada de António Vicente Ferreira Montalvão


O capitão de Vila Frade tinha boas relações com o meu ramo familiar. Era padrinho da minha trisavó, a Maria do Espírito Santo Ferreira Montalvão e deve ter gostado sempre desta afilhada, apesar de ela se ter envolvido com um padre e dele ter tido dois filhos. Em 1888, a Maria do Espírito Santo foi envolvida num caso de contrabando, quando alguém, sem seu conhecimento, depositou num armazém da sua casa uma grande quantidade de tabaco e baralhos de cartas vindos da Galiza. Houve uma denuncia, a minha trisavó foi indiciada e umas das pessoas que veio em seu socorro, movendo influências, foi precisamente o seu padrinho António Vicente Ferreira Montalvão, conforme é relatado na obra O capitão de vila Frade: esboço biográfico.

António Vicente Ferreira Montalvão morreu em 1894 e no seu testamento datado de 1874 legou praticamente todos os seus extensos bens à filha natural, Maria Umbelina, designada neste instrumento legal como afilhada. Mas não esqueceu também a minha trisavó, a quem deixou 400 mil réis em dinheiro ou bens.

Muitos, mas muitos anos mais tarde, em 1961 este Júlio Augusto de Montalvão Machado, publicou uma colectânea 5 contos …em moeda corrente. ., onde narrou com evidente simpatia pelos protagonistas, os amores da minha trisavô, Maria do Espírito Santo Ferreira Montalvão e Padre José Rodrigues Sampaio, bem como nascimento do meu bisavô, o seu primeiro filho. Tudo isto me leva a crer que as relações familiares entres estes dois ramos da família tivessem sido muito boas e próximas.

Em suma, este retrato de Júlio Augusto de Montalvão Machado foi o motivo para conhecer a figura do seu avô, o velho fidalgo miguelista, António Vicente Ferreira Montalvão, que mantinha um modo de vida quase feudal e ao mesmo tempo ecológico, como diríamos nos dias de hoje, mas também para saber a história da sua filha natural, a Maria Umbelina, que apresenta um paralelo evidente com os amores dos meus trisavós, a fidalga e o padre. São casos que reforçam a minha ideia de que a bastardia era um componente da estrutura familiar do século XIX.

Igualmente foi interessante observar como este ramo familiar, foi evoluindo politicamente. De miguelistas, estes Montalvões quando se cruzam com os Machados, passam a liberais, depois republicanos e durante a ditadura, a paladinos dos valores democráticos. Fiquei a simpatizar com estes primos, hoje tão afastados.

Júlio Augusto de Montalvão Machado (1888-1968)

Bibliografia e ligações consultadas:

5 contos …em moeda corrente. . / Montalvão Machado - Porto: Livraria Progredior, 1961

Os Montalvões / J. T. Montalvão Machado. - Famalicão: Tip. Minerva, 1948

O capitão de vila Frade: esboço biográfico / Montalvão Machado. Porto: Livraria Lello e Irmão; Chaves: Gutemberg, 1956


Fontes arquivísticas:

Arquivo Distrital de Vila Real:

PT-ADVRL-PRQ-PVLP04-001-003_m0004
PT-ADVRL-PRQ-PVPA05-002-015_m0083_derivada
PT-ADVRL-PRQ-PCHV50-RU-001-001-107_m0087

sexta-feira, 21 de abril de 2023

Uma base de um tocheiro



Como já aqui referi anteriormente tenho um certo gosto eclesiástico herdado da minha avó Mimi e sempre ambicionei ter um tocheiro, essa peça barroca, tão característica das nossas igrejas. Mas a minha casa é muito pequena para encaixar tocheiros de grandes ou médias dimensões e por outro lado, os que aparecem nos mercados de velharias são muitas vezes más cópias dos anos 50 ou 60 do século XX ou mesmo quando são antigos, foram pintados e repintados com dourados esgaivotados ou demasiado estridentes.

Recentemente comprei esta base de tocheiro, que me pareceu muito boa. A talha é de boa qualidade e o dourado é bonito. Creio que é antigo, do século XVIII, em estilo D. José, com aquelas curvas e contracurvas em CC e SS, mas é sempre complicado datar estas peças. Houve uma certa persistência do gosto barroco em Portugal, mesmo quando este passou de moda, e nos século XIX e XX com os revivalismos, os tocheiros barrocos voltarem a ser produzidos e muitos foram até electrificados.

Foto retirada de Colecção de mobiliário do Museu-Biblioteca Condes Castro de Guimarães / José António Proença. - Cascais : Câmara Municipal de Cascais : Museus Municipais, 2009


Sempre imaginei que estes tocheiros fossem só usados nas igrejas, mas recentemente ao folhear o catálogo da Colecção de mobiliário do Museu-Biblioteca Condes Castro de Guimarães encontrei reproduzido um tocheiro, não muito diferente do meu, onde o autor, José António Proença, na respectiva entrada descritiva explica, que foram também usados na iluminação das casas particulares. Surgiram na segunda metade do século XVII e eram por vezes encomendados conjuntamente, entre outros, com espelhos, credencias, formando mobílias de grande aparato e impacto visual, convertendo-se num excelente indicador da riqueza e opulência do proprietário. Gozaram, de grande aceitação durante a centúria de setecentos, acompanho as alterações formais e decorativas ao longo desse período

Este meu tocheiro é só um fragmento e como tal pouco valor comercial tem. Ultimamente tenho visto muitos programas da série francesa Jour du Brocante sobre compra e venda de velharias e antiguidades em França e com efeito tudo o que está partido, fragmentado, incompleto ou em mau estado vale imediatamente menos dinheiro. Estes programas franceses, que se podem ver no you tube, puseram-me a matutar neste meu hábito de comprar cristos sem braços, meninos jesus com as mãos partidas, restos de serviços de porcelana, pedaços de talha dourada, pratos gatados ou de catar azulejos antigos em tulhas de obras e que tudo isto no futuro, não valerá um caracol. Mas como sou um sentimental, esta caqueirada toda em casa cria um ambiente especial no qual me sinto bem.


Bibliografia consultada:

Colecção de mobiliário do Museu-Biblioteca Condes Castro de Guimarães / José António Proença. - Cascais : Câmara Municipal de Cascais : Museus Municipais, 2009

sábado, 1 de abril de 2023

Ainda a doce Elina ou uma indiscrição com 120 anos

Elina Bravo Borges de Ferreira Montalvão.
Foto de Vidal & Fonseca, na Calçada do Combro 29, Lisboa

Já aqui tinha apresentado este retrato de Elina Bravo Borges de Ferreira Montalvão (1884-1912) e contado alguns fragmentos da história desse ramo familiar.

Esta jovem de ar tão doce era filha de um irmão da minha trisavó, o General António Vicente Ferreira Montalvão (1840-1919), que fez uma carreira brilhante nas armas e casou muito bem, com uma senhora da boa sociedade lisboeta, Mariana das Mercês Bravo Borges (1858-1888). Aliás, este general foi o irmão mais acertado da ninhada. A minha trisavó, Maria do Espírito Santo (1856-1902), envolveu-se com um padre, relação da qual nasceram dois filhos e outro irmão, o Miguel (1838-1890), nunca casou e morreu louco rodeado de livros.

General António Vicente Ferreira Montalvão (1840-1919)

Mas em 1902, à data deste retrato da doce Elina, estes assuntos já eram um pouco águas passadas, a Maria do Espírito Santo tinha morrido em Março deste ano e o General António Vicente Ferreira Montalvão sentiu-se mais à vontade para regressar a Chaves, sem ter que lidar com a situação incómoda de encontrar a irmã a viver em mancebia com um padre. Na época, estas situações não eram raras, mas em todo o caso não eram socialmente as mais desejáveis. Seja como for, a filha do general, que teve uma educação esmerada, com o curso superior de piano, discípula de Viana da Mota, travou conhecimento com o primo, o José Maria Ferreira Montalvão (1878-1965), filho bastardo do padre e da fidalga e entre eles terá nascido uma amizade. Assim em Dezembro desse ano de 1902, a Elina ofereceu o seu retrato ao meu bisavô e numa caligrafia elegante de quem recebeu a melhor das educações, escreveu esta dedicatória: José, envio-te o meu retrato accedendo ao teu pedido e para te provar que te estimo como a um irmão. Tua prima Elina. 19-12-902.


O verso do retrato de Elina. José, envio-te o meu retrato accedendo ao teu pedido e para te provar que te estimo como a um irmão. Tua prima Elina. 19-12-902

Na altura, em que apresentei este retrato, o meu amigo Manel, comentador residente deste blog, achou que o meu bisavô teria tido uma paixoneta pela prima Elina. Mas achei isso um exagero. Contudo, a minha prima Ana Paula Montalvão Vasques ofereceu-me mais uma resma de fotografias antigas e entre elas estava um retrato do meu bisavô, no momento da sua formatura em direito, na Universidade de Coimbra. Tenho outro exemplar dessa fotografia, tirada no estúdio do Pinho Rodrigues de Coimbra, mas esta foi dedicada à prima Elina e o texto é o delicioso: À sua adorada Elina, modelo de virtudes, com a graça das nymphas crystallinas, oferece com juramento de eterno amor, o seu primo e adorado José. Coimbra, 24-6-902.

.José Maria Ferreira Montalvão no momento da sua formatura. Foto de Pinho Rodrigues, Coimbra



O verso do retrato. À sua adorada Elina, modelo de virtudes, com a graça das nymphas crystallinas, oferece com juramento de eterno amor, o seu primo e adorado José. Coimbra, 24-6-902.


Esta dedicatória naquela linguagem arrevesada da época, prova que o meu bisavô sentiu efectivamente uma paixoneta pela prima. Mas, o mais curioso, é que a fotografia nunca foi entregue à suave Elina e ficou nos arquivos da família até aos dias de hoje. Talvez o José Maria Ferreira Montalvão tenha pensado duas vezes e concluído que o namoro com uma prima direita não era o mais adequado ou a própria Elina o tenha desencorajado nalguma carta.

Esta terna afeição entre os primos não teria passado de uma troca de fotografias e talvez de uma ou outra carta e logo no ano seguinte, o José Maria casou em 17 de Julho de 1903 com a Ana da Conceição de Morais Alves e a Elina casou a 14 de Julho de 1910 com Leopoldo de Montalvão de Lima Barreto Pereira Coelho, também primo, mas mais afastado.

Sei que talvez esteja a ser um pouco indiscreto, revelando a intimidade dos meus antepassados, mas quem não perdoará ao meu bisavô ter experimentado uma paixoneta por esta jovem, que ainda hoje, passados 120 anos, nos parece tão doce.

A doce Elina