Já há alguns anos que tenho este grande prato de faiança comigo, com cerca 35 cm. de diâmetro, que sempre me intrigou pela sua decoração, representando uma espécie de arbusto ou árvore em flor, de uma forma muito simplificada, mas ao mesmo tempo muito conseguida do ponto de vista decorativo. Esta tendência que se nota neste prato para a abstracção de um motivo da natureza, fez-me recordar desde logo a arte islâmica. Aliás, sempre o achei que tinha um certo ar da cerâmica de Iznik.
Azulejos de Iznik da Fundação Calouste Gulbenkian |
Contudo é um prato de típico da cerâmica portuguesa, com uma faiança sem grande qualidade, provavelmente do século XIX e talvez fabricado região do Porto, pois foi adquirido no Norte. No reverso não apresenta marca nenhuma e apresenta os típicos gatos destes objectos que já tiveram muito uso.
Mas a decoração continuava a intrigar-me. Recordava-me uma representação gráfica que um dia tinha visto num desses programas da BBC sobre a evolução das formas de vida na terra, em que todo começa na água com seres de uma só célula, que dão origem a outros seres, que passam para a terra, representados por ramos crescendo em direcção a todos lados. Uns ramos morrem, outros continuam, outros ainda bifurcam-se, constituindo assim um emaranhado, que representa as espécies extintas e aquelas que continuaram e deram origem a novos seres e novos animais, plantas ou hominídeos. Mas, claro, nunca levei os sentimentos, que este prato me despertou muito a sério. A nossa imaginação não tem limites e a realidade não é aquilo que nos desejaríamos que fosse.
Colcha com bordado de Castelo Branco. do Museu Nacional de Arte Antiga, inv.3465 tec |
Contudo há uns tempos, passou-me pela mão o catálogo Colchas de Castelo Branco : Percursos por terra e mar - [Castelo Branco] : IMC/Museu de Francisco Tavares Proença Junior : ADRACES-Associação para o Desenvolvimento da Raia Centro-Sul, 2008 e ao folheá-lo encontrei uma colcha do Museu Nacional de Arte Antiga, representando uma romãzeira, que me lembrou, não sei porquê, o meu prato. Fui ler a entrada descritiva e descobri, que aquela colcha representa a árvore da vida, um símbolo muito antigo, comum a várias religiões, inclusive ao Cristianismo. Porque as suas raízes se mergulham na terra e os seus ramos se elevam no céu, a árvore é universalmente considerada como um símbolo das relações que se estabelecem entre o céu e a terra.
Portanto, a decoração do meu prato mais não é do que a representação de uma árvore da vida, só que adaptada ao formato circular de um prato. O crescimento dos ramos que procuram a luminosidade dos céus desenvolve-se num movimento em espiral feito a partir do centro, em direcção aos bordos daquela peça de loiça.
Claro podemo-nos perguntar, em meados do século XIX, conheceriam os ceramistas fracamente instruídos de uma qualquer oficina de Gaia ou do Porto, o significado da árvore da Vida?
Talvez não soubessem explicar com palavras de gente erudita o significado da árvore da vida. Mas já teriam visto colchas de Castelo Branco e frontais de altar azulejos com esse motivo, ou ainda árvores de Jesse, nas igrejas que frequentariam, que certamente os impressionaram. Os padres também não deixariam decerto de evocar este simbolismo da árvore nas suas sermoneias. Por conseguinte, julgo que era natural, que quando estes ceramistas pegassem no pincel, esta imagem da árvore a desenvolver-se em direcção ao céu lhes surgisse como qualquer coisa poderosa, que desejassem reproduzir num prato. E a verdade é que ainda hoje, passados uns bons cento e cinquenta anos este prato mantêm intacto o seu fascínio simbólico.
Portanto, a decoração do meu prato mais não é do que a representação de uma árvore da vida, só que adaptada ao formato circular de um prato. O crescimento dos ramos que procuram a luminosidade dos céus desenvolve-se num movimento em espiral feito a partir do centro, em direcção aos bordos daquela peça de loiça.
Claro podemo-nos perguntar, em meados do século XIX, conheceriam os ceramistas fracamente instruídos de uma qualquer oficina de Gaia ou do Porto, o significado da árvore da Vida?
Talvez não soubessem explicar com palavras de gente erudita o significado da árvore da vida. Mas já teriam visto colchas de Castelo Branco e frontais de altar azulejos com esse motivo, ou ainda árvores de Jesse, nas igrejas que frequentariam, que certamente os impressionaram. Os padres também não deixariam decerto de evocar este simbolismo da árvore nas suas sermoneias. Por conseguinte, julgo que era natural, que quando estes ceramistas pegassem no pincel, esta imagem da árvore a desenvolver-se em direcção ao céu lhes surgisse como qualquer coisa poderosa, que desejassem reproduzir num prato. E a verdade é que ainda hoje, passados uns bons cento e cinquenta anos este prato mantêm intacto o seu fascínio simbólico.