quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Verseuse Vieux Paris


Em época de crise não há como a imagem do luxo dos dourados da porcelana e dos tecidos ricos para nos animar a alma, que tudo à nossa volta insiste em desanimar. Por isso, para que esqueçam esta crise pirosa, apresento-vos esta cafeteira de porcelana, que tenho agora praticamente a certeza ser uma produção Vieux Paris.


Uma Cafeteira Vieux Paris encontrada à venda num site de leilões on-line


Já tinha mostrado aqui no blog, este objecto, que nós designamos normalmente por cafeteira e que em França se conhece por Verseuse. Na altura, cheguei a pensar que se tratasse de porcelana russa, pois tinha visto na montra de um antiquário em Benfica um conjunto muito semelhante, atribuído pela leiloeira onde foi comprado, a uma qualquer fábrica de porcelana russa. Sabia que em St. Petersburgo existia uma manufactura de porcelana desde o século XVIII, que produziu peças de uma qualidade excelente e que essa fábrica sobreviveu durante período comunista, nacionalizada bem entendido. No entanto, causou-me uma certa estranheza a existência de peças russas em Portugal. Nunca foi um país com o qual mantivéssemos relações privilegiadas de comércio, como aquelas que experimentámos com a Inglaterra, a França, a Flandres, a Holanda ou a Itália. Depois, um dos seguidores colocou-me a hipótese de se tratar de uma porcelana Vieux Paris e uns amigos franceses foram da mesma opinião.
Outra Verseuse Vieux Paris. Reparem na asa, no bico e no formato em geral, que são semelhantes à minha cafeteira

Fiz uma série de pesquisas na net e encontrei uma série de cafeteiras nos sites franceses de leilões e antiquários muito idênticas à minha peça, bem como no Museu de Dijon. Todas elas são identificadas como Vieux Paris e datadas das primeiras décadas do século XIX, isto é do período Império (até 1815) e Restauração (até 1824). Julgo até que as peças que vi expostas na montra do antiquário também eram Vieux Paris.
Um serviço Vieux Paris com os característicos brancos opalinos e o dourados

Por outro lado a minha cafeteira ou Verseuse evidencia o estilo característico da porcelana de Paris daquela época, um branco puro, opalino, que quase recorda o vidro e a típica decoração a dourado. Não está marcada na base, o que torna quase impossível descobrir quem foi o seu fabricante, pois em Paris e na sua região existiam muitas casas que produziam boa porcelana e se copiavam umas às outras sem qualquer pejo. Mais ainda, todas elas tinham por modelo Sêvres e as suas produções luxuosas. Algumas dessas casas compravam a porcelana já cozida a outros fabricantes e limitavam-se a pinta-la. Muitas vezes as peças não eram marcadas. Portanto as identificações da porcelana Vieux Paris são quase tão complicadas como as da faiança portuguesas.

O tardoz de uma Cafeteira Vieux Paris, tirada de um site de antiguidades

O tardoz da minha cafeteira
Depois destas pesquisas estou seguro que a minha cafeteira é porcelana Vieux Paris, mas mesmo assim, sinto sempre algumas reservas, pois como já aqui referi em outros posts, as fábricas de porcelana europeia tomavam por modelo a porcelana francesa e ainda há uns tempos no site dum antiquário americano, John Atzbach, que se especializou na venda de objectos relacionados com a família real russa encontrei uma cafeteira que poderia bem ser francesa e com um formato semelhante à minha.

Cafeteira russa à venda no John Atzbach

11 comentários:

  1. Realmente a peça parece-me "Vieux Paris", mas como sei que eles se influenciavam todos pela Europa fora, também não me admiraria se fosse porcelana russa.
    A pasta parece algo translúcida, quase se diria vidro opalino, de um branco leitoso, a delicadeza e excelência dos dourados, a delicadeza da forma, tudo se conjuga para que a peça pareça francesa, e com certeza sê-lo-á mesmo.
    Gosto da opulência do entorno da peça, nas fotografias: o damasco de seda, as passamanarias e o azulejo antigo em fundo.
    Realmente faz-nos esquecer um pouco a pinderiquice ranhosa desta crise, pela qual não fomos responsáveis, mas que somos obrigados a pagar!
    Muita gente terá ficado com o proveito, no que os políticos terão tido a sua quota parte seguramente, mas afinal todo o sistema se orienta para estes desmandos!
    Se eles têm a oportunidade e o poder que, ainda por cima, e por ironia, lhes foram dados pelo povo, porque não aproveitar-se das suas tendências de escroques, para ficar com o que não lhes pertence?
    Haverá políticos "limpos"?
    Não duvido que os haverá, pois a teoria das probabilidades assim mo leva a crer, mas os outros, os fraudulentos, os indignos da posição para que foram eleitos, facilmente mo fazem esquecer, pois basta uma ovelha ranhosa num rebanho, colocada numa posição de poder, para que se tome o todo pela parte!
    E o escroque que detinha o poder anteriormente onde está ele? Em vez de julgado, e devidamente condenado, como aconteceria a qualquer pessoa que cometesse crimes que atentassem contra todo um povo, deve encontrar-se, impune, a gozar as delícias da "travessia do deserto", num qualquer retiro dourado no estrangeiro (o "Cherne", o "Sr. Engenheiro" e agora este último facínora com nome de filósofo - coitado do filósofo, que deve dar voltas no túmulo, pela associação que os incautos e ignorantes ainda poderão fazer - são alguns dos exemplos que poderiam ser mencionados)... é assim a impunidade dos políticos!
    Quanto mais roubam e mais desmandos cometem mais se lhes arranjam retiros dourados por essa Europa fora, ou então, se não detiveram poderes alargados, ingressam na administração de uma qualquer instituição pública, daqueles cargos bem remunerados, que mais não exigem que a assinatura no papel e, ala para casa que se faz tarde!
    Estou azedo, mas as circunstâncias a isso mo impelem ... por sorte, contrapondo à antiga situação do "Santo Velhinho", ainda posso tornar pública a minha indignação ... mas ... por quanto tempo mais?
    Manel

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  2. Que requinte, Luís, que elegância!
    Eu já conhecia esta sua cafeteira, mas desta vez o Luís excedeu-se na beleza da fotografia com que abre o post.
    Não me canso de admirar aquele pano de fundo (literalmente) que arranjou para a fotografia, junto ao belo painel de azulejos.
    Perante os dados resultantes da sua pesquisa, bem ilustrados pelas fotos, também não tenho dúvidas em atribuir a sua aristocrática “Verseuse” a fabrico Velho Paris até porque foi ali muito usado o ouro sobre branco, mais do que em qualquer outra porcelana.
    A cafeteira russa tem um formato semelhante, mas nas peças russas há sempre pormenores que nos são mais estranhos, como a pega da tampa ou o formato da asa... e o bico desta não tem a mesma elegância dos restantes.
    O parentesco mais próximo da sua peça é sem dúvida com as congéneres francesas. A sua tem uma bonita forma de pêra que as outras não têm, mas tirando isso...
    Ainda bem que com estas coisas temos oportunidade de nos abstrair um pouco da realidade escabrosa que nos rodeia, mas o Manel não resistiu a deixar aqui expressa a sua indignação e acabou por falar por ele, por mim e por muitos de nós para quem o desencanto é tão grande que já nem apetece dar voz ao que sentimos...
    Um abraço e bom fim de semana.

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  3. Boa noite,
    Venho seguindo os seus post's há mais de 3 meses e através deles os das pessoas que normalmente o lêem. Hoje senti-me compelida a dizer-lho porque realmente dá muito prazer ler o que escreve e ver as "encenações" e o enquadramento que dá a todas as fotografias.
    Tenho aprendido muito sobre "coisas" de que sempre gostei, mas àcerca das quais nada sei.
    Descobri o seu blogue por mero acaso, mas não posso deixar de lhe agradecer a si e aos seus seguidores (Maria Andrade, Marília, Manel e Fábio) as longas horas de "cusquice" e aprendizagem nos vossos blogues. O meu muito obrigado por me terem aberto as portas de um mundo fantástico, que me ajuda a esquecer a mesquinhês de "mundinho" em que sobrevivemos!
    Bom fim de semana.

    Ana Silva

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  4. Maria Andrade

    Sabe que o pano que vê na fotografia foi apanhado do lixo? Forrava uma sanefa e achei-o tão bonito que o trouxe para a casa, pensando que poderia usa-lo para fazer passepartouts ou outra coisa qualquer.

    Serviu para cenário a esta Cafeteira. Julgo que deu a esta porcelana aquele ambiente de dourados que em Paris tanto gostam. Os azulejos são a nota portuguesa.

    Tal como o Manel e pelos vistos a Maria Andrade, aborrece-me pagar do meu ordenado os disparates da classe política, os ordenados milionários dos gestores públicos e os estádios de futebol do Euro 2004.

    Enfim, vamo-nos entretendo com as porcelanas, faianças e velharias pois tornamo-nos mais cultos e mais informados e mais ricos...apenas interiormente...porque exteriormente...(tosse seca)

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  5. Cara Ana Silva

    É muito simpática e muito bem vinda a esta pequena tertúlia de amantes de velharias.

    um grande abraço

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  6. Tem toda a razão Luís ...com tantas coisas bonitas até somos capazes de por a crise porta fora e ficarmos a contemplá-las . Sempre nos faz bem à alma e nos alevia o coração.
    Bem -haja
    Quina

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  7. Cara Quina
    Temos que vencer este espírito agressivo que nos rodeia, protegendo-nos com a riqueza que nos transmite a cultura, a literatura e o património, senão enlouquecemos.

    Abraços

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  8. Não sei se gosto mais da cafeteira ou do painel de azulejos ao fundo. A cafeteira já tinha visto no post anterior e até comentei que poderia ser Vieux Paris. Eu gosto bastante de porcelana Vieux Paris e acho o estilo do primeiro império francês de um refinamento impar, é lindo o bico em forma de cisne.

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  9. Caro Daniel

    Foi o seu comentário e o palpite de uns amigos franceses que me levaram a mudar de opinião sobre a origem da Cafeiteira. Depois disso, foi fazer umas investigações aqui e acolá para confirmar a suspeita.

    O estilo da cafeteira é de facto muito refinado. Adoro o bico em forma de animal.

    Prometo mostrar o painel de azulejos que se entrevê ao fundo da fotografia. É provavelmente da Fábrica do Rato.

    abraços

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  10. Outro dia encontrei num site de vendas online 4 azulejos portugueses com aquele padrão dito "bicha da praça" dos quais você já comentou mais de uma vez. Não estavam caros e até pensei em comprar. Se fosse uma quantidade um pouco maior já os teria comprado, ficariam bonitos num pequeno painel sob uma bica de jardim.

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  11. Caro Daniel

    Tem razão. Os azulejos do séc. XIX só valem pelo conjunto. Cada um deles, só por si, não vale grande coisa, mas em grandes conjuntos, transformam a fachada de um prédio em qualquer coisa cheia de brilho e cor.

    Abraços

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