sexta-feira, 17 de abril de 2015

Uma antiguidade romana ou brincando às falsificações


Desde há alguns anos que alimento uma paixão por bronzes romanos, aquelas estátuas e estatuetas, danificadas pelo tempo ou cheias de musgos que os arqueólogos recuperam do fundo do mar. Em Mérida, muito perto do Museu Nacional Romano existia uma loja especializada em réplicas de peças romanas, que vendia reproduções fantásticas de lucernas, vidros, mosaicos e de estatuetas de bronze, que eram tão deslumbrantes como caras. O proprietário, um francês radicado em Mérida há muitos anos, explicava que se inspirava em peças originais de bronzes romanos, para executar cópias segundo o antigo método da cera perdida, e que depois as enterrava, para ganharem aquele verdete, aquela patina que os objectos antigos, que dormiram longos séculos debaixo da terra apresentam sempre.
Estatuetas de bronze romanas e helenísticas no The Metropolitan Museum of Art
Fiquei sempre com aquelas réplicas das antigas estatuetas de bronze atravessadas na cabeça, mas eram tão estupidamente caras, que desisti rapidamente da ideia de ter uma delas. De vez em quando, quando comprava um bilhete do Euromilhões,  lembrava-me delas e pensava que se um dia ganhasse um prémio grande iria de propósito a Mérida comprar uma daquelas réplicas.
Há pouco tempo encontrei na Feira de Estremoz uma cópia ordinária de um busto de um imperador romano, provavelmente feita numa liga com antimónio, estanho e chumbo, imitando o bronze, aparafusado a um plinto muito feio. Comprei-a e como a peça foi baratinha e não tinha nada a perder se a estragasse, resolvi seguir o método do senhor francês para envelhecer as peças e enterrei-a durante uma boa temporada no jardim do Manel. Reguei-a muito bem e deixei-a estar assim umas três semanas em repouso. A fim desse tempo, tirei-a da terra, lavei-a com água, mas não gostei do resultado. A reacção química da liga de antimónio, estanho e chumbo com a terra do quintal do Manel provocou-lhe o aparecimento de manchas brancas em vez de fungos verdes como eu pretendia. Voltei a enterra-la mais uma semana, mas desta vez, quando a retirei, a conselho do Manel, não a lavei. Limitei-me a escovar a terra, deixando-lhe alguns restos e de facto se não ficou com uma patina que eu desejava, ganhou um certo ar de antiguidade arqueológica, como dizem os franceses de objet trouvé.

13 comentários:

  1. o método e enterrar sim mas em estrume fresco e o melhor é o de pombo é muito mais agressivo.

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    1. Caro Anónimo

      Obrigado pela sugestão. Tenho é dificuldade em arranjar estrume muito fresco. Em todo o caso irei experimentar enterrar na terra, misturando com estrume. Realmente há peças como esta, que só ganham beleza com alguma patina.

      Um abraço e mais uma vez obrigado

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  2. As coisas que o Luís nos ensina!
    Bom fim de semana!
    Ana Silva

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  3. Não me parece que a questão esteja em ter ou não ter uma falsificação ou imitação em nossa casa. Até poderemos ter uma casa cheia delas, pois não creio que aí resida qualquer problema.
    A questão está em assumi-las e saber que o são e optar de forma consciente em tê-las, se nos agradar.
    Aí reside a nossa liberdade de escolha e decisão, posto que sabemos o que temos, não estamos a enganar ninguém, e, ainda mais importante, não nos enganamos a nós próprios.
    Eu tenho muitas peças que, sei, serão de gosto, ou qualidade, duvidosos, mas que me importa isso, se o sei e assumo a sua posse.
    Se os outros gostam, tanto melhor, se não gostam, pois ... temos muita pena, mas não me parece que devamos abdicar de ter o que, num qualquer momento, nos fez gostar de ter a sua posse, quer por razões de gosto, quer porque nos foram/são emocionalmente importantes, desde que essa opção tenha sido feita de olhos bem abertos e com conhecimento total daquilo que são ou representam.

    Não justifica ter coisas escolhidas em função de outros ou porque agradam esteticamente a alguém, ainda que, eventualmente, também nos possa suceder tal situação.
    Deve é ser algo muito claro dentro de nós próprios.
    O nosso deleite estético, associado a tantas causas, muitas delas quase inconscientes, é importante para a construção da cultura artística intrínseca à nossa personalidade, pois, antes de mais, é connosco próprios que devemos viver.
    Poderemos eventualmente abdicar ou alterar essa cultura artística, mas esse facto deverá surgir como consequência e em função das nossas aprendizagens ou desenvolvimento do gosto, pois estar vivo é isso mesmo, alterarmo-nos na medida que descobrimos e aprendemos com o que nos rodeia.

    Em resumo, porque não ter falsificações ou imitações?
    Esse é um problema que só a nós deve dizer respeito.

    Esta peça ganhou com a patine com que ficou, apesar de talvez ser interessante experimentar o estrume. Tenho tanto pombo à minha volta que poderei arranjar aquele que for necessário ... quem me dera não ter esta "dádiva" dos "ratos com asas"!!!

    Manel

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    1. Manel

      Suponho que o estrume fresco deve provocar uma reação química mais agressiva. Fiquei com vontade experimentar.

      Pessoalmente não tejo problema nenhum em ter réplicas em casa. Normalmente, um pouco por todo o mundo, as lojas dos museus vendem réplicas de excelente qualidade das suas obras e são uma forma simpática e económica de colocar a arte em casa de todos.

      As réplicas e as cópias tem uma tradição antiga. Os romanos executaram milhares de réplicas de estátuas gregas e helenísticas, de forma que qualquer patrício rico podia ter na sua casa do Palatino uma obra de Míron ou Praxiteles. Aliás, muito do que se conhece da escultura grega clássica é através das cópias romanas, pois a maioria dos originais perderam-se.

      O que eu aqui fiz foi uma pequena brincadeira, em que transformei um bibelot banal num objecto decorativo mais atraente e invulgar.

      Um abraço

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  4. Ana Silva

    O que aqui contei foi só uma maneira de tornar mais interessante um bibelot banal. No fundo, o que fazem os falsários ou os fabricantes de réplicas é executar o processo inverso do restauro.

    Um abraço

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  5. Luís
    Estas experiências são sempre engraçadas e eu também sou menina para me meter em coisas destas, falta-me é o know-how e a devida orientação técnica ;)
    Por isso não vou muito além de umas aplicações de graxa, castanha ou preta, para dar uma certa patine... Fiz isso, por exemplo, a um oratório bala brasileiro que mostrei no blogue e tinha uma pintura muito garrida por dentro. O Luís na altura aconselhou-me a forrá-lo a tecido adamascado, até teria ficado muito bem, mas eu preferi manter o aspeto artesanal e naif original e apliquei-lhe uma graxa castanha que acho que melhorou a coisa :)
    Este busto de imperador romano ficou com um aspeto muito convincente e parece-me muito bem enquadrado na decoração muito especial da casa do Luís.
    Há realmente reproduções muito boas de peças museológicas e as que se faziam cá (será que ainda se fazem?) para as lojas dos museus são de grande qualidade e eu deixei-me seduzir por algumas...
    Obrigada por esta graça e pelo saber fazer que aqui trouxe.
    Beijos

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    1. Maria Andrade

      Normalmente não me arrisco muito nestas experiências, mas como este busto custou 10 euros, não tinha nada a perder e resolvi usar esta técnica que aprendi com o fabricante de réplicas em Mérida e que depois voltei a ouvir falar dela nas histórias de alguns falsificadores célebres.

      Existia um antiquário em França, que era tão aldrabão, que não só fabricava móveis de estilo usando madeiras antigas, como também assinou um artigo numa revista científica descrevendo uma escola regional de mobiliário, que nunca existiu, mandando repintar um quadro de um abade do século XVIII, como se fosse o marceneiro fundador dessa escola. Houve depois uma procura no mercado dos antiquários desses móveis regionais, que só se encontravam na loja de um antiquário em Bruxelas, que escoava a produção do aldrabão.

      Enfim, com este busto, brinquei um bocadinho aos falsificadores, mas sem consequências.

      Eu compro muitas vezes réplicas em museus, quer em Portugal, quer lá fora. Por cá tenho comprado nas lojas dos museus portugueses óptimas reproduções de faiança, como por exemplo, aqueles canudos de farmácia, esponjados, que eram fabricados pelo Rato. São reproduções de excelente qualidade e para quem não tem dinheiro para comprar genuínas peças do rato, estas são muito decorativas.

      bjos

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  6. É lindo este busto. Uma pena que a liga deva ter muito antimônio, daí o resultado não satisfatório no processo em enterrar. O antimônio se desgasta muito fácil, vai virando pó...um horror!
    Às vezes encontro peças lindas antigas, mas se desfazendo.
    Já que o verde não vai acontecer, se a peça fosse minha, eu daria uma camada de cera incolor pra dar uma uniformizada nas partes manchadas. Depois passaria uma escova. Fica um brilho leve, dá uma levantada e deixaria ela descansando no cantinho e assistindo o tempo passar.
    Nunca mais ouvi falar daquele senhor enterrador de peças. Um barato o trabalho dele!
    O busto é bonito demais!

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    1. Caro Jorge

      Como sei pouco de restauro, processos químicos e outros assuntos mais tecnológicos, normalmente não me arrisco a mexer nas minhas peças e normalmente aconselho-me sempre com o Manel, que esse sim tem muita prática nestas coisas. Este busto foi uma excepção, pois foi tão barato, que se o estragasse, o prejuízo seria de pouca monta.

      Em todo o caso, o busto ficou muito mais bonito do que era e assim ao longe até parece antigo e como o Jorge sabe, a decoração de uma casa, é um jogo de feito ilusões.

      Vou registar a sua sugestão.

      Um abraço

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  7. Uma experiência engraçada.
    Beijinho.:))

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  8. Ana

    Todos nós temos por vezes esta tentação de transformar o moderno no antigo. Julgo que corresponde a um desejo de possuir peças idênticas às que vemos nos museus e que sabemos que nunca poderemos possuir.

    bjos

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  9. Vi o busto de imperador em teu blog.E' lindo!
    Tentei deixar um comentário,mas não sei se deu certo.
    Sou artista plástico e vou dar uma sugestão para dar pátina de bronze envelhecido em obras feitas em antimonio.
    Use tinta verde,no mesmo tom das famosas oxidações em bronze.A tinta deve ser sem brilho.Aplique a tinta aos poucos e vá retirando o excesso com um tecido seco,deixando a obra com manchas a seu gosto.Você ainda pode diluir a tinta e aplicar com esponja,dando leves batidas.Produtos corrosivos não são aconselhados para obras feitas de antimonio,podem danifica-las de forma permanente.
    A tecnica que te mando,eu costumo aplicar.
    Só não te mando a marca das tintas pois estou no Brasil,mas e' só procurar uma tinta para metais.
    Um abraço Wallace

    Visite meu blog:
    wallacefinearts.blogspot.com

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