domingo, 24 de maio de 2015

Uma ferragem antiga estilo neo-renascença ou o gosto pela inutilidade

 
Talvez a psicologia encontre uma justificação racional para este meu gosto de comprar objectos insólitos dos quais desconheço a utilidade. Pessoalmente tenho dificuldade em explicar esta atracção por ferragachos, que encontro no chão das feiras. Talvez porque aparecem descontextualizados, estes objectos pareçam mais misteriosos e consequentemente mais valiosos do que aquilo que realmente são.

Foi certamente o que aconteceu com a peça de ferro que mostro hoje. É bonita, tem uns restos de pintura dourada, mas não sei de onde veio, nem para o que servia. Suspeito, que talvez fizesse parte de um antigo portão ou da estrutura de uma varanda de ferro forjado. Também não excluo a hipótese de ser um elemento decorativo de uma velha cama de ferro.


Olhando, para o reverso e para os pregos grosseiros que prendem a chapa decorada à base, percebo que é definitivamente antiga. Mais de 100 anos terá de certeza. Suspeito, que será coisa do século XIX, feita ao gosto neo-renascença, estilo que surgiu em França por volta de 1830-1848 e que perdurou por todo o século e prolongou-se ainda pelo século XX fora. Aliás, as casas de velharias estão cheias de conjuntos de salas de jantar, compostos por aparadores, louceiros, trinchantes, mesas e cadeiras construídas neste estilo. 

Sala de jantar em estilo neo-renascença no Palácio Nacional da Ajuda
Claro, não são peças tão boas como as da sala de jantar do Palácio da Ajuda aquelas que encontramos nas lojas e feiras das velharias, mas em todo o caso, a renascença foi para muitas famílias da burguesia o estilo preferido para o mobiliário de sala de jantar.

Quanto a esta minha peça, apresenta todas as características deste estilo, o mascarão, os enrolamentos e os brotescos. Não é uma verdadeira antiguidade, mas a ignorância que tenho da sua função original empresta um certo ar de mistério a este ferragacho, que decora a entrada da cozinha. 


16 comentários:

  1. É uma peça curiosa.
    Venho aqui sempre e acho muito interessante como sempre dá uma utilidade aos seus "achados" e lhes encontra um lugar, que parece que estava ali à espera propositadamente para cada um deles:)
    Boa semana:)

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    1. Isabel

      Obrigado.

      Como a decoração da minha casa é feita num estilo de bric-à-brac é relativamente fácil estas peças encontrarem o seu lugar. Qualquer sítio lhe serve, até os tectos...

      Um abraço

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  2. Boa-noite Luís!

    Apesar de soterrada em papelada, (final de ano lectivo é assim) faço aqui um pequenino intervalo para comentar a sua linda peça.
    Acho-a realmente cheia de beleza, fazendo-me recuar no tempo para o recheio dos lindos palacetes (infelizmente muitos em ruínas) que o Gastão de Brito e Silva costuma fotografar.
    Assim à primeira vista,pareceu-me que o rosto tinha algo de arte nova, mas depois,quando vi a cercadura percebi que me enganara.
    Não sei porquê, mas não creio que pertença a um móvel, mas também não sei aonde encaixará.
    Mas de uma coisa tenho a certeza; ficou muito bem aonde a colocou!

    Um beijinho

    Alexandra Roldão


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    1. Alexandra

      O final do ano lectivo é sempre um período tramado para todos os professores.

      Relativamente a esta peça, estou convencido de que daqui a um ano ou dois encontro uma igual no seu contexto original numa feira de velharias ou reproduzida num livro. Por vezes, temos que ser pacientes.

      Também já aconteceu, que algumas destas peças misteriosas foram identificadas por seguidores deste blogue, ou por pessoas que passaram aqui por mero acaso.

      Bjos

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  3. Oi Luis,
    Que bela peça! A assim que olhei para ele me remeteu a um ornamento de lareira, não sei o nome especifico dado a essa peça em português... mais me parece ser parte de um 'andiron' alguma parte do ornamento.

    Abraços

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    1. Caro Ricardo Ferreira

      Julgo que um dos nomes que se dá a esse tipo de peças é cães de lareira. Aliás, em inglês também são conhecidos por "dogfires". Fiz algumas pesquisas por imagens pelo termo em inglês e ainda em francês por "chenet" e que esta peça possa ter feito parte de um conjunto desses é também uma possibilidade a considerar.

      Um abraço

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  4. Pelo encaixe que está em baixo, diria que seria um elemento decorativo de uma cama de ferro, mas deveria ter igual encaixe na parte superior, o que me parece não haver, a não ser que tenha sido cortado.

    Dou conta que tens um certo fascínio por este tipo de peças que, para o comum dos mortais, é considerado inútil.
    No entanto, para pessoas com criatividade, como é o teu caso, acaba por se encaixar num qualquer recanto ou desvão, que parece o lugar perfeito para a expor, parecendo mesmo que já "nasceu" ali.

    Para lá do facto de poder pertencer a uma cama de ferro, não tenho mais nenhuma sugestão, no entanto, como aconteceu com o mascarão que mostraste há muito tempo atrás, e que, através de uma tua comentadora, se revelou uma pega de uma banheira, um destes dias haverá alguém que reconheça este tipo de peça e desvende o mistério.
    Manel

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    1. Manel

      Talvez a única certeza que tenho é que esta peça esteve encaixada pela parte inferior nalguma estrutura, que desconheço. Tenho uma certa fé que talvez um dia num livro, ou num catálogo ou num museu descubra a solução deste mistério.

      Um abraço

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  5. É linda, bem feitíssima, uma velharia realmente maravilhosa!!!Eu também adoro uma inutilidade. Bonita é claro!
    Ficou linda a peça na parede, muito elegante!
    Adorei!

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    1. Jorge

      Estes ferragachos são como aqueles objectos, que na infância guardávamos numa caixa fechada a cadeado e eram os nossos tesouros. Podiam ser botões com brilhantes, uma chave antiga ou um brinde do bolo-rei.

      Não sei se no Brasil existe o hábito de comer bolo-rei. Por cá, consome-se no período natalício e no passado colocavam-se dentro pequenas prendas, como um anel de plástico dourado, uma moeda ou um pequeno boneco. As crianças adoravam e estavam sempre à espera que na sua fatia lhe calhasse a prenda.

      Um abraço

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    2. Salve Luis!
      Realmente um mistério! Contudo, me parece parte de um gradil em ferro tão comuns no final do século XIX e inicio do XX os quais vejo muito por aqui no Brasil. Quem sabe não adornou um balcão onde uma Julieta sonhadora ouviu a serenata de um Romeu apaixonado? Abraço d´além mar. Edwin Fickel

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    3. Caro Edwin

      A hipótese de esta peça ter vindo de um antigo balcão de ferro forjado é também uma boa hipótese e já procurei em vários livros sobre o tema qualquer coisa igual a esta, mas há tanta variedade de decorações em ferro forjado nas varandas portuguesas, que é quase como procurar uma agulha num palheiro. Tenho fé, que alguém um dia passe por este post e me envie uma fotografia, escrevendo, "olhe a varanda da minha casa, ou a minha cama de ferro tem um ornato igual a esse". Há que aguardar.

      Um abraço

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  6. Luís,
    Também gosto destas peças inúteis.
    Esta é bonita e fica muito bem em fundo azul.
    Bom fim-de-semana. :))

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    1. Ana

      Julgo que todos nós que gostamos de história ou arte, temos uma certa atracção por aquilo que já passou, pelo que perdeu utilidade e já só tem valor sentimental. O gosto pela história é sempre uma forma de romantismo

      Bjos

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  7. É interessante a cravação do elemento decorativo obtido por fundição. Será chumbo dourado?

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    1. São

      Não percebo nada metais e normalmente quando apresento peças nestes materiais, não arrisco grandes palpites, a não ser que sejam bronze ou cobre, que ainda vou identificando.

      Em todo o caso, é uma peça, que apesar de pequena, é pesada e terei muito gosto em um dia mostrar-te este ferragacho, que é facilmente transportável.

      bjos

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