sexta-feira, 12 de março de 2010

Faiança Ratinho numa pintura de José Malhoa


Não podia deixar de partilhar com os leitores deste blog o óleo do pintor José Malhoa, a Sesta, que se encontra no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Se repararem com atenção, à direita, descobrem um belo prato Ratinho no Cesto do camponês. O Grupo de trabalhadores que se encontra a dormir espalhado à sombra das árvores, comeu o seu farnel no prato Ratinho e um deles parece estar a acordar.
José Malhoa (Caldas da Rainha, 28 de Abril de 1855 – Figueiró dos Vinhos, 26 de Outubro de 1933) é como toda a gente sabe um dos mais populares pintores portugueses e gravou nas suas telas um Portugal rural, que hoje estás em vias de desaparecer.

José Malhoa esteve em 1906 no Brasil, a convite do Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro para aí expor os seus trabalhos. A exposição inaugurada em Julho desse ano teve um sucesso tremendo e dos 112 quadros expostos, Malhoa vendeu 52!

Explica-se assim porque é que esta tela, A Sesta, está no Museu de Belas Artes do Rio, bem como muitas outras obras do pintor, que se encontram espalhadas por colecções públicas e privadas do Brasil.
Para saber mais sobre Malhoa
Mais sobre Faiança Ratinho

6 comentários:

  1. Caro Amigo
    Não quero deixar de o elogiar pela ligação que consegue fazer com outras faces da arte. Tem na realidade um "olho clínico" e indice cultural que o conduz a fazer estes relacionamentos.
    Na verdade o Malhoa foi o grande mestre que traduziu para a tela os usos e costumes do Povo da época em que viveu.
    Recentemente também tive a oportunidade de apreciar uma tela no Palácio de Vila Viçosa, na qual o Rei D. Carlos pintou uma embarcação tipica do Seixal, não restou nenhum exemplar, mas que era equipada com um complicado conjunto de velas e o casco e proa provido de
    fortes bicos em ferro, que lhe permitia albarroar as embarcações dos piratas, aquando da faina da pesca na zona do Cabo Espichel.
    Deixemos os barcos e vamos à caça dos ratinhos.
    Carlos Pereira

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  2. Olá Luis
    Malhoa é o único pintor português que faz parte do meu manancial de infância.
    Muito pelas imitações de quadros seus na casa de meus pais e também por ter vivido a parte final da sua vida em Figueiró dos Vinhos, concelho limítrofe de Ansião.
    Lá construiu a sua casa chamada "Casulo" pequenina mas muito castiça, tipo chalet de cor tijolo que ele próprio pintou com flores tipo vitorianas à volta da cemalha da sala,
    (pétalas em tons rosa pálido) assim como fez o lambril muito alto todo magnificamente esculpido em madeira.
    Pena que na época as pessoas da vila nada ou pouco percebiam de arte e após a sua morte como não deixou herdeiros, roubaram quase tudo.
    Viveu lá com a mãe da Beatriz Costa e esta de lá veio para Lisboa com um militar de patente alta dali natural que gostava de teatro.
    Malhoa passava o mês de Setembro na Quinta de Cima na vila de Chão de Couce no concelho de Ansião que data dos primórdios da nacionalidade, embora hoje praticamente descaracterizada.Deixou à vila o retábulo da igreja por si pintado e azulejos, a modelo de inspiração da Virgem morreu há 2 anos.Pintou nessa época muitas tradições rurais, como a procissão entre muitas outras por aquelas vilas.
    Alguns quadros pintados por ele ofertados aos donos da Quinta de Cima foram à pouco tempo vendidos em leilão no Palácio do Correio Velho.

    Quanto ao belo quadro reproduzido, não consigo decifrar a imagem do casario para a conseguir identificar.
    Muito provavelmente foi pintado numa qualquer aldeia daquela zona. A cesta feita em cana é artesanato ainda hoje típico de Ansião.
    Assim como a sesta, que foi caindo em desuso.
    Porém há poucos anos um meu professor antes do 25 de Abril, alentejano de Montargil Dr Prates Miguel que se radicou em Ansião, decidiu em boa hora ser membro fundador da Associação dos Amigos da Sesta, já de renome nacional.
    Quanto a mim foi o único professor que guardo boas memórias até hoje.

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  3. Ai Luís, esta vida rural não está em vias de desaparecer, já desapareceu mesmo, pelo menos na região pertencente às serranias da Sicó, de que a minha família é originária, paredes meias com Figueiró dos Vinhos.
    Da sesta nem memória ficou, dos ratinhos, se algum restou, quedará partido algures debaixo de um monte de entulho, resultante da queda da casa de adobe, antiga, que foi coberta da velha telha árabe, ou de canudo, ainda com as marcas dos dedos protectores, de que hoje ninguém quer saber, substituída, ao lado, pelo "mamarracho" atamancado, de proporções gigantescas (já nem sempre construído pelo dinheiro da emigração, porque os que cá ficaram, nos dias que correm, também querem lutar pelo seu quinhão de mau gosto!), com as inevitáveis colunas na fachada, com varandas à "Scarlett O'Hara", onde nunca se vê ninguém, que dão para vastas salas ("en face de la route"), trancadas, pristinas, não vá o pó entrar e macular o mobiliário a atirar ao "intigo", mas que de antigo nem o estilo, antes uma amálgama de peças, umas a arremedar a um Henrique II de pacotilha, outras ao vitoriano manhoso, ou a um dos Luíses (tanto faz, nem isso é importante), mal atamancados, os grande sofás em cabedal, talvez "capitoné", de onde, se tivermos a má sorte de lá cair, apetece sair o mais rápido possível, gélidos de Inverno e pegajosos de Verão, mobílias de quarto onde só são possíveis os pesadelos; enfim, gente com demasiadas posses para trocar por um gosto duvidoso e manhoso.
    Gente deslumbrada, que depois vive encurralada numa cozinha, nas traseiras da casa (quando não numa cave!), talvez cega, desagradável, onde se amontoam todos frente a uma televisão, que também ela vai aumentando em tamanho (a desculpa são as cataratas da avó ou a miopia da tia), com som estereofónico, não vá alguém ter a veleidade de falar e ser ouvido!
    Este é o panorama que invarialvelmente se me depara, mas que parece agradar de sobremaneira a esta nova classe dita rural em que se transformou a gente da aldeia (talvez se tentem copiar outros modos e outras vivências, que sei eu?).
    Não sei o que se passa pelo resto do país, falo pelo que vejo paredes meias comigo e fico arrepiado ao pensar como é possível que, gerados e saídos destes "cadinhos" anacrónicos surjam pessoas interessantes, uma nova sociedade que se pretende culta, organizada, sensata, flexível, com respeito pelo próximo e pelo passado, equilibrada.
    Não admira pois deparar-me com pessoas tipo "chicos espertos", capazes, se conseguirem sair impunes, de ultrapassar o próximo de qualquer jeito e maneira que lhes seja possível, conquanto que exteriormente pareçam exemplares! Até estranharia se doutra forma fosse!
    Mas se as pessoas parecem ficar encantadas com este panorama porque será que ele me incomoda?
    Enfim, tudo porque as minhas estadas na aldeia me fazem querer que as coisas fossem diferentes!
    E tudo foi despoletado por um frágil e humilde ratinho no interior de uma cesta
    Manel

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  4. Obrigado pelos vossos comentários

    Além do valor artístico, muitas vezes a pintura é um documento histórico valioso, mais eloquente que os textos escritos. É o caso desta Sesta de Malhoa, bem como grande parte da sua pintura, que retratou um universo rural, hoje quase desaparecido e que para nós habitantes da selva de pedra constitui quase um paraíso perdido, um local onde o homem vivia em comunhão com a natureza.

    No entanto, nós bem sabemos que esse Portugal rural idílico que Malhoa pintou nos finais do Séc. XIX é também um país da miséria profunda, da ignorância (90 % da população é analfabeta), da fome e da superstição.

    Os ratinhos são um símbolo desse país de profunda miséria, e que hoje todos tentam esquecer rapidamente construindo “maisons em face de la route” e alpendres semelhantes a casas sulistas do tempo da Scarlett O’Hara

    Sou talvez demasiado ingénuo em sonhar que nos nossos campos a tradição possa coexistir novamente com a modernidade. Em Lisboa, os Ratinhos, os pratos dos camponeses mais miseráveis, atingem preços altíssimos (devia ter comprado o seu prato por 80 Euros, ó Carlos Pereira), o que mostra que pelo menos há uma classe social em Portugal que já não tem vergonha do seu passado camponês e que até se orgulha dele e faz lindamente, pois por vezez a miséria produz obras de arte sublimes de simplicidade.

    Desculpem-me, mas hoje deu-me para ser sentencioso.

    Abraços a todos

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  5. Caro Amigo LuisY

    Estou neste momento a tentar fazer um documentario sobre os beirões que iam para o alentejo para a ceifa, também conhecidos por Ratinhos. Estou neste momento a recolher informação visual acerca do tema: objectos, fotos, pinturas, tec.. Encontrei o seu blogue onde aborda a pintura a oleo do José Malhoa que está no Rio de Janeiro. Gostava de a incluir no documentário. Será que seria possivel dar-me autorização para usar no meu documentário? se sim podia enviar a foto original? Há uma outra foto que mostra uma malga e uns garfos de onde comiam várias pessoas. Pode me informar onde se encontra?

    Grato pela atenção

    Carlos Reis

    Telemóvel 962064863
    e-mail: carlosreis@esart.ipcb.pt

    Desculpe estar a escrever para o blogue, mas não consegui encontrar o e-mail.

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  6. Porque só tive conhecimento da existência do seu blogue há relativamente pouco tempo, só hoje, dando volta pelos vários assuntos que publicou, me apercebi destes posts sobre a faiança dita dos "Ratinhos".
    Por coincidência até conheço, pessoalmente, o Carlos Pereira e foi curioso vir encontrá-lo a falar sobre um assunto que sei ser, uma, das suas muitas paixões.
    Parabéns ao autor do blogue pelo que escreveu sobre o assunto dos "Ratinhos" e, também, àqueles que os comentaram com tanta pertinência e sensibilidade.
    Gostei muito.
    emília reis

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