Olho vezes repetidas para esta fotografia da minha avó. Tenho sempre a impressão que se trata de uma fotografia da minha mãe, vestida com trajes do início do século. Há semelhanças muito evidentes entre as duas. O mesmo cabelo claro, o mesmo queixo e a mesma expressão.
A minha avó teria nesta fotografia uns 10 anos. Era uma menina. A mesma idade que a minha filha Maria do Carmo tem agora e com a qual também se assemelha.
A minha avó morreu em 1969 e eu mal me recordo dela. A minha mãe, que está agora num lenta caminhada para a morte, chama muitas vezes pela mãe, que é esta menina da fotografia. A Carminho nem faz a menor ideia de quem foi esta avô Adelaide e já não se recorda da minha mãe como uma personalidade activa.
É a inevitável marcha do tempo. Ao fim de três gerações, avó, mãe, filho, a memória dos antepassados desaparece. Talvez seja por isso, que escrevo este blog, para tentar fixar as memórias familiares e travar o tempo, ainda que inutilmente.
Mas esta menina tão bonita, com um vestido janota e um grande laçarote, morta há muito tempo, continua ainda a exercer o seu fascínio. Foi certamente um dia especial na sua vida, pois tirar o retrato era uma coisa rara, naquele tempo, ainda para mais no Emílio Biel, o fotógrafo da Casa Real!
Julgo que se terá deslocado ao Porto, para fazer esta fotografia, pois o Emílio Biel não faria certamente as feiras no interior do País como os outros fotógrafos, tirando os retratos dos lavradores abastados. O Emílio Biel era dono de um atelier no Palácio do Conde do Bolhão, na Rua Formosa e era um fotógrafo de primeira categoria. Tinha vindo da Alemanha para Portugal em 1860, na comitiva do Rei D. Fernando e foi um tipo todo empreendedor, que se dedicou a tipografia, introduziu a luz eléctrica e o telefone no Porto e tinha o estúdio fotográfico mais célebre de todo o Norte de Portugal.
Julgo que se terá deslocado ao Porto, para fazer esta fotografia, pois o Emílio Biel não faria certamente as feiras no interior do País como os outros fotógrafos, tirando os retratos dos lavradores abastados. O Emílio Biel era dono de um atelier no Palácio do Conde do Bolhão, na Rua Formosa e era um fotógrafo de primeira categoria. Tinha vindo da Alemanha para Portugal em 1860, na comitiva do Rei D. Fernando e foi um tipo todo empreendedor, que se dedicou a tipografia, introduziu a luz eléctrica e o telefone no Porto e tinha o estúdio fotográfico mais célebre de todo o Norte de Portugal.
Não sei exactamente se a fotografia, foi o principal pretexto para a viagem da Adelaide maria ao Porto, ou se veio acompanhar o pai nalguma viagem para tratar de assuntos oficiais.
Mas essa viagem de Vinhais para o Porto, terá ocorrido por volta de 1904 ou 1905 e terá sido feita de carruagem, ou mesmo a cavalo, pois o comboio só chegava até à Régua. Ficou talvez alojada nalgum daqueles pequenos hotéis, com elevador, que estavam a ser construídos no Porto e a menina deve ter sentido um misto de medo e excitação ao entrar pela primeira vez no ascensor. Aliás, conta-se na família, que o pai dela, uns anos antes, quando foi ao Porto e foi conduzido ao elevador pelo criado, se recusou a entrar, dizendo que não queria ficar com aquele quarto tão pequeno e sem janela.
Depois da excitação da viagem a cavalo, do hotel com elevador e da visita à grande cidade do Porto foi tirar esta fotografia ao Emílio Biel, com as suas melhores roupas e a imagem desse dia especial, em que nos fixa com os seus olhos azuis límpidos ficou imobilizada no pedaço de cartão duro, que aqui reproduzo.
Um belo texto ,Luís !...Nele nos mostra quão efémeros podemos ser. No entanto ,não creio que tal suceda com a sua avó ,ela vai permanecer na memória da família através do élo que o Luís está a criar ao narrar tudo isto à sua filha .Sei quão doloroso é vermos nossa mãe assim ,partindo lentamente no meio do sofrimento .Desejo-lhe muita força e digo-lhe que no futuro bendizirá todos os segundos que lhe pode dedicar .
ResponderEliminarAb.
Quina
Mais um dos teus posts intimistas, onde sabes perfeitamente como lidar com sentimentos e sensibilidades.
ResponderEliminarOlhando bem para esta tua avó nota-se efetivamente que a Maria do Carmo apresenta um certo ar de família com ela, pois, sabe-se lá como (as leis da genética são inponderáveis), ela apresenta mais parecenças com este teu lado.
São as gerações que se substituem, mas continuam a perdurar pelo tempo, seguindo traços comuns.
Será que este teu lado familiar também teria o sentido de observação admirável que tem a Maria do Carmo? Ou mesmo a sua queda artística?Sei que eram pessoas prendadas e dadas aos lavores femininos, mas ... e mais?
Enfim, a esta distância, já vai sendo difícil responder a estas questões, ainda que o seja possível, pois deverá haver uma memória familiar recente.
Muito bonito este teu post
Manel
Quina
ResponderEliminarObrigado pelas suas palavras simpáticas e por ter paciência para me ler. Creio que os seres humanos tentam sempre travar esta batalha contra o esquecimento através da história, que mais nãó é do que uma forma intelectualizada do antigo culto dos mortos.
Abraços
Manel.
ResponderEliminarJulgo que também te tenho a agradecer a paciência que tens para leres estas coisas que escrevo sobre a minha família e que mais não são que o meu medo do esquecimento ou o meu receio que as memórias se esbatam cada vez mais.
Desta minha avô sei que era uma leitora voraz e tudo que lhe viesse parar à mão ela lia, fossem jornais, romances, livros piedosos ou revistas. Também teve a sorte de ter uma filha mais velha que rapidamente se encarregou de tratar dos filhos mais novos. Era também habilidosa nos lavores femininos e pintava umas flores sobre seda, que serviam como passe-partouts de fotografias.
Sabe, Luís, ao lermos os seus textos, não se trata de ter paciência, longe disso, trata-se sim de usufruir de um prazer partilhado.
ResponderEliminarTal como o Manel, encontro muita beleza neste post – a beleza cândida da menina que veio a ser sua avó, a beleza das palavras adequadas, a beleza dos sentimentos contidos…
E sempre a construção de uma história que nos prende, que achamos interessante…
Por mim, pode e deve continuar! (mesmo que eu ande com pouco tempo para vir aqui) :(
Um abraço
Maria Andrade
ResponderEliminarAndo um grande grossseirão que nem respondo às pessoas aqui no blog, mas de vez em quando fico sem tempo.
Dá-me um certo prazer escrever estas pequenas histórias. Julgo que aqui me vingo de todas as redacções parvas que fiz durante toda a escolaridade acerca de temas que me eram impostos e não me interessavasm para nada. No blog tenho esta liberdade de escrever acerca do que me interessa e os sentimentos que as fotografias antigas me despertam é um tema tocante e uma forma de não deixar as memórias morrer.
Abraços