Na melhor rua da vila de Fronteira no Alentejo, onde de um lado e outro abundam belas casas senhoriais dos séculos XVIII e XIX, cheias de uma dignidade contida, há um chalet construído nos finais do século XIX, que se destaca pela sua arquitectura exuberante, espalhafatosa, quase gótica. Trata-se certamente de uma chamada casa de brasileiro, isto é um palacete construído por algum português que fez fortuna nas terras de Vera Cruz e quando voltou à Santa Terrinha, fez erguer um palacete construído segundo a última moda de Manaus, a mítica cidade do Amazonas onde se fizeram fortunas alucinantes e o dinheiro era tanto que se construiu uma ópera para atrair o grande Caruso.
Aliás, em Portugal a casa de brasileiro, passou a ser uma expressão que designa um determinado de vilas e palácios, com uma arquitectura tendencialmente vertical, normalmente vilas e palácios, construídos nos finais do XIX, princípios do XX e decorados de forma exuberante, com muitos azulejos, ferros forjados, janelas e vidros coloridos.
Foram construídos por portugueses regressados do Brasil e foram alvo de chacota da boa sociedade de então, conforme nos testemunham os textos satíricos dos escritores da época. Camilo Castelo Branco escreveu acerca delas Vão-se os olhos naquilo! Esta maravilha arquitectónica devem-na as artes ao gosto e génio pinturesco de um rico mercador que veio das luxuriantes selvas do Amazonas, com todas as cores que lá viu de memória e todas aqui fez reproduzir sob o inspirado pincel de trolha.
A porta com motivos arte nova e vidros coloridos (foto do Manel) |
Foram construídos por portugueses regressados do Brasil e foram alvo de chacota da boa sociedade de então, conforme nos testemunham os textos satíricos dos escritores da época. Camilo Castelo Branco escreveu acerca delas Vão-se os olhos naquilo! Esta maravilha arquitectónica devem-na as artes ao gosto e génio pinturesco de um rico mercador que veio das luxuriantes selvas do Amazonas, com todas as cores que lá viu de memória e todas aqui fez reproduzir sob o inspirado pincel de trolha.
No entanto, o tempo perdoa muita coisa e hoje cento e dez anos depois, essas casas parecem-nos charmosas nas suas fantasias decorativas, como este palacete de Fronteira, com um dragão no pináculo, a sugerir um romance da Idade Média ou as suas varandas com o ferro forjado arte nova. E depois, em comparação com os caixotes da arquitectura modernista dos anos 60, 70, 80 e 90, tudo o resto nos parece aceitável e humano.
Olá Luís ! , sabe ,adoro Arte Nova ...Nem sequer preciso de comparar algo com os caixotes dos anos da 2ª metade do séc. XX que são pavorosos ! Que interessante aquele trabalho em ferro ....De facto tem razão quando diz que as casas ditas de brasileiros estão um pouco por todos os concelhos do nosso país . No meu , há pelo menos um desses palacetes , numa aldeia chamada "Olêdo ". Pena que esteja decadente , pois até me parece bem bonito .
ResponderEliminarAb.
Quina
Olá Luís
ResponderEliminarInteressante e esclarecedor a sua análise sobre as marcas dos brasileiros torna viagem, com as suas casas apalaçadas que se destacavam na paisagem, rural ou urbana, mas hoje constituem marcas expressivas da sociedade oitocentistas. Partindo da pobreza e regressando com a riqueza, demonstram a bem sucedida simbiose com as novas sociedades e culturas. Tornam-se figuras influentes e, por vezes marcantes, na vida social e politica.
Cumprimentos.
if.
Cara Quina
ResponderEliminarInfelizmente a uma boa parte das casas antigas em Portugal estão decadentes. Parece que todos querem construir vivendas novas.
Abraços
cara If
ResponderEliminarMuito obrigado pelo seu comentário. Normalmente estas casas de Brasileiro estão associadas ao Norte, mas tenho-as visto um pouco por todo o País. Há um estudo de um Jorge Sampaio sobre estas casas, mas não é muito entusiasmante. Abraço
Olá Luís
EliminarAdorei o dragão vermelho, aqui pelo norte associamo-lo ao azul :(
Gostei muito deste seu post. Primeiro porque desmistificou a ideia que eu tinha de que as casas dos brasileiros eram exclusivas do centro e norte do país e depois, porque ao referir a construção da ópera de Manaus, teve o condão de me fazer lembrar o magnífico filme "Fitzcarraldo", que versa precisamente o sonho louco da construção de uma ópera em plena Amazónia e da presença de Caruso na sua inauguração. Ando atrás deste filme há uma infinidade de tempo, mas não o consigo encontrar.
Um bom fim de semana.
Maria Paula
ResponderEliminarEstas casas dos brasileiros evocam sempre efémero esplendor de Manaus. Sabe que nunca consegui ver esse filme de que fala por inteiro? Apanhei sempre partes na televisão, mas gostaria imenso de o ver integralmente.
Não há certeza se o Caruso chegou a actuar em Manaus, mas o edifício foi pensado para receber os melhores cantores líricos europeus.
Abraços e obrigado
Quando se pensa que um destes azulejos isolados não nos faria olhar duas vezes, no entanto, em conjunto, atrai todos os olhares, e dificilmente alguém lhes fica indiferente!
ResponderEliminarComo é que se entende esta magia, só possível pelo conjunto e não pela parte isolada?
Temos por certo que 1+1=2, mas neste caso, em termos de gosto, tal não é exato, no entanto é verdade que 1+1+1+1+1+1+1+1+1+1+1+....+1= infinito!
Fico sempre extasiado com esta qualidade plástica dos materiais, que possuem um comportamento estético que escapa a regras estabelecidas!
O dragão só me trouxe à ideia os dragões que invadem os telhados e fachadas de Barcelona! Há um, em plenas Ramblas, que se assemelha um pouco a este!
Mas, em Barcelona, este ser mítico não é de admirar, pois S. Jordi (S. Jorge) está associado à cidade, e claro, este santo, que representa o braço armado da igreja, está intimamente identificado com o dragão!
São estas referências que me espantam nestes locais no meio de um Alentejo profundo!
Manel
Manel
ResponderEliminarTens razão. Em azulejaria, a combinação mais simples de 1 + 1, prolongada até ao infinito produz efeitos supreendentes.
Talvez o proprietário da casa fosse devoto de s. Jorge, ou tivesse nascido no dia do Santo e tivesse sido baptizado com esse nome.
Abraços
Luís, aqui no distrito de Aveiro encontram-se muitas casas bonitas deste estilo, casas de gente que enriqueceu no Brasil ou mesmo em África e de regresso ao rincão natal, abriu os cordões à bolsa para ostentar a sua riqueza e mudança de status.
ResponderEliminarA exuberância nas cores e nas formas causou estranheza por cá, mas ninguém pode negar que ficámos com exemplares cheios de interesse arquitetónico e que se tornaram centros de atração em terras pequenas aqui do litoral.
Estou-me a lembrar de Ílhavo e de Águeda com vários exemplares magníficos.
Também gostei do efeito dos azulejos e do friso junto ao telhado, mas particularmente dos grandes planos da porta e dos ferros forjados da varanda Arte Nova.
Quanto ao pequeno dragão no pináculo,é muito ao estilo de um catavento, só não tem os pontos cardeais...
Abraços e boa semana de trabalho
A Maria Andrade também tratou várias vezes a arquitectura desta época no seu blog e sabe bem a delícia que constituem todos estes pormenores decorativos, como o dragão, o ferro forjado ou as portas, sobretudo para nós, que nos habituámos aos modernos blocos de apartamentos, cúbicos ou rectangulares, sem qualquer espécie de ornato.
ResponderEliminarbjos
Mas este dragão não espanta que esteja à casa de um "brasileiro": é o símbolo da casa de Orleans e Bragança! Este senhor devia ser, além de saudoso dos seus tempos de Brasil, monarquista.
ResponderEliminarsaudações,
Caro Rodrigo
ResponderEliminarBem vindo ao meu blog.
Não sei nada sobre o proprietário da casa, a não ser que é quase certo ser brasileiro. Este tipo de casas, em Portugal, de Norte a Sul do País, foram sempre mandadas construir por brasileiros, ou melhor, portugueses, regressados do Brasil. É possível que o dono desta casa fosse monárquico, admirador do ramo brasileiros dos Bragança, mas também pode ser apenas que se chamasse Jorge e quisesse ter no alto da sua casa o dragão de S. Jorge. São apenas conjecturas, mas mas tentarei saber mais sobre o constructor desta casa.
Um abraço
Obrigado pelas bem-vindas!
ResponderEliminarSim, chamou-me atenção que a icografia coincide exatamente ao que corresponde à um dragão dos Orleans e Bragança - http://brasilinteractivemap.files.wordpress.com/2012/04/dragc3a3o.jpg?w=246 -
De qualquer maneira, gostava muito de conhecer uma destas casas de "brasileiro torna-viagem". Há uma, visitada por um amigo meu, em Paredes, a Casa Castrália, que disse-me reproduzir não só murais à sala de jantar cenas de Belém do Pará, como parece havia um aquecimento engenhoso que permitia que o senhor sentisse um pouco do calor e humidade dos trópicos.
Há uma dissertação de mestrado que passei olhos certa vez que cataloga estas casas, ao menos em Paredes. Vou ver se a encontro novamente e digo-lhes a referencia.
Rodrigo
ResponderEliminarTenho uma senhora conhecida em Fronteira, a quem vou pedir o favor de me dar mais informações sobre esta casa de brasileiro. Pode ser que haja pistas sobre o bonito dragão.
Há uns anos, saiu um catálogo de uma exposição sobre Casas de Brasileiros, da autoria de Jorge Pereira Sampaio. Talvez consiga encontrar um exemplar e enviar-lhe algumas imagens
Um abraço