domingo, 13 de abril de 2014

Dois covilhetes da Fábrica de Miragaia ou Le joli temps du lilas


Neste tempo em que os lilases estão em flor no Alentejo, o seu perfume delicado parece ter inspirado o destino, que pôs à minha frente na feira de velharias de Estremoz, um covilhete Miragaia, da série País, marcado, e apenas por vinte euros. Nem queria acreditar, nem regatei, tirei a nota, paguei logo e quase que fugi com a peça, com medo que aparecesse o marido da vendedora gritando que uma faiança Miragaia só se vende com um preço de, pelo menos, três digitos. Enfim, nem sei se a Senhora tinha marido ou companheiro, mas que corri, corri em direcção ao Manel, e mostrei-lhe o meu pequeno tesouro, a medo, como se mostra uma droga ilegal comprada ali na esquina. Continuámos pela Feira e duas ou três bancas à frente, estava outro covilhete Miragaia, igualito ao meu, só que em melhor estado e custando três 3 vezes mais, o que mesmo assim era mais barato, para uma peça genuinamente marcada Miragaia.  O Manuel não a deixou escapar e voltamos os os dois para casa, cada um com o seu covilhete.

Apesar de haver nas feiras de velharias muita faiança azul e branca, umas versões ingénuas do padrão inglês do salgueiro, o willow pattern, vendidas como se fossem Miragaia, na verdade a louça marcada e realmente fabricada por Miragaia é rara. A marca deste covilhete, M.P. quer dizer Miragaia Porto e foi utilizada no 2º período de fabrico (1822-1850) desta conhecida manufactura da cidade do Porto.

O Museu Nacional Soares dos Reis no Porto, possui nas suas colecções um covilhete igualzinho ao meu e ao do Manel, com as mesmas dimensões e tudo,  também datado entre 1822-1850.
Covilhete do Museu Nacional de Soares dos Reis, inv. 259 Cer CMP/ MNSR

Normalmente esta decoração da Fábrica Miragaia, que imita de uma forma livre e ingénua um edifício indiano, costuma ser conhecida pelo motivo País, porque no passado, as representações de paisagens na loiça eram sempre conhecidas por países. Até mesmo os pintores a óleo especializados em paisagens, eram no século XVII, designados por pintores de países. 

Estou tão encantado com o azul destas faianças de Miragaia, que vos deixo com a inspiradora música de Barbara, Le temps du lilas.

25 comentários:

  1. QUE MARAVILHA! Fantástico mesmo. Peças lindas, e marcadas! E dignas de Museu. Que bom que vocês acharam dois, assim cada um tem o seu, sem ciúmes.
    abraços

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    1. Fábio

      A compra destas peças foi um verdadeiro golpe de sorte, daquelas coisas que acontecem quatro em anos.

      Aos anos que eu ambicionava por uma peça destas, de que já tinha escrito várias vezes no blogue, a propósito das confusões que se fazem entre Miragaia e o cantão popular

      Um abraço

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  2. Luís,

    Que achado maravilhoso!
    O azul das peças é sublime! O desenho e a cercadura são de ficar de queixo caído.
    Estou em crer que deverão ter pertencido ao mesmo dono. Não é muito normal surgirem duas peças iguais ao mesmo tempo. Devem ter sido adquiridas por um dos feirantes, o qual se desfez de uma delas para um dos colegas.
    Tesouros desses não se encontram todos os dias e, a esse preço então...sabe que mais? Eu , tal como o Luís, também teria dado corda aos sapatos!

    Um beijinho, e façam o favor de colocarem os "meninos" em lugar de destaque.


    Alexandra Roldão

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    1. Cara Alexandra

      Eu também acho que estes dois covilhetes vieram no mesmo lote e da mesma casa. Julgo que quem os terá trazido foi a senhora que me fez a venda a mim. Seriam dois covilhetes, um em pior estado de conservação, gatado, e outro melhorzinho. O melhor foi vendido logo de manhã a outro vendedor, que depois o impingiu ao Manel. O segundo, o que estava gatado foi-me vendido ao final da manhã por um preço muito reduzido.

      Bjos e obrigado

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  3. Luís!!
    Parabéns pelo achado! :) Compreendo perfeitamente essa exaltação:) É fantástico esse sentimento de conseguirmos possuir aquilo que consideramos um verdadeiro tesouro. As peças são fantásticas! Parabéns também ao Manel.
    Bjs

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    1. Maria Paula

      Foi mesmo uma excitação. Aos anos que ambicionava ter uma peça da série País, de Miragaia. Mas, quando aparecia alguma, o preço eram sempre proibitivo. Desta desta tive um golpe de sorte e comprei uma boa peça, daquelas que os museus tem nas suas colecções.

      Bjos

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  4. Caro Luis,

    As peças são maravilhosas ! Mas vocês mereciam. O vosso empenho, dedicação, informação e conhecimentos que transmitem a todos nós deviam ser compensados!

    São realmente duas peças maravilhosas de Miragaia, que permitem de forma clara e inequívoca destrinçar o Cantão Popular.

    Parabéns! Continuem-nos a surpreender com peças assim.

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    1. Caro Jorge

      Já tinha encontrado pratos, travessas e até terrinas da série País de Miragaia à venda em feiras (normalmente ao preço do ouro), mas, que eu me lembre, covilhetes como estes só os tinha visto no Museu Nacional de Soares dos Reis no Porto. São umas pequenas peças excepcionais.

      Há de facto uma tremenda confusão entre o cantão popular e Miragaia. Nas feiras, vendem o Cantão popular como se fosse daquela fábrica do Porto. Mas, o que é certo, como se provou no catálogo da exposição "Fábrica de Louça de Miragaia", realizada em 2008, nunca apareceu nenhuma peça cantão popular com as marcas típicas de Miragaia.

      O cantão popular inspira-se no padrão willow pattern da faiança inglesa, que é uma visão idílica da China. A série País de Miragaia adapta livremente a decoração View in fort Madura da Herculaneum Pottery, que é por sua vez uma visão romântica da Índia.

      Um abraço para si e obrigado pelas palavras simpáticas

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  5. Devo confessar que quando vi o covilhete nas mãos do Luís me assaltou a inveja - sei que é feio, bem sei ... mas sou humano :-( ... no entanto, rápido me esqueci e continuei a ver a feira à procura de um balde metálico para colocar as cinzas das lareiras, que este sim, era o meu objetivo primordial para ir à feira.
    Eis senão quando ... vejo um outro covilhete exatamente igual, só que em melhor estado.
    Pensei logo que deveria ser uma falsificação!
    Os covilhetes de Miragaia, ainda que do último período, 1822-1850, não andam pelas feiras aos trambolhões!
    Aliás, lembro-me quando vi esta forma de covilhete ao vivo (conhecia-o do livro do Sandão, ou seria do Queiroz? Não tenho os livros ao pé de mim para ter a certeza), na exposição de louça de Miragaia no Soares dos Reis, há 4 ou 5 anos atrás, pensei que estas peças só em museus. Mal sabia eu que iria ainda possuir um!
    Assim, andei com o covilhete às voltas, revirei-o vezes sem conta, até que me convenci que era genuíno!
    Afinal sempre existem peças destas à venda!
    Lá veio ele de braçado ... e ... sempre comprei o balde metálido para as cinzas, apesar da excitação toda.

    Esta forma algo barroca do covilhete, com curva e contracurva, é absolutamente fantástica, para não falar do motivo "país", que é uma graça. Este motivo já eu o cobiçava há muito tempo, tal como tu.
    Há horas de sorte

    Manel

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    1. Manel

      Esta compra feita nas férias apanhou-nos sem bibliografia. Recordo-me de ver este covilhete no matriz.net pela primeira vez. Depois, vi-o novamente na exposição sobre Miragaia, no Museu Soares dos Reis, no Porto. Mas já não me recordo se o Museu Nacional de Arte Antiga tem uma destas peças em exposição permanente. Para a semana, tratarei de confirmar isso e aproveitar para reler o catálogo de Miragaia referente à série País.

      um abraço

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  6. Ola Luis e Manel, eu sou a senhora que vendeu os covilhetes em Estremoz sabia que eram miragaia porto ja pedi valores com tres digitos e nunca os vendi. Nos compramos e vendemos e esse o nosso trabalho nao
    colecionamos mas fico feliz em saber que ficam em boas maos e voces podem agradecer-nos pois fomos nos que os salvamos de um destino chamado lixeira. Esperamos encontra-los de novo e quem sabe com alguma raridade. Cumprimentos
    Ana Isabel e Paulo

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  7. Caros Ana Isabel e Paulo

    Muito obrigado pelo vosso comentário. Fico muito feliz por conhecerem o meu blog e vos reencontrar aqui. Parece que aos poucos formamos uma pequena comunidade.

    Tenho bem presente que o preço das faianças desceu muito em relação há uns cinco ou oito anos atrás. A crise teve também os seus resultados nos mercados de velharias e as faianças desceram muito de preço.

    Certamente continuaremos a comprar-vos coisas e nas nossas mãos os objectos serão estimados. Aliás, este blog é a prova disso. Aqui tento fazer uma identificação correcta dos fabricantes e das datas em que as faianças foram produzidas e contar ainda mais qualquer coisa acerca da sua história.

    Um abraço para os dois

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    1. Fiquei confuso, pois eu comprei a pessoas diferentes das que te venderam o teu.
      Creio que ambos os covilhetes deverão ter sido postos à venda pelo mesmo feirante (os covilhetes Miragaia não andam por aí pelas bancas de todo o país!), no entanto, eu comprei o meu numa banca diferente daquela onde compraste o teu.
      Creio que o teu, gatado, deve ter sido comprado na banca que, de início, deverá ter trazido os covilhetes para a feira de Estremoz, enquanto que, o meu, em melhores condições, foi adquirido numa outra banca mais para o meio da feira.
      Os donos desta banca onde adquiri o meu, devem ter comprado a peça à vendedora original e, de seguida, colocaram-no à venda.
      Seja como for, e sejam lá as pessoas a quem ambos comprámos as peças, quero agradecer-lhes muito, e gostaria de lhes dizer que, quer um vendedor quer o outro, fizeram duas pessoas muito felizes ... nós!
      E o segundo vendedor, a quem comprei a minha peça, para além de me fazer feliz, fez com que eu perdesse a inveja que me invadia ... grrrrr .... :-)
      Assim, este segundo vendedor, fez duas boas ações no mesmo dia!
      Duas não, três, pois colocou o covilhete com um preço a que me foi possível chegar, pois doutra forma, deixaria a peça no sítio onde a encontrei.
      Em conclusão, um agradecimento muito especial aos dois feirantes que nos venderam estas peças, e um bem hajam, e oxalá nos possamos encontrar noutras compras e vendas, se a ocasião se proporcionar
      Manel

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  8. Luís
    Há horas de sorte, como bem diz o Manel. Parabéns aos dois, pelas vossas felizes e inspiradas aquisições.
    As cores são tão vivas e brilhantes, que parecem aplicadas recentemente. Fui recordar as várias peças do catálogo da Fábrica de Louça de Miragaia, do MNSR. São lindíssimas, assim como as vossas.
    Um abraço
    if

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    1. Cara If

      Estas peças foram um golpe de sorte. Aos anos que ambicionava por ter uma loiça da série País de Miragaia. Mas, aqui no Sul são raras. Talvez apareçam mais pela região Norte, Mas, são belíssimas. Evocam antigas casas de família do Norte, com soalhos encerados e janelas de guilhotinas.

      Um abraço e obrigado

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  9. Luís, fico muito feliz por estas duas peças vos terem ido parar à mãos. Que achado! Logo dois covilhetes no mesmo dia, ali prontinhos para satisfazerem os vossos desejos, alguém que as vai sempre valorizar e acautelar! São talvez as minhas formas preferidas do serviço, pela pequenez e graciosidade, mas se calhar também por ser uma forma muito conhecida do Museu Soares dos Reis.
    Lembra-me a alegria que senti quando consegui ter um prato do mesmo serviço, já um tanto maltratado, partido e colado, mas com aquele motivo mítico e um azul lindíssimo.
    Afinal não precisamos de muito para nos alegrar os dias! Oxalá vamos tendo uma sortezita destas de vez em quando...
    E, já agora, também acho lindo o tempo dos lilases. A primeira fotografia ficou excelente, com os dois paninhos bordados a darem um toque muito especial.
    Abraços e parabéns

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    1. Maria Andrade

      A primeira fotografia é uma homenagem indirecta ao "Arte, livros e velharias". A composição é algo feminina, sem o ser inteiramente.

      A associação entre os lilases. que estão em flor no quintal do Manel, a música da Barbara e estes covilhetes de Miragaia surgiu quase de imediato. Fui arrancar uns raminhos de lilases e achei que combinavam às mil maravilhas com os Miragaias e enquanto isso o Manel trouxe vários naperons e fizemos vários "takes" às nossas pequenas estrelas, até acharmos que algumas resultavam em cheio.

      O hábito de pintar paisagens na porcelana ou louça é antigo. Muitas vezes transpunham-se gravuras representando paisagens de vários "países" e o nome foi ficando e tornou-se na faiança portuguesa um sinónimo de paisagem.

      Bjos e muito obrigado pelo seu comentário

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  10. Ah, já me esquecia...
    Adorei saber a razão do nome deste motivo. Não fazia ideia e já várias vezes me tinha questionado sobre isso. Aqui aprende-se sempre!
    (Já viu que eu não consigo alinhavar um comentário de jeito, dizer tudo de uma vez só?!)
    Bjs.

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    1. Não se preocupe. Assim fico com mais comentários no blog. Lol!!!

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  11. Parabéns pelas compras e pelas peças que são lindas.
    Não sei o que é um covilhete, vou ter que ir pesquisar.
    O lilás é lindo e a sua fragrância chegou até cá.

    Boa semana!
    Ana

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    1. Ana

      Descobri agora os Lilases e ando a aprender a tratar deles a saber como se podam e a perceber o fascínio que exercem sobre a arte e a literatura em virtude do seu perfume e sua sua cor. O covilhete é um prato pequenino que pode ser usado para servir um doce. Julgo que também pode ser usado azeitoneira,

      Um abraço

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  12. Luis,

    Só agora vi esta maravilha de post: simples, marcante, direto, honesto... Mas como Vc disse uma sensação de algo proibido ou aventureiro. E de fato é. Sair por entre cacos e coisas comuns que de certo têm seu valor relativo.. e deparar-se com uma peça de coleção e de bons museus não acontece todo dia. Às vezes, nem todo ano. Realmente uma sorte. Dupla sorte.
    Não sei se não acompanhei bem o texto. O fundo com "gatos" é do seu covilhete ou da peça do Manel?

    Um abração.

    Parabéns a ambos.

    Amarildo

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    1. Amarildo

      Peças marcadas Miragaia não aparecem todos os dias e covilhetes como este nunca os tinha visto à venda. Curiosamente, a Fábrica de Miragaia exportava muito para o Brasil e o seu primeiro proprietário era luso-brasileiro. O que lhe quero dizer é que aí no Brasil pode ser a sorte de apanhar um Miragaia genuíno. O Amarildo não comprou já uma peça de autêntica de Viana?

      O Covilhete gatado é meu. A peça do Manuel está em melhor estado.

      Um abraço

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  13. São lindos Luis, parabéns pelo achado e fico muito contente que tenham ido parar a tais mãos, que lhe dão o devido valor!

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    1. Marília

      Muito obrigado pelo seu comentário. Os covilhetes foram um achado e já estão pendurados nas paredes das respectivas casas. Coloquei-me o meu perto de umas peças de Bandeira ou Fervença e não muito longe de uma pia de água benta de Viana. Assim ficou o Norte todo junto.

      Bjos

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