Não sei se ainda haverá gente que reze pelas alminhas do Purgatório. Talvez o Purgatório esteja pejado de almas esquecidas, por quem ninguém já se lembra de rezar um Padre-nosso, Ave-maria. Aconteceu-lhe o mesmo que as antigas divindades pagãs da Península. Estão esquecidas de todos. Já ninguém em Chaves faz um sacrifício ao Deus Larouco e no Alentejo há muito que deixaram de levar oferendas a Endovélico.
Talvez seja por simpatizar tanto por coisas esquecidas e causas perdidas, que tenho uma predilecção especial pelas imagens das alminhas do Purgatório e quando vi esta estampa no chão da feira de Estremoz, não a pude deixar ficar por lá. Fazia parte de um conjunto de quatro, todas emolduradas numa madeira pintada de azul cueca. O Manel e eu compramo-las em conjunto e a coisa ficou muito em conta. Nem meia dúzia de euros custou cada das estampas.
Só deu algum trabalho raspar a tinta azul. O resto foi só limpar o vidro e passar muita cera.
A estampa foi feita por Teotónio José de Carvalho e vendia-se na travessa de S. Domingos, nº 58. A julgar pela cercadura, parece-me um trabalho dos finais do XVIII. Não encontrei nada de relevante sobre este Carvalho nas obras do Ernesto Soares.
Terá sido um impressor gravador sem grande brilho, que vendia estampas baratas, como esta Nossa Senhora das Almas. Segundo li na obra de Manuel J. Gandra, Estampas religiosas gravadas do Concelho de Mafra, esta actividade de imagens devotas estava de tal forma bem organizada, que os impressores deixavam em branco o campo destinado à legenda alusiva à invocação e competia ao comprador da edição a impressão do nome do santo ou santa. Por exemplo, esta Senhora das Almas tanto podia ser a Estremoz, como a Virgem das Almas de Viana. Era só uma questão de mudar o título. Por essa razão, nos dias de hoje, temos a maior das dificuldades em perceber se uma estampa antiga representa a Rosa de Viterbo ou de Lima ou a Brígida da Irlanda ou da Suécia.
A localização final da Nossa Senhora das Almas |
A Brígida da Irlanda, a Rosa de Viterbo ou as Alminhas do Purgatório são todas elas devoções esquecidas, cujas imagens são vendidas ao desbarato nas feiras das velharias e ainda bem para mim, que as acho encantadoras.
Boa noite ,Luis
ResponderEliminarMais uma linda estampa
A moldura sendo original,também terá o seu lado interessante
Agora uma curiosidade...
Azul cueca?:)
Pela primeira vez ouço esse termo,lol
Acho que o Luis tem uma sorte.Encontra sempre belas estampas na feira...
Um abraço
Cara Grace
ResponderEliminarDurante quase vinte ou trinta anos as cuecas masculinas eram quase sempre azuis, do tom da moldura apresentada no post e desde essa altura "azul cueca", tornou-se uma expressão depreciativa para designar um tom infeliz de azul.
Beijos e obrigado pelo seu simpático comentário
Por baixo do azul cueca tinha existido uma outra camada de tinta acastanhada, como era muito comum utilizarem nas madeiras em muitas casas do Alentejo.
ResponderEliminarLá na minha casa, as madeiras interiores estavam todas pintadas nesta cor nefanda e horrível. No entanto, o facto de teres deixado restos desta tinta na moldura deu uma patine muito bonita, a qual, adicionada aos restos de cera que ficaram nos sulcos deixados pelos xilófagos na madeira, contribuiram para realçar o pinho antigo.
E, ainda por cima, como as diversas partes da moldura não vieram da mesma peça, o resultado ficou ainda mais peculiar.
Decapar em demasia as madeiras nem sempre é o melhor a fazer. Em alguns casos, e depende do efeito que se pretende, claro, convém deixar alguns restos. Só ajudará a manter um ar rústico e antigo às peças, o que as torna mais consentâneas com o entorno.
Manel
Manel
ResponderEliminarA limpeza da moldura resultou muito bem, pois foi feita segundo a tua supervisão. A tom natural da madeira envelhecida acabou por aparecer e a cera fez o resto.
Luís
ResponderEliminarEstou vendo que o Luís tem um gosto peculiar por estampas. De preferência do século passado
Congratulo-o pela beleza que encontrou
Não sou mesmo nada entendida nessas estampas ,mas que a achei muito bonita,achei
Deixe que lhe diga que encontrei umas peças de loiça bem interessantes numa loja de velharias ali perto do Rato
Terrinas e chávenas muito bonitas e bem antigas
Paguei uma quantia bem grandinha,mas gostei dessas peças
E numa rua aqui de Lisboa,junto a um contentor,encontrei uma terrina sem tampa,mas muito bonita
Diz Massarelos
Acha que é muito antiga?
Tem uns desenhos bem bonitos
Acho que vou começar a coleccionar loiças velhinhas
Pegou-me o bichinho das velharias
estou tramada.
Cumprimentos
Também acho muita piada ao termo azul cueca, que "ouvi" pela primeira vez "da boca" do Luís.
ResponderEliminarBem, mas independentemente do bom trabalho que fez com a moldura de madeira, o que eu acho mesmo interessante é o registo, a bela moldura no papel com os cantos floridos, o busto da santa em resplendor a observar as pobres almas do Purgatório, acho toda a composição bonita e invulgar. É verdade que não sou lá muito versada nestas coisas, mas, como o Luís, acho-as encantadoras!
Bjs.
Olá Luís
ResponderEliminar"Seja pelas alminhas"! Expressão usada para para as boas acções que se praticavam, muitas vezes sem se ter consciência de tal acto. Ouvia-se muito nas terras do interior.
A sua estampa, com N.Srª. em atitude de acolhimento, é um encanto. Assim, todas as alminhas se salvam, incluindo muitas das actuais, onde a minha também está presente, assim o espero.
Votos de um Bom Natal.
if
Cara Jasmine
ResponderEliminarFico muito feliz que se tenha juntado a este grupo dos coleccionadores de velharias.
Quanto à terrina que encontrou no lixo, é complicado dizer a época a que pertence, pois Massarelos é uma Fábrica do Porto, muito antiga, que começou a laborar no século XVIII. Mas, o mais provavél é ser coisa dos fins do XIX, inícios do XX, a época em que Massarelos produz de forma industrial.
Do lado esquerdo do blog há uma lista de assuntos, onde pode consultar os vários posts sobre Massarelos deste blog e talvez por lá haja uma marca semelhante à sua terrina, o que lhe permitirá data-la com exactidão.
Um abraço
Maria Andrade
ResponderEliminarEmbora esta estampa esteja em mau estado, a representação de tão ingénua que é, torna-a uma coisa encantadora.
Beijos
Cara If
ResponderEliminarGostei do seu feliz jogo de palavras. Talvez as alminhas do Purgatório tenham deixado de fazer sentido a partir do momento em que Sartre escreveu o "Inferno são os outros".
Todos nós sentimo-nos a viver num verdadeiro purgatório com as empresas a falir, milhares de pessoas no desemprego e o espectro da fome a reaparecer em Portugal. Precisamos de muitos Padres-nossos e Aves-marias para sair deste triste Purgatório.
Votos de um feliz Natal para si e o seu marido
Desculpe a ousadia, mas as molduras império que rodeiam esta gravura são verdadeiras ou foram imitadas como é comum hoje em dia? É que eu tenho duas genuínas e agora quis fazer outra para emoldurar uma serigrafia de uns moinhos de uma fábrica de papel que existiu no rio Lis e não consegui que ma fizessem com a sobreposição das madeiras a fazer os cantos...
ResponderEliminarBoas Festas
Ana Silva
Cara Ana Silva
EliminarAs molduras que vê na fotografia são todas antigas. Umas herdei, outras comprei. Claro, não serão todas muito antigas, algumas terão trinta ou quarenta anos apenas.
Aguns dos cantos em latão são novos. há uns anos descobri uma casa na Rua de S. Julião em Lisboa que vendia esses cantos e comprei muitos, mas já faliu entretanto. Em todo o caso, o Guedes, na Rua das Portas de Santo Antão ainda vende os cantos em metal.
Não sei se ainda fazem estas molduras com madeiras sobrepostas. Eu encomendei uma há pouco tempo e o trabalho ficou mal feito. O melhor é andar nas feiras de velharias e comprar molduras, que são baratas. Eu compro-as com umas litografias ou reproduções fotográficas muito feiosas e depois deito o interior fora e fico com a moldura, colocando-lhe uma estampa antiga.
Um abraço
Muito obrigado Luís, o meu marido vai de vez em quando ao palácio da independência comprar livros de história e como a Rua de St. Antão é pertinho, darei lá um salto. Em relação à compra das molduras em feiras de velharias é óptima ideia e até já comprei uma mas por Leiria não aparecem com frequência. Além disso há 3 meses que estou de greve às velharias porque uma pessoa às vezes perde-se e o tempo está difícil!
EliminarBom Natal e obrigado pelas sugestões,
Ana Silva
Boa noite,Luis
ResponderEliminarNão posso deixar passar esta quadra festiva sem desejar um Santo e feliz Natal ao Luis e ao Manel,claro. A todos os seus seguidores deste Blog
À Maria Andrade,Isa,Jasmine,If,etc. A todos os anónimos que como nós tem loucura pelas velharias
Boas Festas a todos
Quero agradecer à Grace os seus votos. Como já não lhe posso desejar bom Natal, visto a época estar passada, não quero deixar de lhe desejar um bom ano de 2013 e que este lhe traga a si e aos que estima muitas alegrias.
EliminarQuero agradecer-lhe sempre a simpatia
Manel
Cara Grace
ResponderEliminarÉ muito simpática. Desejo-lhe também umas boas festas para si!!!!
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ResponderEliminarCaro Mano Del Tejo
ResponderEliminarnão sei porque apagou a sua mensagem, mas de facto a estampa que mostrou é exactamente o mesmo estilo que a minha. Seria interessante saber mais sobre estas oficinas de impressores gravadores de santinhos. Um abraço