Ao desfolhar pela décima ou vigésima vez o álbum de fotografias do meu pai, deparei com esta fotografia do Solar de Outeiro Seco, que nunca me tinha chamado a atenção. Já aqui havia mostrado outras fotografias da velha casa dos Montalvões, que seleccionei desse álbum, com uma qualidade superior, mas esta tem uma particularidade, que só agora dei conta, há pessoas à janela e uma outra à porta de casa.
Não é uma mera fotografia de arquitectura, uma coisa estática para apreciar o traçado do edifício. É um retrato de uma casa viva, onde há uma criada a sacudir tapetes ou a Senhora da Casa, a minha bisavô Aninhas, espreitando os campos em frente. Também nesta imagem é possível ver a caixilharia das janelas intactas.
A fotografia está datada do ano de 1938, com a caligrafia angulosa da minha avô Mimi, que tentei imitar quando era jovem. Ainda hoje tendo a fazer umas pernas compridas no final de algumas letras. A procura de um estilo de caligrafia corresponde sempre a uma busca da nossa própria identidade.
Fotografia da Foto Alves, um estúdio fotográfico de Chaves |
Em 1938, o meu pai teria 4 anos e ainda vivia com os seus avós paternos no Solar de Outeiro Seco. Foi um período de felicidade para ele. Adorava os avós e nunca mais esqueceu a meninice passada em Outeiro Seco. Talvez por isso tenha sido o único membro da família, que depois da venda do solar se tenha preocupado em anotar cuidadosamente as memórias dispersas do Solar dos Montalvões, impedindo assim que se perdessem para sempre. Registar o passado foi para ele uma forma de relembrar uma infância feliz.
Talvez nesta fotografia, o meu pai, esteja agarrado às saias da minha bisavô que assoma à janela, pedindo que o agarrem também para espreitar. Não suspeitaria certamente, que dali há uns dois anos seria tirado do carinho dos avós e levado a viver com os seus pais, pessoas cultas e educadas, mas decididamente sem qualquer vocação para cuidarem de crianças. Mas deixemos o meu pai ficar no ano de 1938 e talvez se olharmos melhor a fotografia, a sua cabecita nos apareça à janela, fixando-nos com os seus grandes olhos escuros.
Bom dia Luís,
ResponderEliminarÉ uma foto interessante sem dúvida.
Também se pode ver o portão de acesso ao Aloque ainda intacto.
Um abraço e bom fim de semana,
Berto
Caro Humberto
EliminarEstas fotografias valem muito pelos pormenores, que fixaram pormenores que já desapareceram. Por exemplo, adoraria encontrar fotografias das antigas dependências agrícolas da casa, no pátio grande, que foram demolidas. Mas, como eram uma parte pouco nobre da casa nunca as fotografaram. Talvez um dia, essa zona da casa surja como pano de fundo de alguma fotografia de grupo familiar. Enfim, seria bom, que os meus parentes contribuissem também como fotografias antigas, para que se pudesse reconstituir o maior número possível de pormenores da casa
Um abraço
Olá,Luis
ResponderEliminarVendo esta foto,senti umas saudades enormes da minha casa do Porto...
Era desse género...
Enorme,com o seu passado
As janelas com as portadas de madeira,o seu sótão e caves etc
A entrada do coche
Enfim,tempos e familiares ,que se foram...
Quando somos jovens ,não damos valor ás coisas.Como se as fossemos ter toda a vida...
Mas não e verdade
Tudo se acaba
Um abraço para o Luís e para o Manel
Um também para o Manel
Cara Grace
EliminarObrigado pelo seu comentário.
Este blog pretende de algum modo fixar um tempo que já passou há muito, ainda que de uma forma mais ou menos literária.
As casas do Norte de Portugal são muito semelhantes entre si. E depois nelas decorria um modo de vida que teve o seu tempo e acabou.
Um abraço
Gosto imenso destes seus textos sobre a família...são enternecedores! Obrigada pela partilha!
ResponderEliminarCara Isabel (miquinhas)
ResponderEliminarAs fotografias antigas sempre me emocionaram. Há qualquer coisa nelas que me leva sempre a optar por um tom mais intimista ou mais literário.
Um abraço e obrigado pelas suas simpáticas palavras
É interessante que são as janelas da biblioteca, que deveria ser um dos aposentos mais vividos da casa, pois a janela seguinte, a da sala de estar, está totalmente fechada, e as duas últimas, pertencentes à sala do "museu", parecem-me também estar abertas, mas sem gente.
ResponderEliminarQuanto à parede da biblioteca do lado Norte, parece-me que ela já apresenta falhas no reboco, o que, a ser verdade, já dará conta de um certo descuido no arranjo da casa pelo lado do teu bisavô, qual, nesta altura, ainda estaria vivo.
Mas é uma impressão que tenho ao olhar a fotografia, pode ser que seja uma mancha ou outra qualquer razão plausível para o aparecimento daquelas porções escurecidas.
Mas, de qualquer forma, a casa ainda está viva e habitada, o que dá uma certa nostalgia para quem a conheceu nos dias de hoje, como foi o meu caso.
Estas fotografias são sempre interessantes para estabelecer relações com outras.
Manel
Peço desculpa por não ter respondido ao cumprimento da Grace, sempre gentil.
EliminarTambém lhe quero agradecer a sua lembrança e retribuir-lhe os cumprimentos
Manel
Manel
ResponderEliminarSegundo o meu pai, o meu bisavô não tratava muito da casa. Mandava remendar, reparar com cuspo ou fita cola. E isto é dito pelo meu pai, cuja admiração pelo avô é insuspeita. Portanto é natural que a casa não andasse caiada como deve ser e depois os transmontanos não são os alentejanos...
Mas de facto, o que é admirável nesta fotografia um pouco tremida e sem grande definição é a ideia que nos trasmite de uma casa ainda viva, ideia com tanto mais valor hoje, quando a casa está num abandono.
De todas as fotografias do solar que o Luís já aqui publicou, nunca como nestas tinha tido uma noção tão clara da imponência e beleza sóbria do edifício. Isso, aliado ao facto de o vermos aqui habitado, também aparentemente por crianças, provoca em mim uma grande desolação, sabendo-o agora em estado de abandono e ruína.
ResponderEliminarMas o Luís não o deixa cair... no esquecimento...
Beijos
Gostei muito do post.
ResponderEliminarMaria Andrade
ResponderEliminarA casa dos Montalvões de Outeiro Seco era e enfim ainda é um bom exemplar da arquitectura solarenga do Norte de Portugal. A capela é até de muito bom desenho. Estes solares são edíficios pesados, feitos para durar, até por causa do material usado, o granito. Mas o fim de uma economia rural, o despovoamento do interior e a indiferença face ao valor do património cultural ditaram-lhe uma lenta sentença de morte.
Beijos e obrigado
Cara Margarida Elias
ResponderEliminarMuito obrigado pelo seu comentário. Outeiro Seco é um tema recorrente aqui. É um pouco como "Last night I dreamt I went to Manderley again".
Um abraço
Olá Luís
ResponderEliminarGostei de ver o solar dos Montalvões,intacto, imponente, robusto e sóbrio!É engraçado vê-lo assim, pois sempre o imaginei com cantarias muito trabalhadas.As casas da nossa vida têm sempre um significado muito especial quando desaparecem, ou quando estão demasiado distantes.
Parece-me um vulto infantil aquele que se vê na segunda fotografia. Quem sabe o seu pai...
Beijos
Maria Paula
ResponderEliminarA parte mais imponente era e ainda é a capela. Foi também construída em data posterior à restante fachada do solar.
Talvez seja o meu pai à janela. A literatura é moldar a realidade passada aos nossos desejos.
Enfim, hoje estou sentencioso
Bjos