segunda-feira, 23 de abril de 2012

Uma viagem de Catarina da Rússia


Por um preço quase irrisório o Manel comprou esta estampa inglesa do Século XVIII, com a seguinte legenda, Empress of Russia's Travelling Equipage. Como está datada de 1784, certamente representa a equipagem de Catarina a Grande (1729-1796) viajando pelas imensidões geladas da Rússia. A gravura não é de todo uma obra de grande qualidade, mas o tema insólito torna-a atractiva. A imperatriz viaja num trenó que é uma verdadeira casa, com três janelas para cada lado e até tem um pequeno telhado. O trenó é puxado por seis cavalos, há vários cavaleiros que escoltam Catarina e pelo caminho serviçais acendem grandes fogueiras. A estampa transporta-nos imediatamente para o luxo sumptuoso com que sempre se rodearam os czares da Rússia e que muito espantou os viajantes ocidentais.

Exemplar da mesma estampa que encontrei á venda na net, mas colorida posteriormente à mão

Aliás, segundo descobri no site do British Museum, esta estampa foi publicada originalmente no Martyn's Geography, que era uma espécie de National Geographic do Séc. XVIII contendo verdadeiras reportagens das várias partes do mundo e onde os ingleses ilustrados se poderiam espantar com o exotismo dos costumes de outras partes do mundo, assaz diferentes da sua Grã-Bretanha.
Vista de Gilbraltar. outra estampa desenhada por Conrad Martin Metz e publicada na Martyn's Geography
As estampas desta revista eram coisas simples, pois a publicação era barata. No entanto, Conrad Martin Metz (1749-1827), o autor desta gravura e de muitas outras deste Martyn's Geography era um desenhador de qualidade. Este alemão foi discípulo de Bartolozzi ganhou reconhecimento a copiar grandes obras do Renascimento ou esculturas clássicas, destinados a serem transformados em estampas. São célebres os desenhos que fez a partir das obras de Parmigiano, Caravaggio ou Miguel Ângelo. Apesar de ser membro da Royal Academy de Londres e de um currículo brilhante, aceitou também trabalhos sem grande dignidade como este para o Martyn's Geography, talvez para fazer dinheiro.

Cópia executada por Metz a partir de um desenho de Parmigiano, A adoração dos reis Magos
 
Mais sobre esta estampa

11 comentários:

  1. Olá Luís.Apreciei a gravura muito pelos cavalos. Também enriqueci com a explicação do tema da mesma e do fausto que se vivia na Rússia ao tempo.

    A propósito nestes dias a folhear uma revista de um jornal deparei-me com uma biblioteca em duas páginas e nela de pé um homem que no imediato reconheci ser o Luís de mãos abertas e nelas um livro.
    Claro que fui ler em rodapé as mensagens,lá estava o seu nome. Não sabia que trabalhava no meio de livros com tanta história e onde poderá sempre fazer descobertas maravilhosas.
    Continua com uma silhueta de fazer inveja a modelos...No meu subconsciente um bibliotecário tem caras de: "casmurro,feioso e antiquado...conheci dois ou três".
    Vê-lo com aquelas botas de biqueira alta, achei o máximo, os óculos redondos atestam no meu ver o carisma de intelectual,homem de muito saber.
    Beijos
    Isabel

    ResponderEliminar
  2. Luís, vejo que o Manel também está bem apanhado pelo bichinho da gravura e lá desencantou mais esta muito interessante, tendo como tema uma figura histórica quase mítica, a quem eu associo sempre extrema riqueza e luxo (e nunca me esqueço do famoso serviço Wedgwood!)
    Eu acho precioso este tipo de imagens que ilustram episódios históricos ou simples costumes de uma época e de um país.
    Mas o que as valoriza muito é, e não me canso de o repetir, o trabalho de pesquisa que o Luís faz, partilhando aqui toda a informação que consegue reunir.
    É sempre com muito interesse que leio estes seus textos.
    Bjs.

    ResponderEliminar
  3. Maria Isabel

    A si não lhe escapa nada. De facto sou eu que estou nas páginas dessa revista. Trabalho agora num sítio bastante motivante e graças a este blog e aos seus seguidores, que me devolveram confiança nas minhas capacidades e por consequência, a energia necessária para sair do meu antigo emprego, uma coisa sensaborona e chata.

    beijos

    ResponderEliminar
  4. Maria Andrade

    Tenho uma grande simpatia por Catarina da Rússia, uma mulher ilustrada, extremamente trabalhadora e com um grande sentido de estado. Foi bastante vilependiada pelos cronistas que só viram nela uma espécie de déspota devoradora de homens.

    Claro, teve os seus amantes, mas cedo teve que governar sózinha um país imenso e despachar um marido impotente e mentalmente diminuído.

    Aliás, as críticas sobre os seus amantes só me recordam resposta de Madame Sévigné, quando a acusaram de dormir com os criados "Até os melhores campos precisam de ser estrumados!!"

    ResponderEliminar
  5. Línguas invejosas, é o que são as línguas que se entretêm com maledicências sobre as vidas privadas de outros, sobretudo quando esses outros nem sequer arvoram públicas virtudes, ou mesmo se têm como púdicos ou guardadores de honras alheias, como foi o caso de Catarina!
    Ainda que fosse uma mulher com necessidades biológicas sexuais algo mais ativas, o envolver-se com algumas das figuras que lhe passaram pelo leito, foi uma forma de sobreviver, estratégia sem a qual teria sucumbido rapidamente, num mundo dominado por homens!
    Catarina, uma mulher inteligente e culta, amiga e protetora de vários filósofos e artistas, foi obrigada a sobreviver num país que não era o seu, pois era originária da Alemanha, de um ducado meio esquecido, não era sequer tida nem foi educada para ocupar o cargo de herdeira de um trono, e, ainda que uma aristocrata ligada por laços familiares a várias famílias reinantes, nada tinha a ver com os Romanov, família que detinha o poder na Rússia, e, pela ordem natural de posição social, não deveria ter sido guindada à posição que foi, a de chefe principal de um dos mais poderosos potentados do mundo - se não o era à altura da sua ascensão, era-o quando deixou o poder.
    E não só ascendeu a essa posição como foi competente no exercício da sua função, o que não se pode dizer da maior parte das cabeças reinantes! Uma exceção feliz num mundo decadente e corrupto, como era a Rússia que ela encontrou.
    Foi notável todo o teu trabalho de pesquisa, que te agradeço, tanto mais que nada sabia da gravura, só o facto de saber que gostei muito dela quando a vi ali, deixada sozinha, sem que ninguém se dignasse sequer pegar nela!
    Quanto à sua congénere aguarelada, não consigo ver as librés dos lacaios pintadas naquele azul. Imagino-as sempre pintadas de um vermelho, opulento, agaloadas a ouro! hehehe
    Manel

    ResponderEliminar
  6. Manel

    Talvez esta gravura nos lembre sempre Catarina da Rússia, embora ela não figure aqui. A estampa traz-me à memória um romance sobre Catarina e que narra a sua viagem da Alemanha até à Rússia e do enorme frio que apanhou. Só a meio da viagem, Catarina e a sua dama de companhia, tiveram algum conforto, quando encontraram a escolta mandada pela imperatriz Isabel (sua sogra), que lhe enviou uma enorme pele para se cobrirem dentro da carruagem.

    ResponderEliminar
  7. A czarina Isabel, creio, não era mãe de Pedro III, o marido de Catarina, mas sim sua tia, pois a czarina não era casada nem creio que tivesse descendência.
    É esta a impressão com que fiquei, mas emendar-me-ás se tal não for o caso.
    De qualquer forma, sempre poderei fazer uma pesquisa para ter a certeza.
    Este período da Rússia é tão conturbado, com tantas reviravoltas nas tomadas do poder político, que se torna difícil saber quem é o quê a quem
    Manel

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Manel

      De facto tens razão. Isabel era tia do herdeiro do trono e marido de Catarina.

      Quem acompanhou Catarina na viagem da Alemanha à Rússia foi a sua mãe.

      Eliminar
  8. Muito Giro!,

    Parabens pela compra e pela investigação.

    Já agora, onde é que adquiriu?

    JA

    ResponderEliminar
  9. Caro JA

    Julgo que o Manel a comprou na Feira de velharias de Estremoz

    Abraços

    ResponderEliminar
  10. É sempre um prazer ler os seus postes! E o que se aprende através deles... Sinto-me por vezes inculta perante a aparente facilidade com que complementam e partilham os vossos conhecimentos.
    Estremoz começa a parecer-me uma terra apetecível
    para uma estadia que me permita conhecer um artífice que ainda fabrica mosaicos hidráulicos de uma forma absolutamente artesanal e sem dúvida essa feira que tantas compras felizes vos proporciona!
    Parabéns pela coragem de trocar de trabalho numa época destas! Boa sorte!
    Ana Silva

    ResponderEliminar