segunda-feira, 18 de junho de 2012

Uma Verónica preciosa


Já aqui apresentei alguns registos de santos preciosamente encaixilhados, a que antigamente se davam o nome de verónicas. Desta vez apresento, mais uma dessas peças, particularmente rica e trabalhada. Não irei aqui descreve-la, porque as imagens falam por si e mostram bem o virtuosismo e o bom gosto da Senhora, que fabricou este objecto de devoção com restos de passamanaria, que sobrou da confecção de alguma paramentaria religiosa ou quem sabe de um vestido luxuoso. A Senhora, que recortou pedacinhos de lata dourada, que formam uma ornamentação complicada no centro da Verónica, certamente foi educada numa casa religiosa e seria proveniente de uma família burguesa abastada ou fidalga.


No centro da Verónica há uma imagem em pano de Nossa Senhora do Carmo toda bordada a prata. Não é muito antiga. Talvez dos últimos anos do Século XIX ou mais provavelmente do início do Século XX. Neste período vulgarizaram-se os registos em pano, que serviam de base à construção destas verónicas. Eram comercializados em folhas com vinte ou trintas imagens e depois vendidos à unidade em retrosarias ou casas de artigos religiosos e comprados por senhoras devotas, como aquela que fez esta bela Verónica pertencente ao meu amigo Manel.


O meu amigo Humberto fez o favor de me oferecer umas quantas dessas folhas, que nunca se chegaram a vender, cheias destes santinhos, fabricados por uma sociedade francesa, que os Senhores Ouvry e Beraudy criaram em 1908, na cidade de Ambert. Esta firma que ainda hoje existe e continua a dedicar-se ao comércio de artigos religiosos, confeccionava estes registos com legendas em italiano, neerlandês, francês e espanhol, destinados a serem vendidos em todo o mundo católico, inclusive Portugal.

Era um tempo em que estes objectos não eram só decorativos, mas pequenos símbolos, cuja presença assegurava às pessoas devotas, como à Senhora que executou esta Verónica, a existência de seres poderosos no céu, que protegiam a sua existência e lhe garantiam que depois da morte não havia um eterno nada. Aliás, esta senhora nem conceberia a ideia de um nada depois da morte e enfim não a podemos condenar por isso.


14 comentários:

  1. Olá Luís. Uma bela Verónica ou Registo como agora se chama. Parabéns ao Manel - um afortunado por a ter.
    Na última feia de Algés vi um colega comprar uma em latão, chamar-lhe - verónica - para mim seria um medalhão - mas ele teimava como o amigo como era. Na feira de Montemor o Sr Custódio o organizador da feira - um homem espetacular faz artesanato de Registos de Santos...em caso de necessidade julgo ser importante nos dias que correm saber quem continua tal arte.Durante a minha infância e adolescência na minha casa não existiam Verónicas - apenas Souvenirs em latinha trazidos dos Santuários de todo o País. Tenho uma pequena coleção numa prateleira comprida e estreita acima do meu oratório onde as exponho assim como Cristos na cruz talhados em pequenos ramos, ainda ícones estrangeiros que a minha irmã me trás das suas viagens.
    Beijos
    Isabel

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  2. Olá Luís,

    Bonita peça.

    Cada vez gosto mais deste trabalho e ando a tentar adquirir alguma peça que esteja danificada (tarefa difícil, pois são raras e com um preço astronómico, quanto mais mal tratada, mais cara será ??), para perceber as técnicas que usavam para construi-las.

    Pelo que percebi é que além de não usarem cola "silicone" (rsss) tinham imensa paciência. Espero que (já reformado talvez) com algum tempo seja capaz de construir ou reconstruir um objeto tão bonito quanto o que apresentas.

    Um abraço

    J.

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  3. A peça está muito bem executada, reconheço.
    Quando a olho só admiro a paciência necessária e quantidade de horas que alguém deve ter gasto a executá-la!
    Não me parece muito adequada às casas de hoje, com móveis IKEA ou das lojas dos indianos da Almirante Reis.
    Mas como sou de ontem e gosto de coisas mais tradicionais, acabo por ir perdendo a cabeça por estas pequenas peças que, qualquer dia, acabarão no lixo ou, na melhor das hipóteses, atiradas para um qualquer recanto poeirento e cheio de teias de aranha.
    Esta, para além do facto de ser bonita, fez-me lembrar o nome da tua filha, o qual acho lindíssimo. Um nome bonito adequado a uma rapariga igualmente linda!
    Manel

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  4. Maria Isabel

    Tenho visto a vender esses novos registos ou Verónicas e muitos deles apresentam bonitos trabalhos de decoração cheios de minúcia. Só é pena usarem estampas muito feias, normalmente uns santinhos um bocado pirosos do séc. XX, que estragam tudo.

    Já mandei fazer uma destas verónicas, mas para uma gravurazinha do século XVIII e até resultou muito.

    beijos

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  5. Caro José Oliveira

    Há casas como a Vencedora, na rua de S. Lazaro, ao Socorro, que já vendem a caixa com o vidro, já tudo montado, para que qualquer pessoa possa fazer a sua Verónica em casa. Eu tentei uma vez fazer uma, com uma dessas caixas, uma gravura antiga, restos de damasco e passamanaria, mas ficou feiota, pois já não tenho boa vista nem a mão segura. Mas também os bons trabalhos nunca se conseguem só com uma tentativa.

    abraços

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    1. Muito agradecido pela dica da loja. Realmente ainda não tinha descoberto que as caixas eram vendidas prontas, pensava que eram cortadas por vidraceiros.

      Mais uma vez o meu agradecimento

      José Oliveira

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    2. Caro Zé Oliveira.

      São vendidas prontas e em vários formatos, circulares, rectagulares, em losangulo e de todos os tamanhos e nem são muito caras.

      A questão é arranjar um bonito tecido para o fundo, comprar passamanaria para disfarçar as junções dos vidros, florinhas em papel para decorar e uns óculos de aumentar. Ou seja, depois de ir à Vencedora, na Rua de S. Lazaro ao pé do Hospital de S. José, vai directo para os retroseiros da Rua da Conceição.

      abraços e boa sorte

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  6. Manel

    Nossa Senhora do Carmo foi uma devoção muito popular. Salvava as alminhas do Purgatório com o seu escapulário. É o nome de uma das minhas melhores amigas, que é natural do Alentejo e nasceu perto de uma igreja dedicada a Nossa Senhora do Carmo, célebre pelos seus ex-votos. O nome da minha filha transporta essa história e representa essa amizade

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  7. Luís, acho esta verónica do Manel uma pequena obra de arte!
    Para além das latinhas tem um bordado muito bonito e trabalhoso, com fio dourado em ponto de canotilho a formar as folhas em relevo; e a passamanaria em volta é de muito bom gosto!
    Não fazia a mínima ideia que existiram imagens em pano e muito menos que se vendiam assim em folhas cheias delas. Foi uma verdadeira relíquia que o seu amigo Humberto lhe ofereceu!
    Tenho andado muito preguiçosa para trabalhos de mãos porque tenho uns “santinhos” para arranjar, já tenho até molduras que me parecem adequadas e não há maneira de me dispor a pôr mãos à obra. A habilidade também não é muita, diga-se em abono da verdade, :) mas só vou mesmo arranjar um fundo e emoldurar.
    Pode ser que agora me inspire...
    bjs.

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  8. Maria Andrade

    Já conhecia as imagens em pano. Tenho até umas duas ou três, já há bastante tempo e sem saber muito bem que fazer delas. Agora a minha supresa foi descobrir que eram fabricadas em folhas cheias delas. o Humberto comprou-as num alfarrabista, ficou com umas quantas para si e como sabe que gosto de arte sacra, enviou-me umas quantas. Talvez quando tiver uma casa maior decida emoldurar uma das folhas. Pode ser que o efeito seja interessante.

    Mas é curioso que aos poucos, vamos percebendo as diferenças e os vários tipos de imagens religiosas, os registos em papel e em pano, as pagelas, as verónicas, os escapulários e ainda as estampas cortadas dos livros.

    Boa sorte nos seus trabalhos. Experimente restos de damasco que vão bem com a arte sacra.

    Bjos

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  9. Passando a publicidade, deixo aqui um blog que encontrei há pouquíssimo tempo, de alguém que ainda sabe fazer registos!
    Caso estejam interessados em ver alguns dos trabalhos dela, o endereço é:

    http://registosconventuais.blogspot.pt/

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  10. Caro ou cara Blackye

    Muito obrigado pela sugestão, já lá fui espreitar

    Um abraço

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  11. Respostas
    1. Caro Jorge

      Embora não seja crente, também tenho uma predilecção especial pelas imagens de Nossa senhora do Carmo, afinal de contas a minha filha chama-se Maria do Carmo.

      Um abraço

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