Há já uns tempos, quando íamos a caminho de Borba, o Manel e
eu descobrimos uma capela arruinada, S. Cláudio, com uns interiores lindíssimos
pintados a fresco, sobre os quais já aqui escrevi no blog. Junto à ermida
estavam uns agricultores, que além de fazerem o favor de nos informarem do nome
da capela, disseram-nos, que a menos de um quilómetro dali existia outra ermida
abandonada tão bonita como aquela. Ficámos cheios de curiosidade, mas já
estávamos atrasados para aquilo que nos propúnhamos fazer em Borba e desistimos
de visitar a capelinha em frente a S. Cláudio.
Por coincidência, uns tempos depois, o Gastão de Brito e
Silva publicou no http://ruinarte.blogspot.pt/,
um post sobre a tal capela vizinha a S. Cláudio, a ermida de S. Pedro.
O Manel eu que somos seguidores incondicionais do Ruinarte, ficámos
absolutamente encantados com as imagens publicadas pelo Gastão e decidimos, que
quando fossemos visitar o Palácio de Vila Viçosa, haveríamos de conhecer S.
Pedro. E assim o fizemos e posso-vos garantir que não nos desapontámos.
Há uma beleza pungente naquelas ruínas, cujo efeito parece
sentir-se até nas fotografias que se tira. Eu que sou um mero fotógrafo amador consegui imagens quase perfeitas da capela e não foi graças ao meu talento, que
é nulo. A fotogenia dos arcos arruinados, a tristeza e a dignidade do monumento
impuseram-se na minha máquina fotográfica. Limitei-me apenas a carregar no
botão. As fotografias já estavam feitas.
Quando visito ruínas destas, a impressão é que fica é tão
forte, que nem sei que discurso devo adoptar. O mais fácil é bramar contra as
autarquias, que arranjam sempre dinheiro para fazer rotundas com grupos
escultóricos pirosos e borrifam-se para o restauro do património. Depois
pode-se sempre culpar o Ministério da Cultura, que agora não é ministério, mas
sim secretaria de estado da cultura e há ainda o IGESPAR, que agora é a
Direcção-Geral do Património, mas que está falida e a recompor-se de mais uma
reestruturação dos serviços e que mal tem dinheiro para os monumentos nacionais,
quanto mais para uma igrejola perdida no meio do Alentejo. Talvez haja uma
responsabilidade colectiva, talvez o nosso silêncio ou inactividade nos faça sentar
no banco dos réus pelos monumentos que caem.
S. Pedro em 1978. Segundo li no volume IX, p. 97, do Inventário Artístico de Évora. – Lisboa: Academia Nacional de Belas Artes,1978 a capela arruinou-se ainda em “período incerto” do século XIX |
S. Pedro hoje |
Talvez a nossa única forma de lutar contra este abandono dos
monumentos seja juntar a nossa voz à do Gastão Brito e Silva do Ruinarte e
protestar aqui na Internet. Julgo que é a única forma de combater a angústia,
que a ruína da capela quinhentista de S. Pedro nos provoca.
Realmente é muito triste ver ao estado de ruína e abandono a que chega o nosso Património Arquitectónico...na minha última visita a Inglaterra, ao sul, vi com espanto como os ingleses dão a conhecer, defendem e "exploram" o seu Património, e senti uma imensa vergonha do que aqui deixamos acontecer. E o nosso é tão mais rico do que o inglês...
ResponderEliminarCara Isabel (Miquinhas)
ResponderEliminarTem toda a razão. Somos uns irresponsáveis em deixar assim o património entregue à bicharada. Esta pequena ermida seria um ponto turístico de imenso interesse, embora este ja no meio de uma propriedade particular. Nem seria necessário um restauro integral. Talvez bastasse consolidar a ruína como fizeram no Convento do Carmo, em Lisboa, mas eu não sou um especialista.
Abraços
Este edifício organizado em dois espaços, o da nave única, ostentando abóbada de berço muito leve (devido aos ligeiros elementos cerâmicos imbricados que a constituiam), e à qual se sobrepunha telhado de duas águas, e o da capela-mor, coberta com uma belíssima abóbada de nervuras (exteriormente tinha cobertura de três águas, creio) que, apesar de ter raízes góticas, já foi dotada das caraterísticas que iriam definir o gosto manuelino. O fecho desta abóbada, que, julgo, deveria ter decoração igualmente manuelina, desapareceu .
ResponderEliminarComo o esforço exigido por esta última abóbada na estrutura deveria ser muito grande, no exterior, adicionaram-se contrafortes, os quais estão hoje reduzidos a escombros, pelo que a abóbada, sem apoio, ruiu já num dos cantos e, no resto dela, iniciou igualmente o processo de destruição.
Esta capela-mor possuía um altar/tabernáculo (?) na mais pura ordem clássica, feita em escaiola. Hoje encontra-se semi destruído!
A abóbada da nave, sendo de constituição leve, não necessitaria de reforço exterior; o peso desta abóbada deveria ter sido tão pouco (quase que só uma "pele") que as paredes laterais que a suportavam, foram mesmo vazadas para dar lugar a arcadas que deveriam ter possuído altares laterais (?) (uma delas deu lugar a uma porta), no entanto, hoje, encontram-se esvaziadas e em perigo de ruir, o que já sucedeu com a abóbada de berço, que já ruiu em parte.
O pavimento da nave, destituído da sua cobertura, vai revelando aqui e ali as antigas ossadas de quem ali foi enterrado há muitos séculos ... para quem estas coisas são importantes, é um triste fim!
Esta edificação possui na entrada uma galilé/nártex de arcadas com arcos de volta inteira, mais uma vez, numa tradição clássica, com entradas laterais, cujas proporções são tão harmoniosas que, ainda hoje, praticamente destruídas, continua a ser um prazer observá-las.
Até a vetusta estrutura sineira é uma harmonia na sua singeleza.
Esta construção deve ter sido edificada em várias fases, às quais se foram sobrepondo os vários gostos em voga, pois parece-me ter as suas raízes num período anterior ao manuelino.
Enfim, não acredito na sua reedificação, pois é praticamente insustentável, mas, mesmo como se encontra, tem uma dignidade que é difícil encontrar paralelo.
Esta edificação religiosa, juntamente com a de S. Cláudio, a pouca distância, deveriam ter alguma função especial dentro da religiosidade destes povos, no âmbito de uma fé ancestral que deve ter sido anterior ao próprio catolicismo. A sua localização fora de todos os centros urbanos, parecem formar como que um rede religiosa que o catolicismo aproveitou, quando se apropriou do território
Manel
Mais palavras para quê?
ResponderEliminarApenas partilhar o sentimento de frustração e de impotência para salvar este património que se está a perder irremediavelmente.
Mas não haja dúvida que estas ruínas são muito fotogénicas! Ou o Luís está a ficar mestre!
Bjos.
Olá Luís
ResponderEliminarA serenidade das ruínas intemporais.
if
Manel
ResponderEliminarObrigado pelo teu comentário, que esclareceu os leitores deste blog das características de construção deste templo.
A Galilé recorda-me a fachada de uma daqueles templos cristãos reaaproveitados das basílicas romanas.
Também me parece que esta ermida juntamente com S. Cláudio deveria formar parte de alguma rede religiosa. Há em muitas regiões do País lendas relativas a 7 Igrejas, dedicadas a 7 Senhoras, que a lenda considera irmãs. Os paroquianos dessas 7 capelas frequentam as romarias e as festas religiosas, mas não vão as dos vizinhos, o que levou alguns estudiosos a considerar que essa lenda das 7 irmãs é uma história simbólica, que revela que essas sete comunidades tiveram uma origem comum, talvez em alguma tribo antiga que se tenha vindo instalar naquela zona e que se diferencia das restantes.
Maria Andrade
ResponderEliminarO Miguel Ângelo dizia que a escultura já estava contida na pedra. O artista mais não tinha que fazer que descobri-la, retirando com o escopro e o martelo o que estava a cobri-la. Julgo que com esta igreja aconteceu o mesmo. A beleza já lá estava. A máquina limitou-se a fixa-la.
Beijos
Cara If
ResponderEliminarAs suas palavras são lapidares
Muito se aprende neste blogue... obrigado por partilharem.
ResponderEliminarCaro Gastão
ResponderEliminarO mérito da descoberta desta Igreja absolutamente fantástica é todo seu.
Um abraço