quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Y todo a media luz, crepúsculo interior, que suave terciopelo la media luz de amor.


Bem, como todos perceberam, não sou dado à poesia. Talvez porque já seja daquela geração, que rompeu com uma tradição portuguesa antiquíssima, em que todas as pessoas de cultura se dedicavam aos versos. No século XIX e no início do Século XX não havia doutor em Coimbra que não tivesse publicado o seu opúsculo de poesia com sonetos de uma simplicidade pastoril ou de arrebatados sentimentos.


E no entanto, apesar desta minha falta de sensibilidade poética, não consigo deixar de evocar o célebre tango “media luz”, de 1924, celebrizado por Carlos Gardel, quando acendo este candeeiro. Até porque provavelmente o abat-jour data dos anos vinte, altura em que Edgardo Donato compôs esta música.


Apresenta uma decoração minuciosa toda bordada a missangas, muito no espírito dos vestidos que fizeram furor nas duas primeiras décadas do século XX, no tempo em que o costureiro Paul Poiret recebia o Tout-Paris no seu atelier, uma barcaça no Sena.


O Abat-jour foi comprado na Feira-da-Ladra por tuta-e-meia. Mas os poucos euros que dei por ele permitem-me todas as noites ouvir o tango:



Y todo a media luz, que es un brujo el amor,... a media luz los besos, a media luz los dos...
Y todo a media luz, crepúsculo interior, que suave terciopelo la media luz de amor.

13 comentários:

  1. Olá Luís
    Perdi o comentário...
    Bem, dizia eu que belo post, e ainda se intitula que não é misterioso!
    Eu acho que sim, que é, então que dizer da ideia da foto à noite num contraste de cores quentes que incitam a romance!
    Adorei, o recanto da sala, o abat-jour é lindo com capuchinha, uma obra de arte. Ainda o belo exemplar do prato de Sacavém na parede, a foto com a filhota, linda e crescida e a gravura de um Rei? que recebeu de herança, e aqui já postou a sua estória.
    Empacotou o cenário com poesia, usou o deleite da língua espanhola a incitar um tango...confesso nunca o consegui aprender, é demasiado sostificado, inegavelmente belo o ritmo!
    O outono desperta em cada um de nós a uma introspecção ao relaxe,no apreciar de pequenas coisas, objectos,no caso usou a luz que através do abat-jour parte em mil direcções e contrastes de beleza irracional, quente, caliente...por momentos senti emoções...
    Parabéns pela aquisição, muito bom gosto mais uma vez aqui demonstrado.
    Beijos
    Isabel

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  2. Olá Luís
    Belíssimo o seu candeeiro, ou, mais propriamente o abat-jour.
    Que delicadeza,na combinação das cores e materiais!
    Conseguiu uma excelente fotografia, ao fotografar este recanto com a luz ligada. Captou na perfeição a atmosfera de um ambiente, romântico, ou de recolhimento.
    Também, ouviria, de bom grado o tango que refere, aí sentadinha numa poltrona :)
    Abraços
    Maria Paula

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  3. Por sorte não escreves versos!
    Os portugueses (não sei porquê, mas os habitantes deste país "à beira-mar plantado" parecem ser mais propensos a este tipo de produção literária, ou talvez seja impressão minha, quiçá porque os conheça melhor que aos outros!) comprazem-se em produzir poesia a peso, com a única preocupação de fazer coincidir as terminações e usar termos que variam do romântico-meloso ao escatológico-choque!
    E fazem-no numa preocupação tola de tecer loas a alguém, chocar ou verter sobre o incauto e desprevenido vizinho os seus sofrimentos, derivados de amores contrariados ou incompreendidos, ou ainda de exercer uma crítica social e política, que se pretenderia fosse verrinosa, mas que se perde, ineficaz e oca, num meandro de palavras tão exdrúxulas (sempre a preocupação com as terminações) que com dificuldade se percebe o que pretendem!
    Cansei-me das inúmeras vezes em que tive de escutar, de forma polida (malvada educação), versos horrivelmente enfadonhos, mutilados, nada apelativos (excepto para quem os produz), mal ditos, e mal escritos por gente que não conseguia enxergar a situação ridícula a que se expunha!
    Não é nada fácil conseguir produzir a lírica de Camões, escrever como a Sophia, a Florbela ou o Cesário (há mais, sei!), urge ser-se tocado pela musa!
    Lê-los (sou avesso a escutar poesia, que, tenho para mim, é algo de intimista e muito pessoal) faz-nos subir a esferas que não podem ser caracterizadas pela escrita, da mesma forma que ler/escutar o versejar dos outros nos faz descer aos mais entediantes níveis, igualmente impossíveis de caracterizar pela palavra!
    Por sorte para a nossa saúde mental e para a nossa felicidade quotidiana, muitos destes versejadores esconde cuidadosamente o que produz ... infelizmente nem todos os fazem e maldita a nossa educação algo burguesa que nos não permite "mandá-los às urtigas"!
    Estou ranzinza!
    Quanto à tua bonita peça, gosto muito dela, sobretudo do "abat-jour" que, quando o compraste, pensei ser impossível de casar com o que quer que fosse!
    Helás! Conseguiste, de forma bem interessante, juntá-lo com uma base, a qual, doutra forma, seria mais um pedaço de ferro-velho a apodrecer na Feira da Ladra! Ganharam os dois!
    É isso a criatividade!
    Nada se cria, tudo se transforma!
    Manel

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  4. Que requinte este seu recanto, Luís!
    Afinal é um romântico, embora não se dedique à poesia...
    A fotografia à média luz, mesmo sem tango, ficou lindíssima. É certo q a combinação de todos os objectos contribui para o belo efeito conseguido, mas o motivo central, o charmoso candeeiro só por si, já era garantia de sucesso.
    Começo a compreender melhor por q razão não apreciou a Feira da Vandoma no Porto. É q este tipo de objectos e também os seus registos ou peças de arte sacra, não aparecem por lá, como aparecem na Feira da Ladra. Eu, como é mais loiças q procuro, ou livros antigos, venho sempre pra casa com tralha atrás.
    Abraços
    Maria A.

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  5. Obrigado pelos vossos comentários. Cara

    Isabel, infelizmente nunca aprendi a dançar o tango, mas tenho uma grande fascínio em ve-lo tocado e dançado e o candeeiro evoca sem dúvida aquela música argentina e os vestidos de Paul Poiret.

    A fotografia ficou de facto feliz e um elogio da vindo da Maria Paula, que tem tanto jeito nesta área é muito bom.

    Com este blog tenho aprendido a fotografar, coisa para a qual era uma negação no passado.

    Quanto à feira da Vandoma, se calhar tive azar no dia e depois aquela rampa traumatizou-me. Só vi a vender na parte de cima da Feira os restos de um faqueiro de prata, mas já lá estava uma rapariga do género boa burguesia do Porto a compra-lo, qual abutre esfomeado. Lol

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    1. Estimable Luis, después de leer su magnífico artículo sobre la hermosa lamparita de mesa de los años veinte, condidero imperdonable que no sepa usted bailar el tango. El insigne Carlos Gardel se habrá revuelto en su tumba al enterarse. Creo que udted debería subsanar lo antes posible esa carencia. Si usted lo considerase oportuno me brindo a ofrecerle algunas clases, no digo que para que usted emule a un verdadero argentino, pero si al menos para incrementar su cultura como danzarín. Sabe usted que en España decimos aquel refrán de "Nunca es tarde si la dicha es buena". Un cordial saludo desde la Capital del Reino de España. Su fiel seguidor Daniel.

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    2. Daniel

      Infelizmente nunca aprendi danças de salão, embora goste de dançar e creio que tenho alguma facilidade em acompanhar ritmos através dos movimentos do corpo. Já pensei até inscrever-me nesses cursos de tango ou danças de salão, que por vezes as juntas de freguesia promovem ou até mesmo nos alunos de Apolo. Mas tem-me faltado sempre o tempo.

      Aceito de bom grado lições de tango.

      Saudações lisboetas

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  6. Viva Luís,

    Novamente achei muito curiosa a sua atitude de associar música a objectos. E novamente não me senti sozinho em mais esta "excentricidade", que há quem veja em mim. Efectivamente, por vezes, não consigo deixar de associar a um objecto um ambiente, um aroma ou uma música. Há uma pesada colcha de seda adamascada que não consigo deixar de olhar para ela sem sentir o ambiente de uma procissão de Sexta Feira Santa (mas essa até percebo porquê, era uma das colchas que pendiam das varandas de sacada da casa da minha avó em dias de procissão solene); há um quadro de sombrios nocturnos que me faz transportar para o Siegfried do Crepúsculo dos Deuses; tenho um crucifixo em pau santo D. José que me faz ouvir o "Crux Fidelis" do nosso D. João IV; uns pratos de Sacavém de motivo popular com espigas douradas no centro que remetem para o emotivo Cante Alentejano de um coro de tiradores de cortiça; azulejos azuis e brancos de folhas de acanto que fazem lembrar as árias de um cravo nos salões no tempo de D. João V, e podia continuar por aí fora em relação a composições musicais, até livros, poemas.....

    E não posso deixar de estar mais de acordo com o Manel. É de bradar aos Céus, aos Anjos, Arcanjos, Santos e toda a corte celestial as barbaridades que se fazem com a nossa língua por criaturas que pretenciosamente querem fazer poesia, e pior ainda, dão a conhecer os monstrosinhos que produzem!!! Para essa gente a Inquisição devia voltar!!!
    É verdade que somos uma país, ou melhor uma cultura de poetas, não temos filósofos ou pensadores no sentido dos grande teorisadores de ideias. Penso que temos algo muito mais elevado porque os nossos grandes pensadores, porque também os tivémos, foram para além de pensadores também poetas. Por isso temos grandes textos da mais elevada qualidade e beleza estética, e para além da fruição das próprias palavras, existe um conteúdo filosófico paralelo às grandes correntes de pensamento vigentes em cada época, mas que os chamados filósofos colocaram num texto pesado e "repolhudo".
    Sou um fervoroso e orgulhoso defensor da Língua Portuguesa, horroriza-me a forma como por vezes é tratada, como escritorzinhos e poetazinhos pretende impingir a sua má formação, ignorância e falta de talento. Nada que uma leitura de Pessoa, Camões, Eça, Cesário ou Sophia, entre (felizmente) tantos outros,não lhes permitisse ver a beleza, musicalidade e elevação do Português bem escrito.
    Foi só o desabafo de um português patriota e que por vezes fica quase desiludido!!!!

    Abraço
    C.

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  7. Caro C

    Já aqui escrevi muitas vezes, que sempre tive o horror aquelas entradas, que se encontram nos catálogos de arte, onde se descreve até à exaustão aquilo que a fotografia já disse num breve instantâneo. Tento tentado aqui fazer outro tipo de coisas, como dar pequenas explicações históricas dos objectos, associar às peças episódios familiares antigos ou mesmo uma música, como neste post e noutro que escrevi há uns tempos sobre os amores infelizes duma antepassada http://velhariasdoluis.blogspot.com/2010/02/ay-marieke-marieke-je-taimais-tant.html.

    Enfim, como não sou conservador de museu e aqui posso fazer catálogos de arte à minha maneira, sem respeitar academismos e tradições científicas e tenho a sorte de contar com seguidores muito engraçados que puxam por mim, para ir mais além.

    Abraços

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  8. Peço desculpa ao Luís por tecer um pequeno comentário ao do C.
    É muito curiosa e interessante (pelo menos sempre exerceu sobre mim grande atracção), e com certeza estará extensamente estudada, a ligação que se processa ao nível mental, por vezes selectiva, de objectos, sons, odores, paisagens e que concorrem numa fruição das nossas mais recônditas memórias, que nos fazem reviver e gozar (ou não) o momento através de outras mais antigas!
    Manel

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  9. Luis,

    É verdade, concordo inteiramente consigo. E é que para além do comentário à fotografia que diz tudo aquilo que é possível ver, e não adianta nada em relação ao que se poderia querer saber, obviamente aquilo que lá não está. Se temos a fotografia de uma peça de porcelana em ramagens de azul e branco, isso já se vê, agora uma informação sobre o uso, proveniências, influências, técnicas de fabrico...... Das duas uma, ou isto é feito para gente parva ou é feito por gente parva!!!!! Como não me incluo no primeiro grupo, acredito que a realidade seja a segunda opção.
    Por falar em gente parva, há algum tempo assisti ao Câmara Clara com o tema de Arte, Antiguidades e Colecções, com convidados de tal forma iluminados intelectualmente que nem me dei ao trabalho de fixar o nome. Mas cuspiram alarvidades tais como "coleccionar é o desejo de tudo possuir" e as antiguidades tratam-se de "bens comerciais" especuláveis e com vista ao lucro. Quase subi paredes!!!! Obviamente acredito que há quem veja as antiguidades assim. Mas é uma visão muito pobre. É de ter pena dessas criaturas, têm antiguidades como podiam ter uns pinguins de plástico da loja dos chineses, desde que lhes dissessem que valiam muito!
    Quem gosta de antiguidades, não gosta de tudo, há áreas, épocas, objectos pelos quais não tem especial, ou nenhum, interesse. Está longe de um desejo de tudo possuir. O que gosta é porque lhe atribui um significado, porque lhe desperta sentimentos, memórias, porque há processos mentais (mais ou menos, ou nada, claros) que produzem essa selecção, como refere o Manel.
    Quem gosta de antiguidades não é materialista, se fosse não dava fortunas por uma peça só porque se apaixonou por ela. É que não se apaixonou apenas pela peça, foi também pelo que ela representa, pela memória ou sentimento que produz, pela sua beleza, pela ligação familiar, pels gerações que já cruzaram as suas vidas com aquele objecto..... E pode atribuir tanto ou mais valor a uma toalha de linho já coçada como a uma cómoda D. José em pau santo.

    Abraço
    C.

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  10. Uma boa compra pois é lindo o abat-jour.
    O tango é divino.

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  11. Cara Ana

    Muito obrigado pelo seu comentário

    Um abraço

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