segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A casa dos Cunhas na Rua Direita de Chaves


Ao fundo da Rua Direita, na esquina do Largo do Anjo, numa casa antiga com pedra de armas e uma varanda com um desenho de proporções tão clássicas, que quase parece Renascença, viviam os Cunhas, isto é a família do meu avô Silvino, que casou com a Maria Montalvão Cunha, a Mimi de quem já tenho falado aqui. Os Montalvões e os Cunhas não se davam por aí além. Nunca percebi exactamente a razão. Provavelmente, os que conheciam o motivo deste antagonismo já morreram todos.
Na altura em que o meu pai se lembra desta casa viviam lá a irmã do meu Avô Silvino, a tia Matilde, que ainda conheci e o seu pai, Alfredo Augusto da Cunha, contador judicial.

De onde está a janela bonita da fotografia existia uma divisão, que tinha outra janela para o Largo do Anjo. Esse quarto era o preferido da Matilde, que aí passaria uma boa parte do dia com seu lorgnon, pois podia controlar em simultâneo o movimento da rua Direita e do largo do Anjo. Sempre que avistava alguém digno das suas atenções, assomava a janela de lorgnon para ser cumprimentada e cumprimentar. O meu pai lembra-se muitas vezes de passar ali, na Rua direita, com o seu Avô o José Maria Montalvão e este cumprimentar respeitosamente a Matilde, tirando o chapéu, pois naquela época os senhores e as senhoras não andavam de cabeça descoberta.

Apesar de não apreciar muito a cunhada Matilde, a minha avô Mimi, deixou que fosse esta a educar a sua filha mais velha, que viveu também naquela casa bonita, no casco histórico de Chaves. Deste modo o meu pai pouco contactou com a irmã, apesar de por vezes os meus avós terem a preocupação de tirarem retratos conjuntos dos quatro, aparentando serem uma família normal e unida.
Na realidade, o meu pai vivia como se fosse filho único e umas das poucas ocasiões em que via a irmã, era quando os meus avós faziam alguma viagem ao estrangeiro, até S. Sebastian ou Biarritz e deixavam-no entregue à Matilde, naquela casa bonita da Rua Direita, mas que o meu pai não gostava de lá estar.
Segundo me contou muitas vezes, quando os Cunhas recebiam visitas, a irmã do meu pai era chamada a tocar piano e a Matilde, que era dada ao bel canto, interpretava uma qualquer ária para deleite da assistência. Perguntei ao meu pai se se recordava de que músicas ou compositores interpretava a Matilde. Mas julgo que ele já não se recorda bem e não creio que seja verdade que ela cantasse Je ris de me voir si belle en ce miroir.

13 comentários:

  1. A casa tem um ar sólido, burguês e encantador.
    A janela de guilhotina e a varanda imprimem uma elegância ao conjunto difícil de encontrar fora de portas.
    Ainda que com laivos de "neo-estilos" europeus (e a varanda tem uma linguagem que inclui a austeridade Renascença já com alguns laivos do Maneirismo nos modilhões e na espessura da pedra que sobressai da parede), constitui um conjunto bem português.
    E seria de crer que se cantasse o Fausto, uma obra algo açucarada e muito ao gosto da burguesia oitocentista. Sendo "L'air des bijoux" uma das mais conhecidas e onde as aspirantes a cantoras poderiam demonstrar a sua virtuosidade.
    De todas as intérpretes desta área, e muitas existem, gosto sobretudo das versões da Callas e da da Kiri Te Kanawa, da qual te deixo o endereço de um vídeo muito interessante: http://www.youtube.com/watch?v=S8qDcbsXgFo
    que, não sendo a Castafiori a cantar, pode-se ouvir sem medo que se quebrem os cristais da casa!
    Manel

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  2. Manel

    Já conhecia a versão da Kiri Te Kanawa e não consigo deixar de rir sempre que a ouço. Tenho uma colectanea desta cantora e repito sempre a L'air des bijoux a pensar na Castafiore e nas sessões de piano e canto em casa dos Cunha

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  3. Boa tarde Luís

    Constatei que é frequente a presença de diversos cães nas fotos da sua família.

    Porque não dedicar um post a esta temática?

    Abraço

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  4. Olá Luís
    Mas que casa!
    O que eu adoraria viver numa assim.Não fosse a memória eficaz do Manel, já não me lembrava que as janelas se chamavam de guilhotina...
    Adoro as pedras trabalhadas, o ferro forjado do varandim,das portadas e do brasão.
    Que requinte o jeito como descreveu o post, aconchegante,de remate com cariz sedutor dedicado ao "bel canto com piano".
    Pois...acho que anda muito romântico, será do outono?
    Julgava que só na Primavera as paixões floriam mais espontaneamente...
    Serão consequências de andar ultimamente pelo Alentejo????
    Não resistiu, desculpe, sem maldade, foi mesmo para picar, rir , quiçá corar!
    Beijos
    Isabel

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  5. Cara Maria Isabel

    Esta casa é de facto das coisas bonitas que Chaves tem e só há pouco tempo descobri que também tinha uma ligação à minha família. A piada dela é ter um ar de fidalguia, mas em ponto pequeno.

    Concordo consigo. Era o tipo de casa pela qual perderia a cabeça e com a qual às vezes suspiro, quando penso um dia viver em Chaves.

    Não tenho bem terra. Nasci no Ultramar, foi criado num bairro incaracterístico de Lisboa. Sinto apenas aquela identificação profunda à terra em Tras-os-Montes. E experimento um sentimento romântico de um dia poder lá viver, embora, saiba de antemão que não é um desejo realizável.

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  6. Cara Alex

    Embora goste de bicharada, cães e gatos, não é um tema comm o qual que me sinta muito à vontade. Deixo a outros com mais jeito para os bichos escrever sobre cães.

    Abraços e volte sempre

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  7. Luís
    Não resisto!
    Agora que sei uma das suas grandes paixões...possuir uma casa em Chaves igual à dos Cunhas...
    Então, fica prometido, quando me sair o euro milhões, vamos com o Manel escolher a casa, será sua, pago e oferto com agrado,com a promessa que virá cá abaixo assíduas vezes para bebermos um cafezinho.
    O dinheiro inventou-se para circular e partilhar por coisas que valham a pena. Uma casa solarenga igual à dos Cunhas é mesmo a sua "cara", acredito que tem banquinhos laterais para se estar a olhar para a rua, sonhar, cantar....
    Sou uma mulher de convicções, mas tenho andado um nadita às avessas e o meu Deus penaliza-me com a sorte, sei que vai demorar uns anitos para acontecer, ou talvez não, mas o que interessa é que acredito ser contemplada. A fé é a última a morrer!
    Não me esqueço da promessa, fique descansado.
    Beijos
    Isabel

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  8. Lololololol.

    Eu aceito a casa. Tb jogo insensatamente no euromilhões. O que sonho comprar, ajuda-me todos os dias a subir a rampa para o emprego. Mas parece que o Padre Eterno não costuma favorecer ateus.

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  9. Sabe, Luís o q eu acho mais interessante neste solar dos Cunhas? Embora não perceba nada de arquitectura, q me perdoe o Manel se estou a meter a foice em seara alheia, gosto do efeito conseguido ao ligarem a janela e a varanda do primeiro andar às duas portas-janelas do segundo através das cantarias de granito. Fazem um belo enquadramento à pedra de armas.Escusado será dizer q adoro as cantarias de granito e gostaria ainda mais se a janela de guilhotina fosse das de avental, com aquelas grandes lajes de pedra por baixo do peitoril. Aqui pela Bairrada vêem-se algumas em casas antigas.
    O solar tem um ar muito "cosy" e graças ao seu relato de retalhos da vida vivida no seu interior, uma casa de família antiga portuguesa, quase nos apetece românticamente fazer parte desse mundo.
    Mas já sei q um dia vai recuperar a casa ou ter uma igual com a ajuda da Maria Isabel...
    Abraços

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  10. Cara Maria Andrade

    De facto todo este pequeno solar apresenta harmonia e equilíbrio apesar de não haver uma simetria exacta. A casa tem aquilo que os franceses dizem, um "je ne sais quoi" que a torna encantadora. A Maria Andrade que me perdoe o francesismo, mas saiu-me assim sem pensar muito.

    Enfim, aguardamos todos o resultado do próximo escrutínio do Euromilhões.

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  11. ....pois parece que perdi mesmo....ai que até fico verde de raiva, quando isto acontece...é que torna-se dificil voltar a escrever tudo da mesma maneira, quase impossivel...mas cá vai, dizia eu...
    ...Que casa linda Luis, não se sente orgulhoso de, depois de já gostar da casa, descobrir que afinal esteve ligada à sua familia?
    Eu tambem sonho em aduirir uma casa antiga para restaurar, a minha paixão é Arte Nova e existem umas duas ou tres aqui em Almeirim à venda, mas tal só seria possivel depois de tambem a mim me sair o Euromilhoes...e eu continuo esperançada e continuo a jogar e continuo a sonhar, mas continuo meio Ateia e por essa ordem de ideias tenho que me sentar à espera que a Isabel tambem se lembre de me oferecer uma casita...lolololol :-)

    Já não deixo aqui um comentario à muito tempo, as minhas desculpas, mas eu estou sempre presente a deliciar-me com a sua escrita apaixonante!
    Passe lá no meu blog "armazemdepaixoes" está lá um post com uma travessa com o motivo preferido (se não me falha a memoria), acho que irá gostar

    Um beijinho e continue sempre a escrever...(não me canso de dizer isto)

    Marília Marques

    P.S. espero não perder este tambem...

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  12. Obrigado Marília.

    Ora, muitas vezes falta-nos tempo para comentar todos os blogs que gostamos e naturalmente, que não me ofendo por não comentar diariamente aqui. Muitas vezes tb n consigo escrever aqui e acompanhar como deve ser os blogs dos amigos..

    Prometo ir espreitar o seu blog

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